ANÁLISE DE CANTADAS 1 (“– Que tal um minuto de conversa?! Boca a boca, de preferência!” )

No processo da sedução, geralmente existe, por parte daquele que assedia, a intenção de gerar um clima de humor, uma situação que faça rir, que deixe no ar um clima de descontração. É no contexto desta pretensão que se destaca o “jogo com linguagem” (ou seja, a exploração humorística da flexibilidade permitida pela língua).

No caso desta cantada, é utilizado um recurso interessante: o locutor evoca primeiramente, ao chamar a pessoa-alvo para conversar, uma situação dialógica tensa – aquela em que se diz: ‘... de cara a cara!, de homem para homem!, de mulher para mulher!, etc.’. Esta evocação, no entanto, não está claro na primeira frase, na qual parece se tratar apenas de um convite para conversar. Somente depois que o locutor especifica o caráter do diálogo, (de) boca a boca, fica óbvia a alusão à situação dialógica tensa.

Diante deste enunciado, tenta o interlocutor estabelecer a coerência das informações ouvidas, mas não consegue de imediato. Então parte para a dimensão inferencial e associa boca a boca ao beijo, passando primeiramente pelo script ‘respiração boca a boca’. Neste instante, a descontração prevalece sobre a situação tensa anteriormente evocada, pois o “jogo com a linguagem”, em seu potencial humorístico, se torna evidente.

É exatamente este jogo de equívocos, esta exploração da polissemia e do conhecimento enciclopédico, que produz o humor e traz preciosidade à enunciação. Se se dissesse: ‘me dá um beijo?!’, ou coisa parecida, não haveria humor. A informação estaria gratuita.

Esta constatação merece destaque. Prova que as cantadas se estribam em certo exibicionismo. Aquele que assedia quer aparecer. E de que forma? Demonstrando ter domínio da linguagem, já que, no mundo dos humanos, a linguagem é poder.