O PODER DA ORAÇÃO
Era uma manhã chuvosa, início do mês de agosto. Eu necessitava ir até Agencia Central dos Correios para postar algumas correspondências da Fundação, onde trabalhava. Ao sair dos Correios tive a surpresa e felicidade de encontrar um velho amigo da época de estudante da Universidade Católica de Salvador. Ele estava passando a chuva debaixo da marquise do prédio dos Correios. Dei –lhe um abraço e perguntei:
- Lacemir, como vai você e as suas pesquisas
científicas?
- Meu amigo, com a mudança da gestão do Governo
Federal, os recursos destinados às pesquisas científicas do “Projeto Sertanejo” foram reduzidos e depois cortados. Os cientistas estrangeiros que estavam à frente do projeto retornaram para os seus países. Na verdade, o projeto em termos científicos foi uma catástrofe e conseqüentemente resultará gradativamente na alteração do meio ambiente da região onde estava sendo executado. Enfim, foi uma decepção para mim. E você, meu amigo, que está fazendo?
- Eu trabalho como gerente financeiro, para uma Fundação. E durante a noite leciono no subúrbio, em Periperi.
- E você, que está fazendo atualmente?
- Para lhe dizer a verdade, eu não estou fazendo nada.
Há dois meses que procuro um trabalho e até agora não encontrei nada para fazer. Como Licenciado em Biologia, mandei meu currículo para alguns colégios particulares e me disseram que durante os meses do meado do ano é impossível, pois os quadros de professores dessas escolas já estão completos. O jeito é aguardar até o fim do ano letivo para ser contrato. Como Biólogo, tenho experiência em trabalho de campo, em laboratório para fazer experiências de mutações genéticas ou reprodução de peixes de água doce. Para exercer qualquer função no momento como biólogo é difícil. Mas, meu amigo, voltando ao assunto do “projeto”, quando os recursos destinados ao tal projeto começaram a ficar escassos, eu me lembrei do que você me
dissera uma vez: - Lacemir, se eu fosse você não iria fazer parte desse projeto, porque o Governo Brasileiro não costuma dar prioridade aos investimentos em pesquisas científicas. O governo só investe em obras de fachada, que dê votos. Essa questão é um vírus histórico, que precisamos arranjar uma boa vacina para acabar com essa doença de uma só vez. E ainda me falou que o Governo negou o visto de permanência no Brasil ao cientista alemão Albert Einstein, pois era um sonho do cientista morar no Brasil, enquanto os Estados Unidos da América acolheram e aproveitaram o cientista. E eu lhe chamei de subversivo, de pessimista, de antipatriota, lembra-se?
-Ora se me lembro, Lacemir! Você, quando iniciou
a estudar Biologia, me dizia: - Eu sou fascinado pela Biologia. Vou ser biólogo! No entanto, se passaram quase nove anos e esse tal “Projeto Sertanejo” fez você perder o seu tempo em produzir e crescer no mundo científico. É verdade, irresponsavelmente gastaram somas de dinheiro do erário público, comprometeram o meio ecológico. E tudo em vão!... Bem, meu amigo: já é quase meio-dia, eu estou com fome, e você está convidado a almoçar comigo para continuarmos o nosso bate-papo. Somente lá para duas horas, quando abrir o Cartório, eu vou reconhecer a firma de alguns documentos da Fundação. Hoje, praticamente, eu tenho a tarde toda para conversarmos, isto é, atualizarmos os nossos bate-papos atrasados... Lacemir, hoje à noite, quando for ao colégio, vou falar com o diretor para ver se consigo alguma coisa para você fazer no laboratório de química ou de taxidermia da escola, pelo menos no turno da noite. Não são lá todas essas vantagens, mas serve... Até você encontrar uma coisa melhor. Onde você está morando, Lacemir?
- Eu estou morando no bairro da Liberdade, ao lado do Colégio Estadual Duque de Caxias.
-Você chegou a se casar?
-Sim, eu me casei com moça sertaneja de um
Lugarejo conhecido como Camaleão, próximo ao açude de Camandaroba – do DNOCS, distrito de Itiúba. Tenho dois
filhos, um com seis e outro com sete anos.
-E você tem atualmente algum parente, aqui, em
Salvador?
- Eu tenho um irmão que é gerente de banco. Ele me
ajuda bastante e trabalha no BANEB. É o mais velho dos meus dois outros irmãos. Você sabe daquele nosso amigo, o Otávio, que estudava direito?
- Sim, ele está muito bem. Está com um escritório de advocacia na rua Carlos Gomes. E por você lembrar dele: aconteceu no mês passado um acidente muito chocante com o automóvel que um colega do Otávio vinha dirigindo. O automóvel entrou debaixo de uma carreta e só Otávio conseguiu escapar por milagre. O carro ficou completamente destruído e, infelizmente, quase todos os ocupantes do veículo morreram. Somente o Otávio conseguiu escapar sem sofrer um simples arranhão. Fui um milagre dos céus, rapaz!
-E você acredita em milagre?
-Acredito sim... milagre existe. Eu tenho exemplos de
milagres. Eu não entendo porque você não acredita em milagre... O milagre está no nascimento e crescimento de uma flor. Está na germinação de uma semente, no nascimento de uma criança. Você é uma pessoa que não ora!... Não tem fé!... Não tem religião! Eu oro todos os dias, meu amigo. Quando me levanto e me deito. Agradeço a Deus pelo dia que passei, pelas pessoas necessitadas, pelos amigos, etc. Quando tenho dificuldade, eu peço ajuda de Deus e alcanço. Eu te digo uma coisa, Lacemir: quando tiveres dificuldades ore com toda fé do seu entendimento. Não deixe de pedir a Deus quando você estiver em dificuldades. Somos filhos de Deus. Ele é o nosso Pai misericordioso e atende às súplicas dos seus filhos. Se você tiver merecimento o milagre surgirá. Lembre-se disso, meu amigo!
Neste mesmo dia, falei com o diretor do colégio a respeito da situação de Lacemir. O diretor acatou com entusiasmo e interesse em conhecer Lacemir e colocá-lo para trabalhar à noite, no laboratório de química.
Na noite seguinte, eu apresentei Lacemir ao diretor do colégio e, neste mesmo dia, lhe foram passadas as chaves do laboratório. Como o salário de Lacemir era pequeno e não dava para cobrir todas as suas despesas, resolvi falar com o Professor Fortinelli da possibilidade de arranjar uma colocação para o Lacemir na empresa onde ele trabalhava. Fontinelli era coordenador do Curso Técnico em
Contabilidade e auditor da CODEBA. Como coordenador
sempre arranjava estágios remunerados para os alunos de Contabilidade fazerem na empresa onde trabalhava. Era uma pessoa madura, com seus quarenta anos, cortês, prestativo, gostava de ajudar às pessoas que lhe procuravam e era bem relacionado na vida profissional. Foi gerente de banco e era hotel, consultor contábil de grandes empresas privadas.
Fontinelli me disse:
- Colega na empresa em que eu trabalho é impossível arranjar uma colocação para o Lacemir, pois a CODEBA é uma empresa pública, só admite mediante concurso público. Amanhã mesmo está saindo um edital da CODEBA, anunciando as inscrições para concurso a diversos cargos. As admissões aos cargos serão de imediato, pois a empresa está necessitando de pessoal. Os salários dos cargos em relação ao mercado são convidativos. Por que ele não se inscreve para se candidatar a um desses cargos?
- Devido à amizade e confiança que há entre nós, Fontinelli, eu te pergunto: Não há influência política nesse concurso público?
- Meu colega, eu lhe afirmo como auditor da empresa que não haverá apadrinhamento nesse concurso público. Se houvesse, eu não recomendaria para o nosso colega fazer.
- Bem Fontinelli, eu lhe agradeço pela orientação que você me deu. Eu vou conversar com o Lacemir para ele se inscrever no concurso.
- Não por isso, meu colega, é um prazer fazer qualquer coisa pelo nosso colega. O que depender de mim eu estou às suas ordens...
Neste mesmo dia, no período da noite, eu fui até o laboratório de química falar com Lacemir.
- Lacemir, eu tenho uma boa notícia para você, meu bom rapaz! Eu falei com o nosso colega Fontinelli e ele me disse que amanhã sairá um edital, anunciando a abertura das
inscrições ao concurso público de diversos cargos na CODEBA. Ele também me disse que os salários dos cargos
são convidativos e que a empresa não admite sem concurso público.
Lacemir com um olhar desanimador, demonstrando uma baixo-estima, disse-me:
- Meu amigo, eu não acredito em concurso público. Em um país cheio de corrupção política e de maracutaia, eu acho que em todo concurso público há fraude, as cartas já estão marcadas...
- Preste bem atenção, Lacemir! O nosso colega e amigo é auditor da empresa, acredito que jamais ele me daria uma orientação insegura, pelo seu caráter e pelo grau de amizade que nutrimos um pelo outro. Deixe de desânimo, tenha fé em Deus e procure orar para que Deus lhe dê uma orientação melhor, rapaz. Eu se fosse você me inscreveria amanhã mesmo...
Cerca de mais de um mês, em um dia de domingo, Lacemir fez o concurso e quando eu o encontrei, na terça-feira, perguntei-lhe:
-Como se foi rapaz com as provas?
-Meu amigo, na prova de redação fiquei em estado de
um completo vazio mental. Deu-me um branco... eu não conseguia escrever nada. Nunca havia me ocorrido aquele estado de espírito. Olhei para ao meu redor e via todo mundo escrevendo. No entanto, naquele momento, eu me lembrei das suas palavras: Lacemir faça uma oração a Deus, quando você se deparar com alguma dificuldade. Então, naquele instante, eu fiz uma oração com fervor e comecei a sentir o meu corpo esquentar. Depois me veio uma paz de espírito animadora e comecei a escrever que não parava mais. Eu só me lembro que escrevi três folhas de papel pautado.
-O quê você escreveu?
- Eu não me lembro...
-Lacemir, isso é um bom sinal!... Você alcançou uma
graça do nosso Pai Celestial! Eu tenho a certeza que se saiu
muito bem!... Vamos aguardar o resultado para glorificarmos a Deus!... Passaram-se uns quinze dias, quando tive a imensa alegria de receber um telefonema do nosso amigo Fontinelli, dizendo-me o seguinte:
- Colega, eu tenho uma boa notícia para lhe dar. O nosso amigo Lacemir obteve a 1a classificação na lista dos aprovados. Avise a ele para comparecer à empresa amanhã. O pessoal da administração geral da empresa deseja conhecê-lo. Ele vai tomar um curso de capacitação para assumir a chefia do almoxarifado da empresa em Aratu. Na noite seguinte, quando Lacemir se dirigia ao laboratório, eu lhe disse:
- Amigo, eu tenho uma boa notícia para lhe dar: Parabéns! Vamos glorificar a Deus! Fontinelli me telefonou ontem à noite e me disse que você foi o primeiro da lista dos provados. Amanhã pela manhã é para você comparecer à empresa, pois o pessoal da administração deseja lhe conhecer. Você vai tomar um curso de capacitação para assumir a chefia do almoxarifado da empresa. Eu lhe disse, Lacemir, que eu tinha plena certeza que você teria se saído muito bem! Deus escreve certo em linhas tortas, meu rapaz!
- Lacemir ficou pálido e me disse muito emocionado: Muito obrigado, meu amigo! Deus é amor, justo e poderoso. Obrigado, meu Deus! Obrigado, meu Deus!!!
E, a partir daquele dia, Lacemir se tornou um cristão fervoroso.