O PENSAMENTO PRÁTICO E O DOM DE ILUDIR

O PENSAMENTO PRÁTICO E O DOM DE ILUDIR

Marília L. Paixão

Não tem nada que acho mais cansativo do que discutir aborto ou outras muitas coisas que causam polêmicas. Para mim essas questões são simples e ninguém teria o que discutir: quem quer abortar aborta quem não quer não aborta. Tudo acontece caso alguém queira ou não. Assim como quem gosta de ir de ir a uma igreja tal, vai e quem não gosta vai por acaso em outra ou a nenhuma. Cada um escolhe seu lugar de rezar ou não rezar já que nem todos que vão a Igreja, rezam. E nem todos que vão fazem tudo que Deus pede.

Muitos vão só para dar uma satisfação religiosa para a sociedade como se dissessem que pertencem ao caminho do bem por frequentarem uma igreja. Gosto dos que dizem que só vão para dar bons exemplos aos filhos. No fundo no fundo cada um acaba fazendo é o que quer. Na hora da satisfação numérica, seja em conta bancária ou sexológica cada um se realiza como quer. E tem mais! Quem quer roubar rouba e não é por que vai a igreja que deixa de roubar. Quem quer matar, mata e também não existe Igreja nenhuma que consiga impedir. Quem quer amar ama e nem precisa de igreja para aprender sobre o amor. E assim cada um prossegue sua vida à sua forma. O escritor escreve, o alcoólatra bebe, os professores lecionam, os jardineiros cuidam dos seus jardins, os seguranças dos mais remunerados tentam se proteger da falta de segurança nacional, etc. e tal... E os cronistas de verdade se aproveitam de tudo isso.

Agora eu? Eu me aproveito é de umas poucas palavras. Sem vergonha que sou e muitas vezes palpiteira sobre o que os meus olhos cansam de ler ou nem querem mais ler. Pois quando os assuntos se repetem muito chegam à exaustão e pode até causar enjôo. Tudo se torna uma babel sem sentido como um querer explicar por que é palmeirense ou por que é corintiano. Estamos na era individualista. Cada um escolhe o peixe que quer comprar. O jovem bem jovem escolhe o site em que quer navegar.

Preparem-se, pois neste país onde há lei, mas não para todos o cumprimento dela, para que ficar discutindo tanta coisa? Quem já descobriu a fórmula de convencer um estuprador a não estuprar? Quem já descobriu a fórmula de convencer um ladrão a não roubar? Quem já convenceu a outro que o muro da felicidade é fácil de alcançar sem armas ou artimanhas? Uma coisa agora é certa: ninguém precisará convencer ninguém mais a não dar ouvido ao que dizem os arcebispos.

Sem falar que quem rouba a possibilidade dos sonhos dos outros para realizar um sonho próprio está matando a milhares de cidadãos bons de qualquer jeito. Este cidadão pode até estar grávido da vontade de nem mais existir. Talvez tenha mesmo nascido para ser abortado mais tarde, de forma infeliz, mas irremediável mesmo sem o merecer. Quem acha que é o dono da razão e da humanidade, não passa de um tolo a procura dos que sofrem da mesma falha do pensamento, mas com menos dom de iludir.

Este se aproxima de uma multidão de famintos e pergunta: Vocês querem um prato de sonho ou um prato de picanha? A multidão diante a proposta de felicidade ainda sem saber se aplaude ou se grita deixa um dos mais extrovertidos ou já com a resposta preparada na ponta da língua como se por dizer aquilo depois fosse ser recompensado, se ergue ainda cheio de energia para declamar em bom tom os versos da humildade esperada:

- Com um bom prato de lingüiça já ficaremos mais felizes, senhor! A gente não é de pompa. Só queremos as devidas proteínas para não ficarmos doentes e sem condições de trabalhar e manter a família. (Não sabem que podem até provar do pedacinho de carne mas o trabalho mesmo para manter a dignidade não haverá)

Neste momento sim! Os que não têm o dom de iludir, mas preferem serem iludidos, aplaudem. Confirmando satisfação com qualquer migalha que receberem e fazem o mesmo com as crenças. É tudo uma questão de querer acreditar que existe alguém para nos salvar dos maiores males. Eu mesma credito. É por isso que vez ou outra eu mesma digo ao verdadeiro senhor para ele me fazer cada dia um pouquinho mais inteligente e não deixar ninguém me iludir. E não é que eu acredito que ele me faz?! Oras bolas eu também preciso de alguma crença!

Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 16/03/2009
Reeditado em 16/03/2009
Código do texto: T1488971
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