ANÁLISE DE CANTADAS (“Cada vez que penso em ti, uma lágrima escorre dos meus olhos e cai no chão... Socorro, eu não sei nadar!”)

Para melhor entendermos os efeitos lingüísticos que permeiam esta cantada, pensemos em algo óbvio da enunciação: a expressão – corporal, facial etc. – do enunciador e talvez os turnos precedentes (se os houve) denunciam tratar-se de uma paquera. Portanto, ao dizer ‘eu penso’, ‘eu choro’, evoca-se uma situação de intenso envolvimento sentimental (o ‘penso’, aqui, não é um simples pensamento sem grande importância, mas o pensamento de alguém que sugere estar fortemente envolvido quanto ao sentimento. Gosta da pessoa amada, mas não tem o seu sentimento correspondido, razão pela qual chora sempre que pensa nela). Esta situação, por sua vez, é paulatinamente negada no decorrer do enunciado, já que a elaboração poética e a construção do humor, especialmente nesta cantada, extrapolam o compromisso com a verdade – talvez não haja nenhuma paixão.

O humor, então, aflora-se com as frases finais ‘socorro!’ e ‘eu não sei nadar’. Vê-se que a dimensão superficial (patente) e a inferêncial (subjacente) do texto dialogam-se:

1º) o que vale aqui, nesse momento, não é a informação patente, mas a que não foi verbalizada na superfície textual, a qual sugere um grau superlativo na intensidade e freqüência (com que ocorre) do pensamento (e, por conseguinte, do sentimento) do locutor para com a pessoa-alvo.

2º) a informação de que ‘eu não sei nadar’ e o pedido de socorro funcionam anaforicamente, já que, referindo-se às informações anteriores e dando-lhes sentido, evidenciam a trágica situação do enunciador, que está prestes a morrer imerso no lago formado pelas próprias lágrimas. Então, “em apuro”, pede socorro exatamente à única pessoa que pode “salvar a sua vida” (temos aqui o script “morrer por amor”), a pessoa amada.

O humor ocorre, no caso desta cantada, por dois motivos básicos:

1º) pela reversão da preocupação estilística do texto, a qual passa de poética para humorística.

2º) pela compreensão do sentido inferencial – cuja tônica repousa-se na afirmação do locutor de “estar, quanto ao sentimento de paixão, intensamente envolvido com a pessoa-alvo” –, a qual, por fim, sugere um retorno à dimensão superficial e uma conseqüente reflexão sobre as habilidades lingüísticas empregadas.