Crônicas de Esquina 9 ( Costa )
COSTA
Em todo bar a fauna é rica e variada. Pessoas de todos os matizes, formatos e tamanhos, acompanhadas de idéias e manias não menos diversas, reúnem-se por qualquer motivo ou por motivo nenhum. Mas há também os melindres, os arroubos, as idiossincrasias singularíssimas.
A incrível diversidade de gostos e graus de exigências reclamam por tratamento e atenção igualmente díspares. Tudo isso torna difícil administrar o estabelecimento sem provocar ranhuras, ainda que passageiras. Nessas horas, é preciso ser um profundo conhecedor da psicologia de massas. Aqui, a arte da convivência tolerável é algo da maior importância. É preciso cuidado para não ferir susceptibilidades; para suportar os gritos de mesas mais festivas; para nunca perder a paciência com os ânimos mais exaltados. Uma palavra mal colocada e a paz fica ameaçada. Nessas horas, o dono vê-se diante de situações inusitadas.
Bares de passagens são geridos com relativa facilidade. Neles, as pessoas chegam, pedem algo e vão embora. É o cigarro, o cafezinho, a caninha tomada numa única talagada. Não se querem conhecer. São bares lucrativos e que funcionam nos limites de um expediente rigoroso. Neles, não se esquenta cadeira.
No entanto, bares como o do Costa, que se transformam numa espécie de segunda ( ou primeira? ) casa, amargam lá seus dissabores. Clientes assíduos exigem privilégios e, ainda que os mereçam não deixam de, nos momentos de casa cheia, causarem algum tipo de constrangimento. Mormente nos finais de semana ensolarados, entre a manhã e a tarde, o ambiente perde um pouco o seu charme habitual dos dias de semana. Crianças libertas de pais libertos correm entre as mesas. Alheias, como convém a essas criaturinhas de Deus, elas ameaçam copos e garrafas, obrigando os garçons a um singelo balé de bandejas.
Cachorros são trazidos por seus donos e, esparramados pelo chão, tornam o trânsito propício a pequenos acidentes e caras feias dos mais incomodados. O cronista, inclusive, pede desculpas por ser um dos que, com a sua Marrenta, contribui para a instabilidade da dinâmica barística. No entanto, nem o Costa e nem o Zeca’s parecem incomodados com isso e, assim, nada se altera. Calmos, empurram o dia e o tornam o mais agradável possível. Apenas o nosso Costinha é mais arrojado e aguerrido, mas que muitos traduzem por grosso e folgado. Entretanto, convenhamos, nem tanto ao mar nem tanto à terra. Seu jeito truculento de tratar clientes e diletos amigos é mais folclore que intenção. E no final das contas – pagas ou não – o Bar do Costa é mesmo um pedacinho do céu com um São Pedro mal-humorado, mas gente boa.
Aldo Guerra
Vila Isabel, RJ.