CAFÉ REQUENTADO

Era um domingo especial; a patroa estava na casa da mãe, e lógico que com filhos, além do que folga da empregada que imagina que dieta no final de semana, ela é que não sabe para que existem restaurantes! Mas estava tudo na paz, eu com uma cama larga só para mim. Ainda eram oito horas da madrugada, afinal aos fins de semana a noite estica. A campainha que é útil, mas por vezes inconveniente, touco insistentemente. Acordei e olhei pela fresta janela e me parecia um jovem Testemunha de Jeová, com todo apetrecho literário sobre a vida de Jesus, que eles crêem diferente, mas sabem que por ele vem a salvação. Gritei que desceria, fazendo entrar aquele homem pelo jardim, até a porta da sala.

Mal abri a porta seu pé já se adiantava da soleira, e bastou meu bom dia para que o corpo do dito cujo penetrasse e escolhesse o mais confortável sofá de minha sala. E escancarou de sorrisos e anunciando: “Vim lhe trazer a salvação”, eu sempre temeroso a Deus fui amistoso e retribuí a boa nova com um sorriso e um cafezinho coado no dia anterior, mas ainda quentinho. Foi quando abriu a pasta me deu “santinho” de propaganda eleitoral e lembrou: “Só o voto popular do povo muda essa nação”, e antes eu pudesse reagir complementou: “Se eu eleito for prometo que roubarei menos, que os atuais”. Ora bolas! Esqueci minha popularidade, e só não o mandei e ir para aquele lugar, porque creio quem nem a mamãe lhe daria o voto! Para ele sair, fui obrigado a mentir que o arroz estava queimando!

Pouco antes dele se ir fiz questão de lhe pedir de volta o “santinho” que eu havia devolvido, o deixando mais sorridente ainda, porém logo fui complementando: “É que as crianças estão colecionando um álbum de mocinho e bandido, e na página dos bandidos falta um”. E lá se foi para a sala do vizinho. Agora é época de você falar mal a todos os políticos, eles não estão nem ai para seus sentimentos de vergonha ante o país que moldam, querem é garantir o voto, nada mais. E já que tenho que escolher que eu escolha o melhor!

Interessante é que fui candidato a vereador na eleição passada, eu necessitava de um mil e duzentos votos. Tive setenta e quatro, mas em compensação devo ter economizado o valor correspondente a cem dentaduras, cento e cinqüenta óculos, uns trezentos botijões de gás, uns quinhentos sacos de uns mil saquinhos de pipoca, e por ai vai. Fiquei triste com minha “impopularidade”, mas no dia da diplomação dos “eleitos” me locupletei com o juiz dizendo: “Seu Pedro, entre os setenta e quatro votos seus, o meu está lá!”. Existem eleitores de todos os preços e candidatos que tira uma merreca do “mensalão”, para nessas épocas comprar o voto. Não sei, mas refleti e antes que me apareça outro pior, vou decidir se voto ou não no “Pereba”, apelido de campanha do tal candidato, afinal ele me prometeu a “salvação” e é candidato número um. Foi o primeiro a bater em minha porta e tomar lambendo os beiços um café requentado.