Aprendi a preferir os carecas

Devia saber que era bom demais para ser verdade. Hoje eu saí com o primo de uma amiga minha. Ele tem 25 anos, é advogado, muito lindo e solteiro. Pensei que fosse a perfeição vestindo Colcci. Mas acertar em relacionamentos nunca foi minha vocação.

O garotão me pegou em casa às exatas 20:00 horas, como combinado. Fomos para uma lanchonete, porque ele estava com desejo de comer um sanduíche de filé e tomar um milk shake de morango, sem cobertura.

Concordei com o destino, afinal acho que meus desejos vão ficar reservados para se um dia eu ficar gestante, um dia bem, bem distante, eu espero.

Chegando ao local, após fazer os pedidos, ele segurou minha mão, olhou profundamente em meus olhos (cheguei até a sentir um friozinho na barriga) e depois disse que a minha maquiagem estava perfeita, que tudo estava combinando harmonicamente com o tom da minha pele. Foi nesse exato memento que começou a dúvida que me perseguiria a noite inteira: é para rir ou chorar desta situação?

Com aquele mesmo olhar, que eu já estava começando a identificar, e com aquela voz de locutor de rádio, ele perguntou-me se eu achava-o bonito. Dei um sorriso amarelo, mais amarelo e insosso de todos os sorrisos amarelos e insossos da minha vida e quase vomitei bem na cara dele. Tive vontade de perguntar se ele tinha 10 nos de idade com cara de homenzinho, se bem que seria só a cara mesmo, porque o resto não tinha nada de homem.

Pensei que as emoções noturnas tinham acabado por aí. Mas que nada. O “meninozinho” é mestre em surpreender.

Finalmente, ele tentou ser normal. Tentou, porém não conseguiu. Aproximou-se, fechou os olhos lentamente e me beijou. Tive vontade de beijar um poste só para ver se conseguia ser mais emocionante do que aquilo.

Ele olhou para o relógio e ficou impressionado como conseguimos uma performance tão boa em apenas 23 segundos.

O nosso lanche chegou, mas ele nem ligava mais para os seus desejos alimentares, pois o único desejo que tinha agora era de passar o resto da noite falando de cabelos. Melhor dizendo, dos lindos, lisos, hidratados e castanhos cabelos dele.

A essa altura a minha fome e vontade de comer também já tinham ido passear , me deixando sozinha com esse maníaco por cabelos.

Tive que ficar escutando o nome de milhões de xampus, condicionadores, cremes de hidratação e muitas outras coisas que nem prestei atenção.

Só voltei ao mundo real de novo, quando aquele doente mental resolveu puxar um fio do meu couro cabeludo. A criatura parou e ficou analisando-o demoradamente sem proferir uma palavra. Eu já estava com medo. Pensei que ele tivesse fazendo uma macumba mental.

Ele olhou para mim com uma cara indecifrável. De início não dava para saber se era de tristeza, de raiva ou de nojo.

Enfim, disse que o meu cabelo era melhor que o dele, mais hidratado e foi o caminho de volta inteiro me atormentando para saber qual o meu “segredo”.

Ele só foi embora quando eu disse o nome de um creme para ele. Que nunca usei, é claro. Foi apenas para garantir minha paz.

Enfim, só.

A partir de hoje eu decidi que vou preferir os carecas. Não quero saber de cabelo por um bom tempo.

Avisem ao Lex Luthor e ao Michael Scofield que eles têm chance comigo agora.

Talita Souza
Enviado por Talita Souza em 21/03/2009
Reeditado em 19/04/2010
Código do texto: T1499047
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