De Volta pra Casa
Em outros tempos vagava por lugares incomuns. E quando ficava tão frio e escuro a minha volta, meus pés me levavam mais uma vez para a dita morada final, a triste casa dos mortos. E ali sabia que estava em casa. Era isso, outra vez em casa. Alguns sabiam onde procurar, mas não sabiam se poderiam me encontrar. Verdade. Nunca me acharam realmente. Mãos trêmulas, frias, um gesto quase inútil a deslizar sobre poemas estupidamente construídos. Nunca quis saber se algo fazia sentido.
Estive em meus próprios sonhos, mas também vaguei por sonhos alheios. Tenho feito muitas casas por toda a terra e uma delas parece estar desmoronando agora. Olhe só para mim, uma vez mais tentando me esconder. Ergui um grandioso e mágico crepúsculo, sonho por sonho. Chorei minhas lágrimas sobre ele e fez-se o encantamento. Nunca entrarão. Ao menos que o façam pelo interior das paredes. Talvez seja este o grande castigo... Casa de nossos sonhos? Talvez... Pra você o que pode ser a luz? A escuridão... Já esteve na escuridão? Daquela que apalpamos com as mãos? Ou quem sabe aquela que penetra na própria alma, a que vai bem forte ao coração...? Não importa, não é mesmo? Eu sei. Nunca importa.
Não espere tanto, é o que dizem. Na verdade nunca espero mesmo. Estamos sempre voltando sozinhos para casa e a pior parte é que ainda não sabemos onde ela fica. O que significa que não temos uma casa de verdade. Talvez nunca haja um tempo em que caminhe sob a chuva sem sentir a pele ficar cada vez mais gelada, ou mesmo sem ouvir uma canção destas que falam de morte e sofrimento, pessoas partindo, ou ainda estas que não falam muitas coisas.
É a imagem de um garoto na idade do futebol a tomar seu café com leite. Seria normal não fosse o leite descer por um tubo indo direto ao estômago. Não fosse a lágrima no canto esquerdo do olho... Olho imóvel... Corpo imóvel. Mente... Quem sabe?
As pessoas continuarão com suas manchas avermelhadas pelo rosto e cicatrizes sem sentido por todo corpo. A prostituta de idade avançada ainda mostrará em um gesto de orgulho, a infeliz barriga arrasada... Os velhos sempre terão mais pêlos nos ouvidos que na cabeça e os picolés se derreterão ao sol. Mulheres se casarão três vezes e crianças não amarrarão os próprios cadarços. Pessoas continuarão sendo estúpidas, fazendo perguntas inúteis quando você quer unicamente estar sozinho. Como pedras, que sempre cruzam com o seu sapato em algum momento. É... Pessoas sempre serão pessoas.
A chuva não deixará de ser chuva só porque sabemos que ela é chuva. Antes eu vivia em meu próprio sonho. E agora quase acredito que sou parte de outro. Por um instante isto acalmou a tempestade, mas agora, sinto-me novamente em confusão.
Como sempre pareço esperar respostas pra perguntas que nunca consegui fazer.
E a chuva ainda cai sobre a terra sem se incomodar com o que falam sobre ela. E as moçinhas? Elas suspiram de orgasmos em mais algum negro leito paterno. Talvez um dia o leve para meu leito, ou talvez o leve de volta para o lugar que nem sabe de onde veio.
O encantamento se perde... O crepúsculo se perde... E eu? Ainda a me procurar...