Vila do sossego
Na contramão dos grandes centros urbanos, com seu costumeiro caos forjado a concreto e gente, felizmente ainda existem lugares que parecem ter sido recortados da realidade. Na virada do ano eu tive o imenso privilégio de conhecer um deles.
Trata-se de Siribinha, uma praia do litoral norte da Bahia, pertencente ao município de Conde, a cerca de 200 km de Salvador e a menos de uma hora de carro da fronteira com Sergipe. O local é relativamente de fácil acesso, mas seus quase 12 km de estrada de terra garantem o isolamento ideal para afugentar farofeiros e caçadores de agito.
Ao lado de Mangue Seco – que ficou famosa por servir de cenário para a novela global Tieta, na década de 90 – Siribinha é uma vila de pescadores com menos de quinhentos habitantes. Ali o tempo parece ter parado e seus nativos ainda carregam uma pureza peculiar das pessoas simples e, de certa forma, livres dos vícios e medos que cada vez mais impregnam as cidades e seus urbanóides.
Siribinha é um lugar para quem gosta de sossego, praias vazias, paisagens estonteantes e preços bastante acessíveis. Suas pousadas são modestas e praticamente todas pertencem aos moradores locais. Realmente não são para os que fazem questão de luxo e serviços requintados. No entanto são charmosas, têm o que há de melhor em receitas praianas e ficam a alguns passos do mar (que à noite, dos quartos, pode ser ouvido como música).
A vila, que tem na Capela de Bom Jesus dos Navegantes um referencial bucólico para moradores e turistas, é formada basicamente por um grande largo com piso de areia e muitos coqueiros e amendoeiras. No fim de tarde, nas portas das casas, pescadores podem ser vistos remendando as suas redes que serão levadas para alto mar em barcos e canoas.
Numa das margens da extensa faixa de areia um mar verde-escuro emana uma brisa contínua que abranda o forte calor tão comum no litoral nordestino. O mesmo mar lança todo o tempo uma infinidade de conchas multiformes e multicolores – os souvenirs mais originais do lugar. Na outra margem um vasto coqueiral compõe o que se pode chamar de um perfeito cenário de filme. Aliás, a barra de Siribinha – onde deságua o rio Itapicuru – serviu mesmo para algumas tomadas do filme Tieta, estrelado por Sônia Braga.
Passeio obrigatório é a travessia do Itapicuru num pequeno barco a remo para uma aventura em Cavalo Russo – um rio de águas limpas e vermelhas (por causa da grande quantidade de ferro), cercado de dunas brancas a atravessado por uma estreita ponte de madeira. Quanto aos nomes diferentes, a exemplo de Cavalo Russo e da própria Siribinha, os nativos de vozes mansas e gestos idem não fazem a menor idéia de como e onde surgiram. Questionado por mim sobre isso, um deles parou, pensou e deu com seu sotaque-baiano-caricatural a mesma resposta de todos os outros: “rapaz, eu já perguntei aos mais velhos da vila, mas eles dizem que quando chegaram aqui os nomes já eram esses”. Fiquei satisfeito com a explicação. Afinal, ali vale mais mergulhar nas belezas naturais do que entender a sua história.
E viver as indizíveis sensações proporcionadas por aquela Vila do Sossego, como diria o paraibano Zé Ramalho numa de suas músicas, é prestar atenção a tudo ao seu redor. A dois, então – como eu estava em companhia da minha doce Luciana – nenhum detalhe parece escapar. Enquanto a maioria certamente se encontrava diante de uma televisão, vidrada nos astros e estrelas das novelas, lá estávamos de frente ao mar, com os pés na areia, assistindo a uma constelação que cada vez menos pessoas param para admirar. À noite o céu de Siribinha é um espetáculo à parte!