O médico, o remédio, o curandeiro e a meizinha.
Aos quarenta e tantos começamos a descobrir o universo do condor: com dor aqui, ali e lá num sei aonde. Descobrimos também os médicos, os remédios, os curandeiros e as meizinhas.
Detesto médicos, não um em particular ou uma especialidade, detesto o fato de que quando se vai ao primeiro, parece que abre a caixa de pandora e é um tal de remédio pra isso e praquilo.
Sou uma criatura diabética, por força da genética e por que eu nunca tive moderação para coisa alguma, reconheço e admito que nunca me preocupei com peso, forma e modelo; comi, bebi, amei, fumei muito, tudo e bastante...ainda como, bebo, amo e fumo, apenas fui obrigada a moderar meus apetites. Mesmo assim acho tudo isso um saco.
Saco maior é ter de ir ao consultório e ficar olhando com cara de pastel aquele indivíduo ditando regras e dando sábios conselhos. Isso os moderados e equilibrados; pior ainda é quando estamos diante dos delirantes e dos fanáticos, esses sim, uns chatos de galocha.
Há alguns anos um me disse assim:
- A senhora é obesa, diabética e fumante. Vai morrer.
Tive raiva e achei graça, e pior, respondi na bucha, usando dessa minha permanente falta de paciência e educação:
- Ah, tá! E o senhor não vai morrer não, né? Vai virar cancão.
Só os imbecis profetizam sobre o óbvio. É óbvio que vamos todos morrer, de um modo ou de outro, por isso ou por aquilo. Só se morre de morte, de que é a desculpa que a sujeita dá pra nos levar, apenas.
Outra peste é médico de plano de saúde. Eles vivem trabalhando em linha de produção de fábrica, atendem mal e porcamente, prescrevem mil remédios, todos caríssimos (muitos pegam o jabá de laboratórios caros que os bancam em troca de receitarem esse ou aquele remédio, em geral top de linha).
Outro dia fui a uma doutora que me atendeu de dedo em riste (tive um pouco de medo dela, tive a impressão que ela ia me morder) falando contra minha imoderação e meu excesso de peso, enfim, me deprimiu, me tratou mal, não me deu alento e nem tranqulidade, ganhou lá o dinheiro do plano de saúde (que pago revoltada) e receitou remédios caríssimos, apregoando que os genéricos não valem nada.
Tenho saudade do tempo do médico da família, um senhor respeitável que vinha na sua casa, era chamado de "tio" pelas crianças e de "compadre" pelos mais velhos; essas pessoas que se preocupavam e se interessavam pela sua doença, assim como pelo estado dos seus sentimentos e que traziam, além da receita, a solidariedade humana que é tão necessária ao doente.
Eles não eram especialistas em nada definido, eram clínicos, mas tão gerais que tratavam a infestação do piolho e a frieira e o mioma, o apendicite. Mesmo que não pudessem curar o câncer que se instalava, estavam ao lado da família, procurando aliviar a dor dos vivos.
E se você fosse no consultório deles, nunca saía sem os conselhos solicitados e as amostras grátis que você nem havia pedido.
Tive o prazer de conhecer dois homens assim, ambos já falecidos, já que os bons partem cedo: Dr. José Mário Mafra e Dr. Jaime Melo.
Homens que sabiam que não podiam vencer a morte e nada prometiam em relação a isso, mas que davam aos vivos o apoio necessário à cura, por que o corpo se cura ou morre, independente do que se faça e eles sabiam disso. Mesmo assim, lutavam contra "la magra" até o ultimo suspiro.
Talvez por que conheci dois grande homens, tenho o defeito de medir os demais por eles. Ai! medida dificil, viu? Ainda não achei. Pode ser que exista, tem de tudo nessa vida, afinal.
Só sei que a doutorazinha que me perdoe, mas se eu não respeito e nem temo a minha diabetes, é dela que vou ter medo? Agora eu tenha!
Não esqueçam que tenho um tiranossauro dentro da minha cabeça, que é inglês, irônico e elitista e que o meu coração comeu alguém.
E os curandeiros e as meizinhas? Alguns prestam, outros não, assim como os médicos, a diferença é que por estes, não preciso pagar uma fortuna, além do que, se o cabra não tiver que morrer naquele dia e nem estiver comprando ingresso pra isso, eles curam do mesmo jeito.
O T-Rex balança a cabeça e eleva sua sobrancelha ironicamente inglêsa e me pergunta se acho bonito fazer apologia à falta de controle dos apetites.
Ai, dinossauro, me poupe.