NADA SEI
NADA SEI
Marília L. Paixão
Essa noite não me agrada, não me afaga, não me ama e nem me deixa. Essa noite não me beija, não me mata, não me desespera e nem me fere a alma. Essa noite poderia ser uma noite qualquer se eu me sentisse solta. Essa noite não me liberta, mas também não me prende e tão pouco sufoca. Essa noite não seria uma noite para comer pipocas.
Há noites em que nos sentimos perdidos sem nenhum risco de sermos encontrados. Deve acontecer quando não pulamos de pontes ou fugimos de gatilhos que nem estão em nosso encalço. Deve acontecer quando perdemos sorrisos ou quando sentimos os olhos umidecidos. Acho que na verdade estou fazendo desta noite tudo que não poderia. Por conta de uma manhã de velório tranquei-me para o trabalho e outras coisas da vida. A morte é mesmo uma coisa esquisita. Fiquei pensando em minha mãe e no quanto mais de vida ela teria. Poderia bem morrer primeiro para nunca saber.
Que mais eu fiz do dia, que mais me prendeu? Assisti ao documentário sobre o 11 de setembro. Chorei ali como me emocionaria milhões de vezes. Nada nunca mexeu comigo tanto quanto a queda daquelas duas torres. Eu sempre vejo um mundo inteiro ali desmoronando. Da vontade de colocá-las de volta no lugar. Dá vontade de devolver todas as vidas que estavam lá.
Muitas vezes a morte vem nos ver sem nos deixar um visto. Talvez a fria manhã cheia de morte, cheia de rezas mal acompanhadas me perseguiu noite afora. Não sei da minha glória e gostaria de encontrá-la antes da morte, senhor.
Será que essa noite é para que eu reze?
Não sei se é não senhor.
Às vezes nem sei se sei rezar
Mas se não estiver rezando aqui agora através destas palavras...
Nada sei.