O CASO DOS TRÊS PASSARINHOS E OS FARELINHOS DE AMOR

O CASO DOS TRÊS PASSARINHOS E OS FARELINHOS DE AMOR

Marília L. Paixão

Como eu ia dizendo, pessoas são fácies de quebrar. Umas mais que as outras. Mas não disse a Dagger para tomar cuidado com as minhas xícaras transparentes. Muitas coisas gosto que ele compreenda sozinho. A grande verdade é que enquanto tomo meu café eu tento me ver. Fico reparando se está forte ou fraco. Fico reparando se errei ou acertei no pó. Fico olhando o tanto que já tomei e se ainda quero mais. Em outras palavras, hoje estou me sentindo forte ou fraca? Tenho errado pouco ou muito? Gosto de ficar me olhando. Gosto de ficar inventando um mundo para analisar com meus próprios olhos.

O pequeno Dagger nunca quebrou nada nesta casa. Mas a ajudante sim! No meio do ano estava uma quebradeira danada na cozinha. Não sei quantas xícaras se foram. Cheguei a pedir a ela para parar com o terrorismo das louças, pois a maioria das minhas xícaras são compradas em clima de hobby e tem as que ganho pelas quais tenho um dobrado carinho. Das transparentes que eram quatro restam três. Já procurei igual e não encontrei. Tive que chegar para a moça e dizer: a partir de hoje eu quero que você inicie a limpeza da casa pela cozinha e não deixá-la para o final.

- Mas por quê?!

- Quando você chega à cozinha já deve estar muito cansada e minhas xícaras é que sofrem as conseqüências.

Pelo menos assim a coisa funcionou e minhas xícaras descansam em paz enquanto não passeiam por alguma crônica.

Quanto ao Dagger, este ficará um tempo sem aparecer por estar de castigo. Outro dia tinha prendido três passarinhos numa ex caixa de Nike. Alegou que eles sabiam das perguntas da Malu e não queriam lhe dizer. E que um havia dito que umas três perguntas eram difíceis. Esbravejei lhe dizendo que minha casa não era um Guantánamo e que cria nenhuma minha torturaria passarinhos.

Ele choramingou, choramingou, se desculpou e disse que não os manteria no cativeiro por muito tempo e que estava levando farelinhos de tudo para eles. E que um deles tinha prometido contar pelo menos uma pergunta caso ele trouxesse um pedaço do meu bolo de limão.

- E como você ia conseguir este pedaço de bolo Dagger?! Não sabe que estou em dieta?!

- Sim! Mas elas nunca duram mais que um dia.

- Bravo! Mas seu castigo vai durar mais que um dia. Ah, se vai...

- Vai fazer o que comigo?!

- Não sei... Talvez te colocar nesta mesma caixa... Mas se você achar que o espaço será pouco posso ver se consigo uma caixa de botas com a Ana Maria...

- E vai me trazer pedaço de bolo?!

- Sim! Bolo de vidro com pedacinhos de xícara quebrada, tem alguma preferência de cor?! Ou prefere um bolo com sabor de couro bem brasileiro estilo educação à moda antiga?

- Prefiro a caixa.

Ele bem que tinha razão. Quem sabe eu não colocaria dentro uns farelinhos de amor?

Assim como não mais se educa como antigamente, as mães também são diferentes. E assim como os filhos, os passarinhos também mudaram. Talvez quem não tenha mudado tenha morrido antes do tempo. Sem falar na quantidade de pessoas que sobrevivem com farelinhos de amor. Dagger contava com a luz do fundo da caixa, quem recebe "coro" só conta com a raiva.

Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 11/11/2008
Reeditado em 11/11/2008
Código do texto: T1277147
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