Como uma caixa de bombons

("A vida é como uma caixa de bombons. Você nunca sabe o que vai encontrar dentro..." Forrest Gump)

Tinha mais ou menos uns 13 para 14 anos. Na escola, estava acontecendo um festival de talentos, onde os alunos que quisessem poderiam se inscrever para cantar, dançar, interpretar ou tocar algum instrumento. (Na sala de aula, muitas vezes, eu me pegava cantarolando alguma canção toda vez que olhava através da janela e descansava meu olhar na paisagem ao lado: uma mata verde que se estendia longe. Lindo. Lembro que alguns amigos que estudavam no centro até me gozavam. "Ah, tu estuda naquele colégio que fica lá no meio do mato, né?". Sim. E era muito bom isso, de estudar num colégio que fosse "no meio do mato", integrado com a natureza. Era um verdadeiro paraíso (élfico...). Privilegiado era aquele que pudesse olhar pela janela de sua sala de aula e contemplar a natureza ali ao lado, nos observando também...)Mas naquele festival de talentos, não sei de onde tirei coragem, resolvi cantar. Subi no palco, peguei no microfone e olhei para todos aqueles olhos me olhando.

E comecei a cantar, assim, sem instrumento, acompanhamento musical, nada. Só a minha voz de adolescente. Os prêmios era singelas caixas de bombom. E eu acabei ganhando uma e os aplausos dos meus colegas de escola. Legal. Me senti feliz.Mas durou pouco. Na saída, várias pessoas se achegaram querendo um bombom. "Me dá um bombom, me dá um bombom". Eram tantos os pedidos. E tão pouco chocolate que eu não sabia o que fazer. Gostaria de poder dar um para cada. Mas eram tantas mãos pedindo, me puxando. Ao mesmo tempo em que senti vontade de partilhar o que eu tinha ganhado, também me senti triste, pois várias daquelas pessoas à minha volta não se deram conta de que aquele brinde era meu e eu deveria fazer uso dele e reparti-lo com as pessoas que me eram mais queridas, essas sim, nem se achegaram para pedir algum doce. Ingenuamente, abri a caixa de bombons para iniciar a distribuição e alguma mão se avançou sobre os doces e outra mão e outra.

Em uma fração de segundos me vi segurando aquela caixa vazia, com cara de tolo. Foi quando aproveitei que ela ainda estava em minhas mãos e dei um tapa na caixa, arremessando-a para o alto e fazendo voar bombons para todo o lado. Nesse momento, parecia que eu estava vendo a cena em câmera lenta. No dia anterior havia chovido e havia poças d'água na calçada. Os bombons caindo e aqueles pedinchões não se importando em recolhê-los até dentro d'água. Outros, quase se cascudeando por um doce. E a caixa vazia no chão. Apesar de minha vitória, eu tinha sido o maior perdedor. Ajeitei minha mochila nas costas e fiz de conta que não me importava com aquilo (ainda que, criança, me importasse muito...). Ainda tive que ouvir um egoísta dizer que eu não lhe tinha dado nenhum bombom, tendo optado por jogá-los fora. Mas era tanta gente querendo e tão poucos doces, que me vi incapaz de compartilhar o pouco que eu tinha com tantos. E, assim, tive uma lição de como funciona o egoísmo. E de como isso me irritava profundamente...

Márcio Brasil
Enviado por Márcio Brasil em 11/06/2008
Reeditado em 11/06/2008
Código do texto: T1030223
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