O SR VAI TOMAR CAFÉ- QUER QUEIRA OU NÃO QUEIRA!
Este fato, verdadeiro, aconteceu em Cacequi na metade da década de setenta e, ao contá-lo, agora, me dá uma saudade enorme daquelas pessoas que o vivenciaram e que, fizeram parte de minha vida e de minha história.
O meu sogro Silvério Soares Leal, se encontrava muito doente por ser portador de Diabetes doença que acabou, na linha do tempo, resultado em sua morte.
Como ele era um antigo ferroviário, tinha muitos amigos, na cidade, todos os cacequienses sabiam de sua luta contra a doença.
A gravidade de sua situação não passou desapercebida do Pároco da cidade Padre Hermes Inácio que, por ser descendente dos lendários “Inácios” do Caverá, tinha um gênio muito forte e era inimigo ferrenho de qualquer adepto de outra religião que não fosse a Católica e não raras vezes, para defender as suas posições radicais, chegava a fortes discussões proferindo ofensas verbais a quem dele discordava em termos de crença.
Sua aversão se estendia aos Evangélicos, aos protestantes, aos Luteranos, aos adventistas aos episcopais.
Aos espíritas e umbandistas devotava, então, uma aversão e um ódio totais e não raro nos seus sermões dominicais fazia que questão de dizer que, para eles , estava reservado o fogo eterno dos infernos.
Exercia seu apostolado com visitas diárias, aos católicos além, é claro, da ministração e Catecismo aos jovens e as Missas de domingo, na Igreja Matriz da cidade.
Em uma quarta feira, o Padre Hermes, apareceu na casa da Avenida Madureira para visitar o meu sogro e, logo após ter adentrado à modesta casa, foi encaminhado para o quarto do casal cuja porta foi, por ele, devidamente fechada para permitir confidencialidade total da conversa e das orações que seriam proferidas.
Já decorria quase uma hora da visita e era evidente que logo o Padre Hermes abriria a porta e se despediria do meu sogro e do resto da familia dando por encerrada a visita apostólica.
De repente batem palmas no Portão e a minha cunhada Maria Getúlia foi atender e viu que era o Jovem Pastor de uma Igreja Evangélica que ela frequentava o qual, sabendo da grave situação de saúde de meu sogro, tinha vindo visitá-lo e orar a Deus por ele e por toda a familia.
Antes de abrir a porta, avisou a minha sogra a dona Maria Helena, a qual foi tomada de pânico ante a possibilidade de o Padre Hermes se encontrar com o jovem Pastor e criar-se um confronto inevitável e de proporções que não podiam ser imaginadas.
A minha sogra abriu a porta, cumprimentou o jovem Pastor e, ao invés de mandá-lo sentar-se na sala, o encaminhou para a Cozinha, fechou a porta e disse-lhe:
Vou lhe dar um café.
O Pastor, sem entender nada, disse-lhe:
Não dona Helena, eu lhe agradeço vim aqui, somente, para o ver o sr. Silvério e rezar por ele.
A minha sogra sob forte tensão pela possibilidade de o Padre Hermes sair do quarto de repente, retrucou enfaticamente e disse, com voz forte:
O SENHOR VAI TOMAR UM CAFÉ QUER QUEIRA OU NÃO QUEIRA!
De imediato foi colocando na mesa porções de pão caseiro, biscoitos, bolos e doces de abobora como acompanhamento de uma grande xícara de café com leite.
O jovem pastor estranhando aquela atitude, mas por ser muito educado acatou a ordem e começou a tomar farto café que lhe foi servido.
A minha sogra chamou a minha cunhada e pediu-lhe que ficasse junto com o pastor, na cozinha e saindo, por segurança, fechou a porta da mesma.
Ao chegar ao quarto onde estava o meu sogro, para seu alívio, constatou que o Padre Hermes já tinha acabado a Oração e estava aspergindo Água Benta, sobre a cama e sobre as paredes do quarto.
Acabado o Ritual, apresentou suas despedidas e dirigiu-se para a sala de onde ganhou a porta e foi embora.
A minha sogra foi com ele até o portão e lhe deu acesso a rua.
Com isto teve a certeza de que ele tinha ido embora.
Retornou a cozinha com um singular sorriso no rosto e com uma serenidade impossível de descrever-se e pode assistir ao jovem Pastor acabar o seu café, comendo todos os pães, bolos e doces e com um sorriso dizer-lhe: muito obrigado dona Helena.
A minha sogra nas diversas vezes em que me contou esta história, o fazia dando a graça a Deus pela tragédia que ela conseguiu evitar, mesmo tendo causado surpresa e perplexidade ao jovem Pastor.
Passaram-se os anos e eu vim a conhecer o Pastor- hoje já adiantado nos anos- mas que ao me relatar os fatos-entre uma risada e outra- atestou a veracidade dos mesmos e me fez uma confissão:
- Seu Erner eu só posso atribuir aquele café, daquela maneira imposto a mim, como um Milagre de Deus pois eu não tinha almoçado e nem jantado no dia anterior e, naquela manhã, eu não tinha tomado café.
(Recanto da Ana e do Erner 29.10.24- Capão Novo)