Afinal, por que escrever?
Por esses dias, deparei-me com uma pergunta com a qual, imagino, muitos escritores já se depararam em algum momento: por que escrevo? Sim, por que motivo, razão ou circunstância escrevo? Ela me foi feita por um rapaz, por Internet, mas preferi não responde-la de modo tão virtual.
Creio que essa é a questão mais comum de encontrarmos, ainda que não a mais simples, nem mais fácil, de ser respondida. Responder a essa questão, ou melhor, tentar responde-la, além de sanar sua curiosidade, vai sanar um pouco da minha pois, meu amigo, nem eu mesma sei.
No começo, não era sequer escrita, era apenas leitura. Ler com certeza é uma das melhores maneiras de se descobrir escritor. Ora, como saber se gostamos de sorvete de chocolate se nunca provamos? Da mesma maneira podemos pensar: como saber escrever sem gostar de ler?
Pois é, imagino que, se você um dia já leu, se já desenvolveu a leitura por prazer e gostou do que fez e, ainda, se já está viciado, você não necessariamente vai querer escrever, mas as chances de surgir um escritor nessa relação de amor e ódio com os livros aumenta, e muito.
O que vem logo atrás é o querer escrever: um belo dia você acorda com uma vontade de colocar no papel um monte de pensamentos que, de repente, dariam um texto legal. Eis que, nesse momento providencial, uma folha de papel em branco, guardanapo ou papel de embrulho se destacam ao seu olhar. Pronto, não há escapatória...
Tudo bem, aí você escreveu torrentes do que lhe veio à cabeça, matutou, riscou, etc. E agora?
É, amigo, com certeza, a coisa nem começou ainda. Talvez seja nesse ponto que se coloque a bifurcação, cujos caminhos que seguem direções opostas são indicados com as placas “Início” e “Fim”. Os que seguem pelo segundo caminho são os que imaginam que escrever é isso, melhor dizendo, só isso. Eles apenas dão vazão ao que lhes ocorre sem ter preocupação alguma em lapidar o texto, o que sem dúvida desvalorizaria até mesmo um Goethe ou um Cervantes. E caso sejam realmente ambiciosos o bastante para seguir escrevendo, imaginam que escritores nascem prontos – assim como qualquer artista – e gozam de uma situação privilegiada de intérpretes da existência, investidos que são do dom inato(?) da escrita. Está aí um tipo que, com certeza, acaba não indo para frente, não fazendo juízo à designação de escritor. Não que não se deva jogar no lixo o lirismo. Quero dizer que o que não pode é cair no comodismo intelectual de não julgar necessário reler um texto ou poema, estudar gramática ou abri um dicionário.
É aí que, em nossa pequena história, entram os viajantes que seguem o caminho marcado com “Início”. Para esses, ter motivos para escrever, sobre o que escrever – e realmente escrever – é apenas o começo. A questão do talento e amor ao que se faz é muito importante para alguém que se pretenda escritor, e não apenas nesse caso, mas em todas as outras atividades que uma pessoa possa seguir. Por isso, o que faz a diferença do bom escritor – assim como de qualquer outro profissional – é o empenho, a vontade de fazer bem o que se faz e, principalmente, a consciência de que ninguém nasce sabendo tudo, e nunca se pára de aprender.
E é ai que eu queria chegar. Como dito, a questão colocada no princípio, talvez eu não conseguisse responder, não totalmente. O que não signifique que eu não vá tentar. Pensando bem, escrever é um ato de fantasiar, de contar histórias, mas também de colocar para fora o que, por vezes, te alfineta, ou mesmo o que você vê de muito errado e fica indignado com a indiferença do resto do mundo. Escrever é sorrir, é amar, ter a possibilidade de dizer um pouco de você a pessoas que, provavelmente, nunca saberiam da sua existência, nem você da delas. Mas também é chorar, destilar o que te magoa e o que te revolta...
Enfim, a questão é complexa porque rica. Mas uma coisa é certa e, creio eu, todo escritor concorda: escrever não é apenas colocar no papel, em palavras, algo sem sentido e tosco, mas dar a cada idéia, proporção ou sentimento expresso o reluzir singelo e humilde, a fim de permitir que o leitor veja um pouco de você, e quem sabe, um pouco dele também. Afinal, somos todos iguais enquanto seres humanos e o ato de ler geralmente termina no horizonte de um grande espelho te mostrando seu próprio eu no eu de outra pessoa.