Crônicas de Esquina 8 ( Tchibum )

TCHIBUM

Em sua recente entrevista à " Caros Amigos ", Paulinho da Viola, ao relatar como contraíra malária na infância, acendeu-me as luzes do porão das lembranças e atirou-me, outra vez menino, nas águas geladas do Tchibum de Vila Valqueire. Sua menção repentina comprometeu-me a leitura e sequer tive tempo de maldizer o incauto anofelino que impaludou o nobre compositor, e quase nos privou das melhores pérolas do samba carioca.

O Tchibum era um reservatório de água da CEDAE. Um enorme tanque que, a bem da verdade, não sabíamos para que servia, exceto de ser o nosso primeiro piscinão. E só sabíamos que seu uso era oficialmente proibido por conta dos eventuais seguranças que, bem ao jeito do funcionalismo público, nunca permaneciam muito tempo no local. Nessas horas, ficávamos atrás das moitas, quietos, de atalaia. E quando nossos agudos ouvidos mal percebiam o ronco do motor da caminhonete oficial, era a festa. Corríamos para o tanque como quem, em pleno deserto, avistasse um oásis.

Quase ouço, agora mesmo, a correria de Maurício Tatu, aos berros: "O último a chegar é mulher do padre!"... E tchibum. O mergulho, a barrigada, a confusão de mãos batendo. Deixávamos ali nossas sujeiras das peladas no campinho da Aeronáutica, em Marechal Hermes. Ali, lavávamos nossos suores e humores; a cara suja de manga, goiaba e coquinho-de-catarro, colhidos enquanto caminhávamos; os pés empretecidos e os cordões desenhados no pescoço. Ali, enxaguávamos a alma para que a infância não se perdesse e se renovasse como nos batismos. Como agora, numa simples palavra de entrevista. Obrigado, Paulinho.

Aldo Guerra
Enviado por Aldo Guerra em 26/02/2006
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