A REDAÇÃO DE BIÉ

Um comerciante do bairro de Paripe, chamado Luiz Gonzaga, fiel colaborador do Colégio Cenecista, membro do Conselho Comunitário do Colégio, estando candidato a vereador, ofereceu três ônibus aos alunos das sextas séries, para fazerem uma visita às indústrias do CIA - Centro Industrial de Aratu. Tavava-se de um complexo industrial, com cerca de mais de 60 indústrias; infelizmente, hoje, não passa de um simples cemitério de indústrias.

Foram à excursão com os alunos, diversos professores, de variadas disciplinas. Os estudantes embarcaram nos ônibus com uma euforia congestionante. Uns levavam gaitas e pandeiros; outros, violão e ganzá, e alguns portavam máquinas fotográficas e carregavam pranchetas. No início da viagem, foi feita uma oração, rogando a Deus pelo sucesso. Durante a viagem, eles cantavam, tocavam, brincavam e tiravam fotografias. Foi alegre até o complexo industrial.

No CIA, os alunos organizaram-se em equipes, sob a supervisão de professores. Dividiram-se e trataram de visitar as diversas fábricas, nas quais puderam observar o processo de confeçção dos produtos. Conheceram os laboratórios, receberam brindes, assistiram a filmes, ouviram palestras,receberam lanches e prospectos informativos.

O projeto pedagógico orientava que cada professor deveria fazer uma atividade didática referente à visita às indústrias do CIA relacionada com ao conteúdo de sua disciplina. Como no seguinte exemplo: o tema que o professor de História deveria pedir aos alunos seria: "A História das Indústrias na Bahia". O de Geografia deveria fazer um trabalho em equipe com eixo temático "A Produção das Indústrias na Bahia". O de Ciências: "Processo de Fabricação de Produtos Industrializados". O de matemática: "O Custo Diário e Anual das Empresas", etc. O de Língua Portuguesa solicitou uma redação, tendo como tema: "A importância das Indústrias na Bahia". E, no texto, os educandos deveriam inserir, no mínimo, três conjunções e três advérbios, grifando-os, sendo capazes de classificá-los oralmente.

Em uma das aulas de Português, o professor perguntou à classe:

- Quem conseguiu fazer a redação, inserindo no texto as três conjunções e os três advérbios? E é capaz de classificá-los, oralmente?

Diversos alunos responderam:

Eu! Eu! Eu fiz! Eu também fiz, professor!

O professor pediu que alguns lessem a redação e classificassem as conjunções e os advérbios. E assim foi feito, com sucesso.

Tinha um aluno, de nome Benedito, chamado carinhosamente pela turma de "Bié". Era um rapaz bem humorado, prestativo com os colegas; usava óculos de lentes grossas e cabelos pretos cortados baixinhos. Era moreno, de fala bastante explicativa, pronunciava os "ss" finais das palavras com destaque. "Bié" tinha um físico avantajado para os 16 anos, com aparência de 18; usava bigode, gostava de fazer gracejos para a classe e, bastante polêmico, questionava qualquer assunto que fosse exposto em aula. Esse aluno estava sempre levantando a mão, com ansiedade, para fazer a leitura de sua redação, dizendo:

- Professor! Professor! Eu fiz melhor do que eles. Eu consegui facilmente colocar todas as conjunções e os advérbios na minha redação. Estão todos grifados. Quer que eu leia?

O professor, com o semblante sereno, fitando Benedito, pediu-lhe:

- Sr. Benedito, por favor, você pode ler para a classe sua redação?

- Pois não, professor. Eu leio com bastante prazer e atenção.

Imediatamente, o educando, demonstrando um pouco de nervosismo e ansiedade, começou:

- A IMPORTÃNCIA DAS INDÚSTRIAS DO CIA PARA A BAHIA.

As turmas das sextas séries saíram do nosso colégio, em três ônibus, fazendo um fuzuê danado de divertido. Eu e meu colega Marcelino, vulgo Lino, tiramos muitas fotos,e, mas, porém, contudo, todavia, entretanto, no entanto, não obstante... ali as meninas cantavam e..."

Nesse instante, professor, demonstrando um rápido sorriso sem graça, no momento em que a classe inteira ria, pediu ao aluno, em bons termos de fala, para interromper a leitura do texto e disse-lhe:

- Seu Benedito, não é desa maneira que devemos empregar as conjunções e os advérbios. Não foi assim que eu ensinei à classe. Não propusemos a redação deste modo. Ela deve ser feita como os seus colegas acabaram de apresentar.

E o aluno, imediatamente, questionou-lhe:

- Professor, o senhor não explicou direito. Quero ver como vai ficar! Se vocês não gostaram, tudo bem! Mas professor, Professor! Por favor! Cadê minha criatividade? Será, colegas que ele não avalia a criatividade dos alunos?!!!

Este texto encontra-se publicado na II Coletânea de Textos Seletos: poesias, contos e crônicas. Editora Mar de Ideias.

EVERALDO CERQUEIRA
Enviado por EVERALDO CERQUEIRA em 11/03/2006
Reeditado em 13/02/2010
Código do texto: T121655