Calado (raramente) vence.

Calado nem sempre vence.

Na maioria das vezes, o calado perde - e perde muito.

Esse dito popular - “calado vence” - se popularizou nas redes sociais há alguns meses e, passada a trend, ressurgiu em minha mente durante uma gloriosa caminhada na frente da praça onde fica o fórum. Gloriosa porque, naquele momento, eu havia acabado de ganhar a minha primeira causa…

Não foi uma causa jurídica, na verdade - apesar desta humilde narradora já ser graduada em Direito e ter sido aprovada no Exame de Ordem (mesmo que jamais tenha dado entrada no registro) e cumprir os demais requisitos necessários à possibilidade de obter um bom ganho de causa. Estava perto do fórum por uma momentânea coincidência - saí do Ministério Público para atender a uma ligação do meu plano de saúde.

Dias antes, fui vítima de um mal, infelizmente, cotidiano na rotina dos brasileiros: atendimento médico negligente. Normalmente, como em (quase) todas as situações da vida, eu deixaria passar, arcaria com os prejuízos e evitaria todo o trabalho que exige uma boa briga - na verdade, minha escolha de carreira é um antigo paradoxo com a minha personalidade. Não costumo reivindicar nada, por mais que tenha direito. Não gosto de apontar dedos, exigir prestações e tenho pavor de dizer que algo “está errado” - a ideia de vencer calada sempre foi o meu guia… Minha desculpa, sendo honesta.

Ironicamente (ou não), escolhi fazer Direito. Talvez fosse um grito do meu subconsciente - ou talvez a sorte de adolescente, que me guiou a um caminho capaz de me desafiar até o último fio de cabelo. Fato é que minha personalidade de traços fleumáticos precisou ceder diante da dureza da realidade: pouquíssimas pessoas são realmente capazes de vencer caladas.

No início, aprendi com mulheres que atendi que às vezes a salvação da lavoura depende de um grito de socorro que surge após anos de silêncio esperando que o agressor mude de atitude, que tenha alguma espécie de misericórdia ou que a justiça se faça sozinha. Depois, continuei aprendendo com outros tipos de vítimas do silêncio que ele pode custar muito, muito caro. Descobri que sabia muito bem emprestar minha voz aos outros… mas e eu?

Recentemente, cheguei a uma estação da vida em que percebo que preciso também usar a minha voz por mim - sempre detestei gente “chata” e “insistente” e senti o estômago embrulhar diante de pessoas “combativas” (eufemismo para aquele tipo de gente insuportável que torna tudo um grande conflito sempre que é ofendido). Perceber que aquele “tônus” que os combativos tem acesso me fazia falta doeu primeiro no meu ego. Me achava superior por nunca “brigar” por nada - mas na verdade, era só uma questão de preguiça, medo e comodidade.

Comecei a treinar esse ano. Ninguém começa no futebol jogando na série A. Dito isso, diante desta última intempérie da vida - um tratamento péssimo em um Hospital, diga-se de passagem, particular - obtive a minha primeira vitória: o justo estorno do valor gasto. Me custou apenas uma reclamação bem registrada, bons e-mails e o esforço do argumento. A questão é que, ineditamente, não aceitei o prejuízo e consegui ao menos uma compensação. Uma grande pequena vitória.

Continuo tendo horror de quem arranja confusão por tudo e de quem não consegue ser razoável - mas não é mais a hora de tolerar falta de educação, serviço mau prestado, negligência e outras intempéries do dia a dia. Sabedoria é saber escolher batalhas - não se eximir delas a todo tempo e a todo custo.

O silêncio ainda é um dos meus melhores amigos - mas nunca mais poderá voltar a ser meu esconderijo. Se você é capaz de sentir o impacto dessa percepção, caro leitor, este relato foi escrito terça-feira, 18:28h, para você. Se não for o caso, cuidado com o excesso de palavras - papagaio também perde, e perde muito.