Se tem que esperar
Nesses dias eu sentei em frente à tela acesa, essa mesma na qual me encontro agora, sentia o coração apertado e um vazio que jamais imaginei que pudesse sentir. A solidão me consumia, o tédio me envenenava e o meu amor tão distante. Parecia uma bobeira, apenas alguns quilômetros e há alguns dias do retorno, mas as horas passavam tão vagarosas no ponteiro do antigo relógio carrilhão do vovô.
Sentada nas escadas de degraus tão estreitos, em volta das paredes verdes e descascadas, aquela velha porta de ferro que insistia em não fechar e deixava o mormaço entrar pela fresta sempre constante. Sentada esperando. Esperar igual a dar tempo, aguardar emboscado. E uma saudade enorme.
O cheiro de amêndoas e damascos se fora, só a lembrança e o desejo ansioso da volta dessa mistura cítrica e doce que alegra as minhas manhãs, quando eu o espero com um cappuccino que ele sempre bebe quase todo e ainda me pergunta “Cadê o pão de queijo?”.
Eu telefonava, umas mil vezes ao dia eu ensaiava, mas apenas duas vezes eu executava a minha vontade incontrolável de ficar horas e mais horas, até a orelha ficar vermelha de tanto ouvir declarações de amor.
É um drama à toa, constatei, mas é amor demais, me lembrei. De quando era criança e chorava a espera da mamãe, porque logo no dia em que ela sai um passarinho enorme entra pela janela e se aloja debaixo da minha cama. Eram muitas lágrimas como as de criança. Era birra como aos quatro anos. Era amor incondicional como continua sendo.
São as mediocridades do dia-a-dia que aparecem com mais força com a ausência e eu não sabia que era assim, essa saudade do caceta que desanima a minha mente e adormece meu corpo, as lembranças não contentam mais, só a presença completa e preenche. O domingo moroso aparenta mais lento ainda. Monotonia. Agonia. Recordações.
A voz já me acalma agora, o calor volta um pouco e a expectativa se aproxima mais e mais e... mais. Parece que foi um século, mas foram apenas algumas horas, apenas alguns quilômetros, apenas algumas cidades de distância. As horas seguem lentas no ponteiro do relógio carrilhão do vovô, aquele maldito móvel velho se tornou um conforto e ao mesmo tempo um desalento em meio a tanta espera e lembranças vivazes em mim.