CORDÉIS DA GRÁFICA BOM JESUS - JOÃO PESSOA-PB.
A BARATA JOSEFINA E A FORMIGA DONA ENCRENCA NO CONCURSO DE DANÇA
Você que tem em mãos
Este singelo cordel
Deixe de fazer tudo
Se for pintor, o pincel
Esqueça por um instante
Se for doutor, o anel.
É que esta história
Aconteceu no meu quintal
Uma formiga muito gulosa
Quase que se dá mal
Enfrentou uma barata
No dia de carnaval.
Era terça-feira o dia
Bem me lembro a data
A formiga Josefina
Metida a autodidata
Achando que a barata
Era filha de vira lata.
Pois neste dia, veja
E preste bem atenção
Josefina chamou pra dança
A comadre Louvação
Nome desta barata
Desde a sua criação.
A comadre ficou zangada
Pelo convite da Formiga
Considerada por muita gente
Uma fiel e grande amiga
E assim eis a questão
E como se deu esta briga.
A Formiga Dona Encrenca
Gostava de um forró
Já a Dona Josefina
Se achava a melhor
No ritmo da lambada
Só saía ao pôr do sol.
A Comadre Josefina
Na lambada foi campeã
No concurso à beira mar
Uma medalha cidadã
Disputada com muita honra
Na Praia de Jacumã.
Já a Dona Encrenca
Queria muito desafio
Enfrentar esta Barata
Na beira de um rio
Deixar a pobre coitada
Morrendo de frio.
O acordo foi firmado
E chamaram até jurados
Uma comissão capacitada
Todos eles condecorados
Em vários festivais
Que foram apresentados.
O sapo todo todo alegre
Ficou sendo o presidente
Gostava de tudo certo
Porque era competente
Anotava o compasso
Daquele corpo presente.
O caramujo teve o cargo
Ele foi o secretário
Não gostava de frescura
Que era coisa de otário
Fez questão de ser chamado
Pelo seu nome de Mário.
O terceiro componente
A rã foi convidada
Aceitou de primeira
Aquela bela empreitada
Ver a barata e a formiga
Numa dança arretada.
A composição estava feita
E veio logo a reunião
De um lado as dançarinas
Do outro a comissão
Cada ritmo tinha nota
Teve início o baião.
A barata era danada
E dançou com Seu Barato
O casal recebeu dez
E foi tirado um retrato
Que serviu de imagem
Num singelo prato.
A Formiga com a Formiga
Foi este o casal
O marido de Josefina
No dia passou foi mal
Preferiu não levar nota
Foi curtir o carnaval.
Donca Encrenca levou sete
Com aquela coreografia
Puxou foi a orelha
Daquela sua companhia
Ficou foi amuada
E adeus sua alegria.
A formiga que dançava
No baião não aproveitou
Os passos da Josefina
Ela toda se estrepou
Morta de vergonha a dupla
No cantinho ali ficou.
A nova dança seria
No ritmo do carimbó
Ligeiro a Dona Encrenca
Que levou logo a melhor
A Barata Josefina
Entrou foi na pior.
O danado do Barato
À Barata não acompanhou
Ficou ali perdido
Muito errado se mostrou
A Comissão deu sete
E a Formiga esta ganhou.
Estava dando empate
Gritava o Caramujo
E o Barato todo inquieto
Porque estava sujo
E a rã toda sapeca
Defendia o dito cujo.
Mário chamou o Sapo
Pra resolver a situação
O Barato quis ir embora
Seria uma perdição
Ganharia a Formiga
Naquela ocasião.
O Sapo presidente
Pediu silêncio aos insetos
Dizendo que todos eles
Não estavam agindo certo
Que parassem com a zoada
Pra tudo correr correto.
A terceira e última etapa
Era mesmo a lambada
Josefina ficou esperta
E ganhou de disparada
A coitada da Formiga
Disse que era marmelada.
Na lambada a Barata
Era mesmo uma sensação
Ganhou todo concurso
Que era a sua paixão
A Formiga Dona Encrenca
Disse bem alto um palavrão.
O sapo bateu na pedra
E chamou a segurança
Sob o comando do besouro
Que fiscalizava uma festança
A Formiga ao perceber
Logo, logo ficou mansa.
A rã pegou a faixa
E na Barata foi botar
O Sapo todo falante
Pouca coisa quis falar
Mário, o Caramujo
Só fez mesmo cochilar.
A Formiga Dona Encrenca
Mesmo com raiva agradeceu
Agarrou Dona Barata
E um grande beijo lhe deu
Quis propor um desafio
Que mais tarde aconteceu.
O Sapo presidente
Foi depressa tomar banho
Mergulhou numa água suja
E quase morre num rebanho
De bode que vinha vindo
Passando ali muito medonho.
A Rã quis conquistar
O Barato dançarino
Que agora estava limpo
E seguia o seu destino
Casado com a Barata
Desde o tempo de menino.
A Rã ficou tristonha
E na água mergulhou
Deu em cima do Sapo
Que muito bem lhe tratou
Foi muito xodó na água
Que todo inseto notou.
O Caramujo chamado Mário
Foi procurar uma parede
Estava muito com frio
E encontrou foi uma rede
Deitou dentro dela
E matou a sua sede.
A Barata e a Formiga
Um desafio novo vai chegar
Mas antes que ele chegue
Deixe o cordel terminar
A história destes insetos
Que têm vida para dançar.
FIM
João Pessoa-PB, 02 de março de 2019.
QUÊNIA NO CANGAÇO
Havia há muito tempo
No sertão paraibano
Uma mulher tão forte
Que enfrentou o desengano
Era Quênia o nome dela
Filha de um pernambucano.
Morava em Conceição
E trabalhava no roçado
Nunca teve coisa com homem
Chamava tudo de abestado
Foi assim que Dona Quênia
Viveu assim o seu passado.
O seu pai pernambucano
Lhe deu boa educação
Mandou cedo pra escola
Com toda satisfação
Sabia ler e contar
Isto só foi a lição.
Na escola onde estudava
Uma aula nunca perdeu
Tirava tão boas notas
Sempre dez ela mereceu
O valor daquela aluna
A professora reconheceu.
Era uma boa aluna
Da Escola Municipal
Com o título de campeã
Se botou o Juvenal
Um aluno muito chato
Que veio então se dá mal.
Quênia lhe deu uma tapa
Que a sala quase cai
Recebeu advertência
Foi chamado o seu pai
Ficou dois dias em casa
E depois pra escola vai.
O aluno Juvenal
Era mesmo o capeta
Quando Quênia voltou
Ele trouxe uma marreta
E gritava feito louco:
- Você é uma caceta!
Este aluno recebeu
Uma grande suspensão
Ficou uma semana
Dentro daquele casarão
O cabra era o filho
Mais novo de Sebastião.
Sebastião era o dono
Das terras daquele povo
Chamou o pai de Quênia
E deu ordens de novo
Que se ele brincasse
Melaria ele de ovo.
O velho pernambucano
Ficou só escutando
Disse então para a filha
Que ela estava lhe matando
Criando muita encrenca
E ele se acabando.
Quênia ouvindo aquilo
Ao pai pediu perdão
Disse com todas as letras
Que seguiria a lição
Que Juvenal não se metesse
Em mais uma confusão.
O menino Juvenal
Voltou para estudar
Desta feita não zombou
E foi direto ao beabá
Atrasado na cartilha
Tinha que se adiantar.
Quênia já tinha nota
Era certa a aprovação
Mas estudava muito
Mesmo sem precisão
No recreio da escola
Deram nela um empurrão.
No meio daquela gente
Foi difícil perceber
Três meninos de outra turma
Quis então lhe bater
Ela partiu pra briga
E quase veio morrer.
Quando ela deu uma tapa
Recebeu uma de volta
O sangue logo saiu
E correram pela porta
A Quênia toda doída
Parecia que estava morta.
A diretora escolar
Pediu assim ao inspetor:
Vá buscar o aluno
Que tudo começou
Prepare uma suspensão
Que hoje mesmo eu dou.
A sala da direção
Ficou bastante lotada
O aluno da outra turma
Tinha o apelido de Lapada
Era magro que só vendo
O jeito do camarada.
Ele disse sem medo
Que ele não era Juvenal
Que se Quênia se metesse
Ia com ele se dá mal
Porque ele era na escola
Quem mandava coisa e tal.
A diretora não gostou
Daquilo que estava ouvindo
Da boca de um moleque
Que estava se assumindo
Mandou chamar seu pai
E este ficou sorrindo.
Neste instante a Quênia
Olhou meio desconfiada
Pediu até desculpa
Ao dito cujo Lapada
Mas este não ouviu
Como se não fosse nada.
Lapada era um menino
Que no olho não encarava
Só falava olhando pra baixo
E pra ninguém ele olhava
Quando era do interesse
Ele de longe espiava.
Todo mundo ali dizia
Que parecia um cangaceiro
Só faltava botar a roupa
E ter o título de bandoleiro
Mas não foi seu destino
Deste cabra desordeiro.
Chegou o final do ano
E Quênia toda feliz
Ia pra outra turma
Que sempre ela quis
Foi gozar as suas férias
Na cidade de São Luiz.
O pai todo contente
Este presentou lhe ofertou
Uma viagem ao Maranhão
Conhecer o seu avô
Que ao receber a neta
Muito surpreso ficou.
A avó tinha morrido
Há dois anos atrás
Da doença tuberculose
Que matou gente demais
E Quênia em São Luiz
Só queria era a paz.
Um rapaz desta cidade
Ficou logo lhe paquerando
Ela deu um belo sorriso
E foi ali se chegando
Quando o avô foi na sala
O casal estava se atracando.
Quênia ficou morta
Com aquela situação
Pediu desculpa ao avô
E queria a permissão
Pra namorar com o rapaz
Que estava se beijando.
As férias terminaram
E Quênia depressa voltou
Queria encontrar o pai
Mas veja só o que encontrou
A roça pegando fogo
E o pai nela entrou.
Foi o capanga que teve
Do dono a permissão
Estas terras pertenciam
Ao Coronel Sebastião
O pai do Juvenal
Que gostava de confusão.
Quênia sabendo disso
A cabeça logo ferveu
O sangue subiu ligeiro
Quando o pai dela morreu
Incendiado na roça
O mundo pra ela escureceu.
O Coronel Sebastião
Que era um ricaço
Disse para a menina
Que deixasse aquele espaço
Foi aí que Quênia entrou
Tão depressa no cangaço.
A primeira providência foi
Naquele primeiro inverno
Mandar aquele coronel
Diretamente pro inferno
Montado em seu cavalo
Com seu valoroso terno.
FIM
João Pessoa-PB, 03 de março de 2019.
ALMA DESENCONTRADA
Quero iniciar este cordel
Falando de intimidade
Buscando fundo na alma
Toda a minha verdade
Se por acaso eu falhar
Perdoa essa crueldade.
Nos pecados da vida
Não há quem botasse
Na fogueira mais lenha
E nem quem tirasse
Da lenha a fogueira
De quem me amasse.
E assim nesta vida
Por que me roubasse
As joias que eu tinha
Sem que me comprasse
Devolva tudo meu bem
E as joias me passe.
Eu sei que os pecados
Em mim tu jogasse
E nunca soubesse
Se um dia me amasse
Que amor foi este
Que quase me matasse.
Fostes amiga no tempo
E com o tempo fracassasse
Com as coisas que eu tenho
E comigo somente errasse
Nunca mais eu te quero
Meu segredo contasse.
Minha solidão é algo estranho
Que sempre poupasse
Me fizestes aventura
E de nada, portanto, livrasse
Me desse um tempo
E depois outro pegasse.
Meu mundo é mundo
Que nunca me ensinasse
E se alegro com pouco
Nada me entregasse
Eu vivo cortado sorrindo
Porque assim me deixasse.
Muitas vezes na vida
Comida me pagasse
E se fome eu tinha
Foi quando comigo errasse
Com os segredos contados
E todos da memória apagasse.
Meus olhos tristonhos
De ódio me cegasse
Se enxergo com a pele
Meu corpo inundasse
De águas barrentas
Quase me matasse.
Na lida desta vida
Só me maltratasse
Com beijos ardentes
E depois o corpo tirasse
Fostes para bem longe
Bem distante viajasse.
E agora sozinho eu canto
E penso quando botasse
Um compromisso no dedo
E depois se livrasse
Com palavras sem lógica
E depois publicasse.
Viro em muitos para criar
E penso porque fracassasse
Não há resposta lógica
Nenhuma há que lucrasse
Só perdas e danos
Um jogo perdido jogasse.
Antes que eu me esqueça
E se, porém, me atrasasse
Era problema na certa
E não tinha quem arrancasse
Um pedaço de espera
Quem uma vala comigo dançasse.
Era preciso que ela
Não me maltratasse
E se algum dia qualquer
Eu por descuido errasse
Não era este o caminho
Tudo assim acabasse.
A tristeza dói em chama
E se o fogo alguém apagasse
Não haveria prantos em nós
E se eu a ti conquistasse
Deixaria apenas um sofrendo
Era preciso que tudo se acabasse.
Quando da tua vida
Distante me afastasse
Saí pelos caminhos errantes
Antes que meu olhar chorasse
Percorri labirintos de espinhos
Sem que ninguém me acompanhasse.
O ônibus foi saindo de mansinho
E antes que eu enfrentasse
Turbilhões de vícios na estação
E ainda bem que me livrasse
De todos aqueles ônibus
Que um dia sentasse.
Um bilhete de despedida
Do meu bolso arrancasse
E apenas um pequeno pendriv
Sem valor nenhum deixasse
E eu sendo ouvinte de tudo
Falei para retirar-se.
Ela não dando ouvido
Não tinha diabo que pegasse
Uma carreira tão grande
E pés e mãos tu juntasse
Unicamente pensando
Se minha vida infernizasse.
Nada se torna inferno
E pensei se cantasse
Modificaria o ambiente
E sei que também pensasse
Não como eu pensei
Mas na prova zerasse.
Não me amas hoje
E nunca me amasse
Sei das tuas tentações
Até que tentasse
Ser fiel ao instinto
Mas antes mesmo largasse.
Sei que pensas em mim
Desde que aqui entrasse
E eu aqui sofrendo tanto
Por tudo que pecasse
Caminhando por outras vias
A mim calada chegasse.
Já apelei por todo santo
E nenhum que me ajudasse
Sei que tens contigo amor
E no meu amor enfim parasse
As marcas de antigamente
Em mim tu fincasse.
Nos pecados que eu tenho
Tu sorrindo chorasse
Joguei pela janela alguns
Sem que nenhum ficasse
Não sei disso a razão
Se comigo cansasse.
Já cantei serenata chorando
E não tive quem reparasse
Amei muitas e fiquei bobão
E apenas ódio me passasse
Fui ao pai prestar queixa
Porque minha pessoa deixasse.
O inferno mora ao lado
Onde sempre relaxasse
Sei que a espera é longa
Mas por que não me amasse?
Se entendes o mundo
Nenhum só pra mim achasse.
A alma está em prantos
É como se a matasse
De tristeza e solidão
Porque quando me procurasse
Eu estava em caos
E aí só me rebaixasse.
Nunca me entendesse
Nem quando me pegasse
Eu tristonho de medo
E simplesmente me calasse
Calado fiquei ali no canto
Meu sonho inteiro rasgasse.
Quando se está sofrendo
Queremos apenas um passe
A cabeça gira de tédio
Porque tudo misturasse
Ela fica descontrolada
E foi isso que jurasse.
Meu coração tão fraco
Sei que realmente roubasse
Não quisestes competir
E de mim se livrasse
Como pássaro desgarrado
Não achei quem me encontrasse.
A lua que tanto amo
Consigo ela levasse
Fiquei perambulando no tempo
E nem isso de mim poupasse
Hoje amarguro na estrada
Sem pneu porque furasse.
Quero findar este cordel
Com uma enorme saudade
Somos muitos entre tantos
Onde canta a liberdade
Guarde consigo no âmago
Sua mais pura sinceridade.
FIM
João Pessoa-PB, 02 de agosto de 2000.
LOROTAS DE BIU
Passo a contar a história
De um tal Biu Mentiroso
O seu nome verdadeiro
Severino da Silva Veloso
Nascido lá pras bandas
De São Miguel do Gostoso.
Severino filho único
De Manuel Veloso de Alencar
Pescador cheio de honra
E de muita lorota pra contar
Foi aí que o filho Biu
Tornou-se assim tão popular.
A mãe de Biu era Joana
Que vivia de aluguel
Naquele tempo não havia
Pousada em São Miguel
Ela possuía três
Herança do pai coronel.
Joana e Manuel era um casal
Que educou bem Severino
E com esta educação
Ele deu pra bom menino
Só depois é que chegou
A triste sina do destino.
Até os doze anos
Severino foi estudante
Depois desta idade
Preferiu coisa errante
Mentia que dava dó
Com sua voz elegante.
Numa pesca final de tarde
O pai de Biu morreu
A maré quebrou o barco
E ninguém ali viveu
E no velório do pai
Veja o que aconteceu.
Biu foi se comunicando
Logo depois da triste ceia
Que o pai disse pra ele
Que ia morar com a sereia
A mãe sabendo disso
Lhe aplicou uma grande peia.
Na missa de sétimo dia
Biu de novo aprontou
O padre daquela igreja
Quase que acreditou
Que o mar não tinha fim
E o pai no fim chegou.
Trinta dias se passaram
E chegou a missa de novo
Biu contava mentira
Pra o silêncio do povo
Trinta dias de morte
Biu dizia: é como ovo.
A mãe ali cabisbaixa
Deu em Biu um cascudo
E ele mentindo dizia:
- Eu sou muito sortudo
Meu pai tinha riqueza
E eu vou ficar com tudo.
Levou um puxão de orelha
Que quase se arrebenta
Aquela mãe mesmo triste
Quase lhe arranca a venta
E depois Biu corria
Pra perto de Maria Benta.
Só a mãe e o filho
Naquela casa de pensão
Olhando de noite o mar
Entristecia o coração
E Biu já tinha planos
De sair na contra mão.
- Oh, Severino, vem cá
Cuide daquele aluguel
Era a sua mãe pedindo
- E me traga aquele anel
Era uma lembrança que ela
Trazia do velho pai coronel.
O menino Severino
Começou a ser chamado de Biu
Com treze anos apenas
Já era o maior do Brasil
Em negócio de mentira
Biu nunca escapuliu.
O aluguel de cada casa
A mãe de Biu não via a cor
Quem pagava ao menino
Não sabia do valor
No final era uma agonia
E Biu pra longe se mudou.
A mãe de Biu sofria tanto
Em São Miguel do Gostoso
Porque o povo dizia:
- Olha a mãe do seboso!
Aquele não vale nada
O tal de Biu Mentiroso.
Qual é a mãe que gosta
De um filho desta maneira?
Não há nenhuma no mundo
E nem de brincadeira
Joana soube que Biu
Quebrou a perna numa ladeira.
Só que esta história
De perna de Biu quebrada
É tudo pura lorota
Porque o certo é uma pedrada
Que Biu recebeu nas costas
E deixou a unha lascada.
Biu começou a trabalhar
E foi logo terra vender
A propriedade alheia
Que ninguém foi conhecer
Foi também no pacote
E Biu não quis nem saber.
Biu não fazia nada
Da lorota era profissional
De tarde na beira do campo
Ele se sentia como tal
Contava cada uma
Isso já era mais que normal.
Enquanto isto em São Miguel
A mãe de Biu vivia sofrendo
Perguntava a todo mundo
Onde Biu estava vivendo
Ninguém sabia direito
O que estava acontecendo.
É que Biu deixou a Dona Joana
Sem nenhum tostão no bolso
E esta estava sem nada
Queria até se jogar no poço
E um belo dia a sua mãe
Cortou todinho o pescoço.
Ninguém da redondeza
Sabia dizer o paradeiro
Daquele cabra mentiroso
Que se tornou forasteiro
E a mãe sem nada saber
Ia vivendo sem dinheiro.
Entrava e saía noite
E Biu não tomava jeito
Perguntado o que ele era
Disse ser formado em direito
Que era um advogado
E queria muito respeito.
O povo daquela cidade
Em Biu acreditava
Toda confiança a ele
Aquela gente dava
Só queria saber da origem
E onde a família morava.
Biu disse que o pai era médico
E sua mãe uma empresária
Que era dona de uma cidade
E sua irmã universitária
E o seu tio foi inventor
Das torres lá de Bavária.
Com a fama de doutor
E o poder de mentiroso
Biu conquistou a todos
Como prato saboroso
E disse que tinha ódio
De povo que era orgulhoso.
Biu criou uma carta
E ele mesmo recebeu
Dizendo que tinha ganho
Uma causa de um ateu
Só porque cuspiu na cruz
Por causa do nome deus.
O povo caiu direitinho
Naquele ato de Biu
Todo mundo ali devoto
Como parte deste Brasil
Às vezes hipócrita
Com a fé que já sumiu.
Dizia Biu quando pequeno
Um dia foi anestesiado
Acordou feito um preá
Depois de ter sonhado
Que o mundo era preto
E um ponto deixou marcado.
São Miguel do Gostoso
Não queria prosperar
Precisava de solução
Para não se acabar
Porque a chuva era grande
E o mar ia se alastrar.
Sabendo desta história
A deixa Biu aproveitou
Com a presença do povo
Ele por si silenciou
A cabeça olhava de lado
E nada, nada ele contou.
Sem nada entender
O povo viu Biu tristonho
Queria saber mais história
Que ele falasse do sonho
E quem mais insistia
Era um velho por nome Totonho.
Manuel Veloso pai de Biu
Que foi grande pescador
Tinha fama de grande
E Biu nunca contou
De Pai pra Filho
Isto bem que colou.
Era a quinta série
Quando Biu parou o estudo
E numa roda de conversa
Disse ter curado até mudo
E que quando nasceu
Foi chamado de surdo.
Era mentira com mentira
E ninguém a ficha caía
Até o Velho Totonho
Que veio lá da Bahia
Chamava o mentiroso
De sagrado filho de Maria.
Estando para morrer
E sem ter o filho por perto
Gritava a mãe de Biu
Naquele lugar deserto
E ninguém dava notícia
Talvez com medo, por certo.
Biu sabendo disso
Voltou depressa à origem
Chegando na cidade
Teve uma grande vertigem
Viu sua mãe na cama
E a chamou de Santa Virgem.
O povo sem entender
Vendo aquele moribundo
Olhou depressa pra Biu
E perguntou de qual mundo
Tu tens esta ideia
De amor tão profundo?
Ele pegou sua mãe
E deu um beijo na testa
A velha se levantou
E acabou-se a aresta
Biu comprou aguardente
E fez uma grande festa.
Isto não é verdade
É o que o mentiroso contou
A mãe de Biu foi-se embora
E à cidade ele nunca voltou
Vive de cidade em cidade
Tendo mentira como favor.
Já foi advogado dos pobres
Médicos dos oprimidos
De tudo Biu foi um pouco
No viver dos desconhecidos
Por onde anda é saudado
Alegrando os entristecidos.
Existe um grande laço
Entre a mentira e o enrolão
E assim Biu foi vivendo
Contando a mais de milhão
A sua saga pelo mundo
Onde não tinha comunicação.
Biu se comunicava
Com seu jeito elegante
Nunca quis casar
E nem tampouco ser amante
O negócio dele era mesmo
Mentir e ser falante.
E aqui chego ao final
Desta modesta ficção
Que trouxe Biu pra gente
No caminho da ilusão
Mentir causa problema
E este não é a solução.
FIM
João Pessoa-PB, 09 de janeiro de 2019.
MADAME BENEDITA
Abra o olho meu leitor
Que agora vou falar
Através deste cordel
Tenho muito pra contar
Ela foi a grande mestra
No Terreiro de Sinhá.
Todo sábado se ouvia
No terreiro a batucada
Era tanta mãe de santo
Com a sua umbigada
Tinha tanto pai de santo
Me lembro de trovoada.
Trovoada era um cachorro
E era muito respeitado
O resto daquela festa
Era por ele apreciado
Só não gostava de fogos
O bicho ficava aperreado.
Quando chegava a sexta-feira
Havia logo a preparação
Era chegado o sábado
No terreiro da animação
Tinha menino com força
Que acabava em confusão.
Joãozinho de Seu Inácio
Um dia se manifestou
Recebeu o Zé Pilintra
E a festa ele acabou
Bebeu que só a gota
Foi ele mesmo que contou.
Quando ele chegou em casa
Ficou ali desconfiado
Dona Júlia mãe do bicho
Meteu o braço no safado
Gritou por todos os santos
Aproximou-se um soldado.
Pediu por gentileza
Que não batesse no menino
Que ele era tão bom
E teria um bom destino
Mas a mãe desesperada
Deu de garra de um sino.
Queria com este sino
Acabar com o Joãozinho
O soldado disse que não
E saiu foi de mansinho
Em briga de família
Não se mete o colarinho.
A vizinha chorava tanto
Por todo aquele acontecimento
Chamava Dona Maria
Casada com o velho Bento
Que lhe dava conselhos
Pra livrar do sofrimento.
Seu Inácio quando soube
Foi direto no terreiro
Encontrou com Benedita
E o marido xangozeiro
Se chamava pai Toinho
Vindo lá de Oitizeiro.
Neste dia aquele lugar
Ninguém no terreiro dançou
Seu Inácio era valente
E à crença espraguejou
Dona Maria de Bento
Quis saber o que passou.
Tinha uma mãe de santo
Que se chamava Zefinha
Lia a mão dos meninos
E gostava de ladainha
Dizia que o Joãozinho
Tinha roubado a galinha.
Aí o Seu Inácio fez
O que o povo ali queria
Dá-lhe tanto em Joãozinho
Pra deixar de putaria
Chorava a mãe de um lado
Junto de Dona Maria.
Dona Júlia era católica
E Seu Inácio era ateu
O casal de aparência
Tudo em nome de Deus
Só não queria filho ladrão
Morando ao lado seu.
No dia seguinte foi
Realizada uma festança
De um lado os velhos
Do outro era pra criança
O batuque começava
E no salão tome dança.
Tinha bolo e refrigerante
Feijão e carne assada
A oferenda foi feita
Numa enorme encruzilhada
Falavam em Maria Padilha
A rainha da batucada.
O terreiro foi enfeitado
Em Joãozinho ninguém falou
A galinha que ele escondeu
Naquele dia o povo achou
Com Dona Júlia foram falar
Mas ela não se encontrou.
Benedita era a dona
Do Terreiro de Sinhá
Devota de Santa Bárbara
Mãe de santo do lugar
O marido um pai de santo
Que gostava de aconselhar.
No dia dos gêmeos
De São Cosme e Damião
A criançada fazia festa
Pra comer aquele sopão
Tinha tanta brincadeira
Era grande animação.
A polícia um dia chegou
E quis o lugar fechar
Benedita mostrou a ordem
Que fazia funcionar
A polícia foi simbora
E nunca mais quis reclamar.
Benedita mãe de santo
Discriminada no lugar
Por causa do seu xangô
Muita gente ia falar
Seu marido Zeca Bahia
Gostava mesmo de aprontar.
Certa feita no terreiro
Quando o santo recebeu
Partiu pra cima de Joana
Pedindo um beijo seu
Benedita ouvindo isto
Aquele santo não conheceu.
Todo sábado era festa
Na umbanda de Benedita
O terreiro enfeitado
E veja só a escrita
Apareceu Joãozinho
Querendo dançar na pista.
Zeca Bahia não disse nada
E mandou Joãozinho entrar
Deu-lhe uma roupa branca
E fez o bicho ali dançar
Rodava como um pião
Querendo sempre rebolar.
Pintou a cara toda
Dizendo ter o poder
De receber um santo forte
Botar gente pra correr
Aí o Zeca Bahia
Mandou ele se conhecer.
A festa estava animada
Mãe de santo de montão
Joãozinho todo alegre
Quando ouviu um palavrão
Seu Inácio bem na porta
Estava feita a confusão.
O velho estava triste
Com aquele filho querido
Que se meteu em xangô
Esquecendo o prometido
De não acreditar em santo
E muito menos ser pervertido.
Chamou aquele filho
E foi tentar aconselhar
Joãozinho já incorporado
Mandou tudo se lascar
Seu Inácio tinha vergonha
Mas queria ele levar.
Só que aquele filho queria
Exercer esta dita religião
Não deixaria pai e mãe
Nem viveria na perdição
Pediu apoio a todos
E teve a sua aprovação.
Madame Benedita foi
A curandeira da cidade
O povo que lá chegava
Era da grande sociedade
Mas a Madame Benedita
Não tinha tanta prosperidade.
Acolheu Joãozinho de Inácio
No Terreiro de Sinhá
A Madame Benedita
Quis do marido se separar
Ficou de olho no menino
Que tinha tanto amor pra dar.
Já o tal de Zeca Bahia
Não aceitou a separação
Foi falar com o Joãozinho
E teve uma grande decepção
Ouviu da boca dele
Que era tudo de coração.
Inácio quando soube
Foi com Joana falar
Não queria mais o filho
E queria também se separar
A vergonha era tamanha
E não quis mais conversar.
Zeca Bahia partiu pra cima
Da coitada da Joana
Abandonada pelo marido
Ficou mesmo na lama
O safado do pai de santo
Levou ela para a cama.
No Terreiro de Sinhá
Mãe e filho lá morando
Zeca Bahia com a mãe
E o diabo se soltando
Joana era uma crente
E foi logo se juntando.
Se juntou com aquela gente
E chorava por Seu Inácio
Num terreiro de umbanda
Se lembrava do palácio
Prometido pelo crente
O pastor Zé Bonifácio.
Seu Inácio já morava
Ao lado doutra mulher
Dizia que era ateu
E não queria falar de fé
Quando alguém lhe perguntava
Ele logo queria um café.
A Madame Benedita
De Joãozinho engravidou
Zeca Bahia tinha ciúme
De ser padrinho ele topou
Joana foi ficando louca
E nunca mais ela falou.
O Terreiro de Sinhá
Tinha uma família só
Zeca Bahia e Joãozinho
Desataram este nó
Ficaram sendo o homem
Desde o nascer do sol.
A Madame Benedita
Uma noite de prazer
Ofertada a cada um
E foi assim este o viver
A Joana calada no canto
E haja filho pra nascer.
Seu Inácio ficou viúvo
E Joana ele veio buscar
Terminou seus últimos anos
Desta mulher sempre a cuidar
Zeca Bahia morreu de enfarto
Dançando no Terreiro de Sinhá.
Vinte filhos foi a marca
Registrada em cartório
Joãozinho e Benedita
Só se ouve o falatório
Os filhos vão visitar
Os dois no sanatório.
E aqui vou terminando
Minha nobre Benedita
Mãe de santo de firmeza
Que ninguém mais acredita
Descobri esta história
Com Seu João de Expedita.
FIM
João Pessoa-PB, 20 de março de 2009.
O CORREDOR
Não sei mais o que conto
Não sei mais explicar
Se explico por explicar
Não sei mais marcar o ponto
Se o ponto é aqui ou acolá
De zoada fico tonto.
Conheci um homem veloz
Veloz da gota serena
Tinha uma canela pequena
E rogai por todos nós
O bicho vivia com Helena
E nada de ficar a sós.
Helena era fiel
Até um certo momento
Quando se deu no sofrimento
Deu de garra do seu chapéu
E deixou Joaquim Bento
E foi morar noutro quartel.
Joaquim grande corredor
De corridas populares
Até jangada nos mares
Joaquim era o vencedor
Mas Helena estava nos ares
Buscava um novo amor.
A situação logo complicou
Quando Joaquim sabendo
Que a ex tava metendo
Chifre naquele senhor
Foi fogo, só vendo
A história como se passou.
Helena era novinha
Cheirava a leite de vaca
Não valia uma pataca
E a pobre coitadinha
Foi pro olho da faca
Seria matada como galinha.
É que o Senhor Joaquim
Ganhador de várias corridas
Não aguentando as feridas
Sofreu uma coisa ruim
Quis se vingar da atrevida
Que era devota de Caim.
Pedro Manuel de Oliveira
Catador de lixo da cidade
Ganhou de Helena liberdade
E se vendo galanteador de primeira
Não se importava com a sociedade
E queria na moça dar uma rasteira.
Debaixo da ponte foram morar
E Joaquim fez um grande plano
Eles não passavam daquele ano
Queria as tripas dos dois tirar
E se lascar no desengano
Fazia isso pra atanazar.
Pedro do Frete Social
Como era mais conhecido
Desconfiou do prometido
E vendo na frente o mal
Pensou como ficar protegido
Daquele fato oficial.
Joaquim com Helena
Não constituiu rebento
Disse que o cara era nojento
E todo mundo tinha pena
De Helena com aquele sebento
Perna comprida de ema.
Mesmo assim o bicho
Tinha outra fora Helena
E morava no Alto da Madalena
Bairro pobre coberto de lixo
Pescoço grande Seriema
Perto do lugar Carrapicho.
Helena nada gostou
E prometeu vingança
Tanto que queria uma criança
E Joaquim com outra arranjou
E ela perdeu a esperança
E ele logo chifrou.
Melhor seria deixar Joaquim
Ir embora da sua vida
Viver como diz - perdida
Do que viver assim
E foi-se enlouquecida
A filha terceira de Martim.
Joaquim ficou maluco
E quis logo se vingar
Mas vejamos o que vai dar
Joaquim bebendo suco
Pedro somente a namorar
E quase os dois ficando caduco.
Um belo dia de tarde
O corredor saiu à procura
E quase faz uma loucura
Pedro que vendia bondade
Deu em Joaquim naquela altura
E então cometeu-se a maldade.
Joaquim sofria por Helena
E esta dele fazia pouco
O corredor cada dia mais louco
Perdia corrida até pra Juca da pena
Só pensava naquilo dar o troco
E aparecer em Datena.
Helena ficou buchuda
E Joaquim mais infeliz
Assim o povo é que diz
Ele com a pele que não muda
Não morreu por um triz
Salvo na rua por uma surda.
Joaquim deixou de correr
E corria em busca de Helena
Fazia porém, muita pena
Ver Joaquim somente sofrer
Não por acertar a mega sena
Mas por tudo que tinha perder.
O sofrimento era tanto
Que Joaquim não tinha como escapar
Pensou tantas vezes em se matar
Mas pensou bastante e não praticou
Deixou de correr pra ficar
Correndo em busca do seu amor.
Helena era malvada
E não respeitava o pobre de Joaquim
E as coisas iam sempre ruim
O tempo era um eterno sofrer
Como podia a filha de Caim
Fazer tudo aquilo sem perceber.
E assim chego ao final
Deste cordel do corredor
Um bicho que várias corridas ganhou
Mas pagou o que fez de mal
Trair Helena seu verdadeiro amor.
FIM
João Pessoa-PB, 25 de janeiro de 2001.
CORDEL DO INTELECTUAL
Sou feito Abissal e curto
A arte do abstracionismo
Na cadeira de roda eu brinco
Espetáculo de puro exibicionismo
Gesticulo com a arte coreográfica
E desconheço todo o meu aforismo.
Faço o advento de frases perplexas
E contemplo os solstícios da tarde
Mais adiante raios luminosos
Infiltram-se no meu misterioso alarde
E com minha figura retórica
Primo pelo viver em sociedade.
Eu sou assim desconexo
Estranho no mundo em vida
A alteridade que habita em mim
Trilha meu caminhar na partida
Análogo ao anarquismo segue
Agitando a bandeira desconhecida.
E assim nessa sobrevivência artística
Digo amiúde se preciso for
Porque a sombra do meu antagonismo
É poesia no encalço de uma flor
A semente que se prolifera no tempo
Reage diante de todo meu pudor.
Na cena do palco descortinado
A antítese do meu verbo é melancolia
E sendo melancólico o verbo
Desconstruo toda minha nostalgia
Como um antropólogo decadente
Perco o raciocínio dessa fantasia.
Entro na montagem em plena catarse
Porque o espetáculo me aclama
Perduram em mim os insultos infames
Porque o aplauso me proclama
Tenho métodos em cada dramaturgia
Sou a fala daquele que reclama.
Visitei de passagem a Itália
E conheci a terra de Leonardo
Eu vislumbrei o classicismo
E fiz movimento com a estética do passado
O tempo com o pouco que me resta
É livro aberto que tem me contado.
Na Idade Média como clérigo
Dei ordens aos saltimbancos
E contratei os grupos que perambulavam
Em cidades sitiadas e barrancos
Foi se fechando o meu compêndio
Na leitura dos meus cabelos brancos.
Faltava ser doutrinário do comunismo
Com Engels e Marx na União Soviética
Concomitantemente Hegel se viu
Diante de Aristóteles com sua poética
Defendemos juntos o absolutismo
E colhemos o âmago da palavra ética.
No suco marxista do contemporâneo
Meu sentido conotativo lutava
No absurdo de cada época
O escrito filosófico nada espreitava
Miserável signo na pintura de Picasso
Explodia o silêncio de quem ocultava.
A Europa é expansão cultural
E assim adentrei no movimentar do cubismo
Mais adiante deduzi as formas e as normas
No surgir ardente do dadaísmo
Questionei a existência da arte
Nos pergaminhos errôneos do positivismo.
Denotativamente meu sono de poeta
Não quis epistemologicamente descrever
O diagrama diário da dialética
Na troca de palavreado no entardecer
Somos fagulhas no efêmero do tempo
E personas de vida e de morrer.
Essa é a Epopeia do guerreiro
Artista contido e amordaçado
Correntes sanguíneas das obras escritas
Etimologia de cada dizer concordado
A vida se faz vida na arte de muita criação
Como Augusto num sono descontrolado.
Tantos são os movimentos em rotação
Na contramão do próprio conformismo
Tantos são os detrimentos de áureas épocas
Ascendendo ardentemente o expressionismo
O futuro nos espera e nos amordaça
Afasta de mim o pseudo moralismo.
Quem nos amordaça é o Futurismo
Não há hipótese que nos aponte ideais
O humanismo perfaz vírgulas de um texto
Escritos às vezes herméticos nos jornais
Palavras híbridas que calam correntezas
Como o impressionismo da arte dos jograis.
A pintura rupestre é inexcedível
Num estudo tão escasso de pesquisa
No invólucro lacrado da carroça de Téspis
Somos todos Joculatores da Torre de Pizza
E nas encenações das praças públicas
O espectador em si se realiza.
Pediram ao poeta um poema lacônico
E ele na sua inspirada febre
Com limitações latejantes
Inspira-se no contexto da plebe
Tem no látego o que nunca soubera ser
E traça versos na carreira de uma lebre.
Vistas longas e largas perpassam
As esquinas da nebulosidade ótica
Um pulsar na metafísica da paz
Estraçalha qualquer vida caótica
E não é que muito além do tempo
Surge a arte através da robótica.
A Mimeses que vislumbra macabra
O sentido acoplado no ser artista
É mito que contém sabedoria
É lutador de floresta e ativista
Não há como decifrar no homem
O modernismo que o fez realista.
Quase um total de moribundos
Esquartejam fúnebres em saliência
Aqui bebi na fonte do poeta do Eu
Para permitir o estudo da ciência
O zéfiro rodopia na vida e na morte
Sendo plebe ou visto como excelência.
Passando pela pátria francesa
Não há como divergir do naturalismo
Um movimento de envergadura cultural
Que radicaliza por completo o realismo
E aí tanta palavra nova fora criada
Este é o fenômeno do neologismo.
O paradigma de cada etapa
É destorcido e descompromissado
Surge o paradoxo das ações encetadas
E vivencia-se o ato consumado
Mais um ator é posto em cena
Que interpreta e às vezes é censurado.
A arte nos seus movimentos
Perpassam ações e se faz parâmetro
Aproxima-se o caos do concreto
Na latitude no trato do diâmetro
Como uma medição dos tempos gregos
O pé transfigurado no hexâmetro.
No mundo da intelectualidade
É esplendor de teses o parnasianismo
Nele o poeta Augusto fora lembrado
Mas o sentido o torna no modernismo
Na perspectiva das plasmações cênicas
Em polarizações que apontam o subjetivismo.
Quando a humanidade enfim caminhou
Buscou-se nas entrelinhas o porvir
Mais cedo ou mais tarde chegaria
E cada ser passaria a ver e a sentir
Fosse poviléu ou classe privilegiada
O auge pragmático do verbo possuir.
Buscamos uma arte prolifica
E muitas vezes somos o cheiro putrefato
Num labirinto cênico surge o protagonista
Muitas vezes com fôlego apenas num ato
Assim como as descobertas do renascimento
Devastavam mares, terras e mato.
Reverberando sobre as palavras ditas
Não havia profeta no romantismo
Porque a semiótica de toda fala
Foi sucumbida de culto ao silogismo
É um séquito que se configura
No prognóstico do simbolismo.
A religião e a sua importância
No sincretismo ético dos viventes
Uns sonham e veneram o socialismo
Outros das lutas foram sobreviventes
E assim no mundo utópico dos seres
Prevalece o raciocínio dos inteligentes.
No Brasil a Semana de vinte e dois
Modelo de não conformidade de padrões
E diante desta verossimilhança
Os participantes da razão e nas emoções
Vilipendiaram as fases do classicismo
Mostraram ao mundo várias reações.
E assim a história não se finda
E, portanto é ela que conta
Um conto na crônica das escrituras
Um ponto no dedo que aponta
É a história que se permite
Na própria história que se afronta.
F I M
João Pessoa-PB, 20 de julho de 2016.
TRIO TRAIÇÃO
Havia na Espanha antiga
Pietro Mendez Carvalhais
Casado com Mercina Porto
Da família de dois generais
Tinha no corpo a figura
De Lucifer e Satanás.
Contar que desconfiava
De uma tal de Maria Soares
Uma empregada doméstica
Que cuidava dos lares
E gostava de Pietro
Sonhava ir aos altares.
Pois essa desconfiança
Já era quase que certa
Maria Soares casada
Com um boca aberta
Levava chifre o coitado
Da mulher tão esperta.
E assim foi se formando
Esse trio de plena traição
Até Mercina queria
Provar de outra paixão
Foi aí que Pietro
Entrou em depressão.
Maria Soares sabia
Que a bomba ia explodir
Pois não é que Madame Mercina
A chamou para servir
Ser empregada da casa
E a bronca estava por vir.
Pietro Carvalhais ficava louco
E não tinha como impedir
Pois Maria Soares era
A melhor empregada de Madri
Mais o babaca do marido
Algo estava a sentir.
Sentia uma vontade imensa
De não deixar sua mulher
Trabalhar na casa dos Carvalhais
E que essa logo desse no pé
Mas foi tudo em vão
Maria no marido dava olé.
Mercina chamou Maria no canto
E a ela pediu muito conselho
Disse não gostar mais do marido
De fronte a um enorme espelho
Maria ouvia calada a tudo
E pensava naquele fedelho.
Mercina tinha um filho pequeno
E a tudo ficava ouvindo
Maria mostrava o menino
E Mercina continuava insistindo
Falava que estava apaixonada
E dizia que não estava mentindo.
O menino de tão pequeno
Nada podia entender
Pois Mercina estava a fim
De também um amante ter
E a chance era dizer a Maria
Até porque era a dona do poder.
Pietro estava depressivo
E não conseguia mais ter Maria
Pois Mercina a fiscalizava
Durante todo o dia
E assim o trio se encontrava
Em constante agonia.
Num certo dia de tarde
Maria recebeu folga e saiu
Pietro que estava no escritório
Pegou o carro e sumiu
Foi se encontrar com Maria
E o encontro bom evoluiu.
Ao término do encontro
Maria bastante pensativa
Disse a Pietro o que sabia
E este já em via depressiva
Ficou enfurecido Pietro
E pensou numa alternativa.
Maria queria tanto
Que Pietro fosse com ela morar
Mas Pietro era louco pela esposa
Isso não podia continuar
Como era que Mercina
Ia de outro assim gostar.
A cabeça de Pietro pirou
Não sabia qual procedimento
Chegou em casa puto da vida
E cheio de atrevimento
Chamou Mercina e alto gritou
Mas aquele não era o momento.
Na casa estava um sujeito
Que do jardim cuidava
Meio desconfiado ficou
E a mulher sonsa tapiava
E o jardineiro a muito tempo
De Mercina era caso e gostava.
Pietro não teve jeito
E o jardineiro matou
Mercina foi à loucura
E também na ponte se jogou
Foi um triste dia
Que na Espanha se passou.
O marido de Maria Soares
Quando soube do ocorrido
Foi até a residência
Mas não viu nada de sentido
Deixou Pietro e o filho chorando
E Mercina já tinha morrido.
Maria ao saber da história
Foi com Pietro falar
E este ao receber Maria
Pensou em lhe matar
Mas foi Maria que teve a ideia
E um punhal quis empurrar.
Uma luta foi travada
Durante um tempo profundo
Morreram de tanto lutar
Ficaram lá como moribundo
A família já de posse do menino
Não queria isso pro mundo.
Albertini o boca aberta
Marido de Maria cangaeira
Depois do fato acontecido
Morreu de caganeira
Foi muito triste o dia em Madri
Noticiado pela imprensa estrangeira.
Não adianta traição
E algum dia o sonho se vai
O trio se desmoronou
E sofre quem ver e quem trai
O tempo é resultado
Porque um dia a casa cai.
Quem for na Espanha um dia
Vá em Madri no Mercado Municipal
Procure saber dessa história
Com o comerciante Javier Matal
E saiba muito mais
De traição e tema infernal.
Chego ao final agora
De mais um cordel criado
Quem gostou procure entender
E se entendeu fique ligado
O cordel é assim meu amigo
Cada tema fica em nós marcado.
F I M
João Pessoa-PB, 25 de junho de 2017.
OS CABEÇAS DE CUIA
Não há nada que se passe
Que não fique uma história
Este cordel é homenagem
Ao povo de muita glória
Lá das bandas de Teresina
Escutem esta oratória.
Os Cabeça de Cuia
São figuras de primeira
Gostam do banho de mar
Pulam e dão rasteira
O povo do Piauí
Não é de brincadeira.
Os Cabeça de Cuia
Ganhou reconhecimento
Tem Seu João, grande figura
Por favor, dê-me um momento
Aqui quem vos escreve
É este amigo Bento.
Os Cabeça de Cuia
Vão à missa por devoção
A Dona Francisca
Vive de fazer oração
Não perde uma só missa
Não sai da televisão.
Os Cabeça de Cuia
Das terra das capivara
Gostam de comer arroz
E no amor logo se declara
É gente de boa espécie
Um falar que nos ampara.
Os Cabeça de Cuia
Ganharam um aliado
Torcedor do Flamengo
Humberto meu cunhado
É este o cidadão
Um cabra arretado.
Os Cabeça de Cuia
Vendem ovos de galinha
Como bem diz, Júnior
Dá pra ter uma rendinha
E assim sobrevivem
Enchendo a poupancinha.
Os Cabeça de Cuia
Tem Anayde avechada
Com carro zero quilômetro
E ainda vive agoniada
Essa mulher filha de João
É uma felizarda.
Os Cabeça de Cuia
Tem Ângela esquecida
Esquece chave do carro
Mas sempre tá protegida
É pessoa de fino trato
Nossa amiga querida.
Os Cabeça de Cuia
Tem férias no meio do ano
E chegam para curtir
Sentem falta do sicrano
E tudo é recordação
Na cara de cada fulano.
Os Cabeça de Cuia
Tem Ingrid afilhada
Isabela irmã dela
Esse povo é coalhada
Dá saudade na gente
Piauiense de sotaque capixaba.
Os Cabeça de Cuia
Não desprezam uma cachaça
Bebem quando se acordam
E dormem achando graça
Gosto deste povo alegre
Que dispensam uma pirraça.
Os Cabeça de Cuia
Duas mulheres natas
Uma da família de Júnior
Por nome de Renata
A outra se chama Zélia
Que não tem nada de ingrata.
Os Cabeça de Cuia
Tem João Vitor inteligente
Faz poema, que beleza
E recita decentemente
Sua irmã Maria Clara
É uma belezura em forma de gente.
Os Cabeça de Cuia
Tem Carminha enfermeira
Uma moça dedicada
Que nunca foi bagunceira
Toma conta da família
Uma exímia brasileira.
Os Cabeça de Cuia
Quando chegam na Paraíba
Comem arroz com rapadura
Farinha com macaíba
Esse povo quando caem
Dizem que tão cá em riba.
Os Cabeça de Cuia
Mostram o seu pôr do sol
Falam de Pedro II
A Suíça que é melhor
O opala da cidade
É pedra feita de suor.
Os Cabeça de Cuia
Tem Alberto Silva no metrô
A Paraíba oferece
O coração e seu amor
Para este povo do sol
Do suor e do calor.
Os Cabeça de Cuia
São bem vindo à cidade
Andam e não se cansam
Falam da vaidade
De viajar tantos dias
E trazem grande lealdade.
Os Cabeça de Cuia
Chegam com suas aventuras
Visitam pontos turísticos
E vão todos à loucura
É que a Paraíba tem
No seu olhar muita doçura.
Os Cabeça de Cuia
Já são familiares
Tem pensão sem preço
E chegam aos milhares
Viva o povo do Piauí
Na igreja dos altares.
Os Cabeça de Cuia
É gente do Nordeste
Sofrem com a seca
Com a fome e a peste
Mas a alegria é maior
Feito Tieta do Agreste.
Os Cabeça de Cuia
Todo ano vem aqui
Mesmo em chuva
Querem sentir
O calor dessa cidade
O amor por descobrir.
Os Cabeça de Cuia
É lenda do lugar
Nós, os cabeça chata
É lua e tome luar
Viver no Nordeste
É praia, é sol, é mar.
Os Cabeça de Cuia
Falam manso que beleza
Tem firmeza na palavra
Na amizade é uma riqueza
Vamos voltar ao Piauí
Terra de bela grandeza.
Os Cabeça de Cuia
Na Paraíba todo ano
Chegam aqui e querem mais
E fazem um belo plano
Dona Francisca com a reza
Espanta qualquer desengano.
Os Cabeça de Cuia
Fazem conta e contam histórias
Nós aqui somos gratos
Por todas nossas vitórias
Nós e os Cabeça de Cuia
Vivemos de muitas glórias.
Os Cabeça de Cuia
Tem o Wagner Ribeiro
Que canta e encanta
O povo brasileiro
É assim que o Piauí
Tem reisado ligeiro.
Os Cabeça de Cuia
Tem sogra que muito fala
Tem sogro gente boa
Com carro tipo opala
E assim por este mundo
É um povo que não se cala.
Os Cabeça de Cuia
Não há como esquecer
Tem gente de todo tipo
E tudo faz por merecer
É uma raça de sangue bom
Vai à praia ao amanhecer.
Os Cabeça de Cuia
Lá do Norte do Brasil
Chegam à Paraíba
É de curto o seu pavio
Eita gente braba
Como essa nunca se viu.
Os Cabeça de Cuia
De Teresina para o mundo
Tem poeta de mão cheia
Caminhão de vagabundo
Essa gente do boi bumbá
Do coco de Seu Raimundo.
Os Cabeça de Cuia
É do folclore brasileiro
Samba no pé eles têm
É um tipo de forasteiro
Arrepia por onde passa
É água fria no sombreiro.
Os Cabeça de Cuia
Vou saindo de fininho
Este cordel é um presente
É mais que um filhinho
Guarde-o no coração
Com amor e com carinho.
Os Cabeça de Cuia
Agradecem ao cordel
E Já fazem planos novos
Rezam e pedem ao céu
Voltar à Paraíba
É melhor do que doce mel.
Os Cabeça de Cuia
Esperem nós pelo São João
Gosto dessa gente fina
Bem dentro desse pulmão
Um latejar de bondade
Nessa sagrada oração.
Os Cabeça de Cuia
Merecem nosso respeito
Queiram aceitar minha mão
No aperto de direito
Findo este cordel com arte
Com amor dentro do peito.
E aqui chega a família
E eu com dor no quengo
O povo de lá só fala
Num tal de Flamengo
É campeão que não se acaba
Não aguento, eu arengo.
E aqui vou terminando
Esse cordel dos cabecinha
É cuia e mói de gente
E tome frescurinha
Sejam bem vindos
Gilberto cobra a continha...
F I M
João Pessoa-PB, 02 de maio de 2013.
PILAR DA PARAÍBA
Vou dar início este cordel
E vou logo me atrever
A falar de tudo um pouco
Se o leitor quiser saber
Se ele não quiser
Meu cordel vai descrever.
Passeando pelo Estado
Da Paraíba querida
Lembrei de uma cidade
Que deu a luz e vida
Ao grande José Lins
Da obra tão conhecida.
Falo de um Menino
Do Engenho Roncador
A infância de Zé Lins
Depois grande escritor
Do município de Pilar
Onde tudo começou.
A cidade de Pilar
Já é uma grande história
Carrega dentro de si
Tempos de palmatória
Educação dos coronéis
Isso ficou na memória.
Hoje Pilar é moderna
Tem tudo da capital
Escola e futebol
Possui também hospital
Pilar terra tão boa
Modernidade lá é normal.
Voltando ao José Lins
Com sua grandiosidade
É orgulho de toda Pilar
Como em qualquer cidade
Ele escreveu sua infância
Pra viver na eternidade.
As praças de Pilar
Com flores tão desenhadas
É ponto de encontro
De namorados e namoradas
Na sua vida noturna
Também ostenta suas baladas.
A vida do centro é uma
Já do campo é diferente
Com seu falar nordestino
Como é boa aquela gente
Viva Pilar da Paraíba
Com sua boa aguardente.
Pilar terra querida
No cantar se pede bis
De ter gente famosa
Conhecida em todo País
Viva Zé Lins do Rego
Que me deixa tanto feliz.
O Menino de Engenho
Fala muito de Pilar
Quem leu sabe o que falo
É uma obra popular
O município tem história
Que não dá para contar.
Viva a cidade do verde
Com seu centro comercial
Da lavoura da cana
E da notícia do jornal
Zona urbana é a mesma
E cresce a zona rural.
No partido de cana caminhei
E o cambiteiro assim falou:
- Esta terra tem de tudo
E em troca eu te dou
Muito ensino e história
Que minha avó um dia falou.
Eu fiquei muito encantado
Com a terra de Pilar
Tem o riso do trabalho
E aquele povo popular
Com sua sabedoria
É terra boa pra morar.
Pilar de tanta história
E quando aqui eu venho
Vou degustando boa comida
Lendo Menino de Engenho
Sair pelos campos floridos
Na cultura do empenho.
Minha querida Pilar
É recanto de pura arte
Andando pela cidade
Aliás por toda parte
Provando de uma bebida
Que se chama bate bate.
Pilar tem cada história
Feito bola dando olé
Tem Biu que o povo conhece
Com seu gostoso café
Já foi até homenageado
No cordel de muita fé.
A terra de Zé Lins
É encanto de cidade
Jardim cortando o desenho
Pra velho e pra mocidade
Literatura que se ouve
Pilar fica só na vaidade.
Oh Pilar que me consola
No teu verde me sinto bem
Igual ao teu encanto
Juro não ter ninguém
O amor que eu amo
É aquele que me faz bem.
Quem chega em Pilar
Nesta terra tem emoção
Alivia os sentimentos
E fortalece o coração
É Pilar de tanto enredo
Das festas de São João.
Oh Pilar da minha infância
Passava ligeiro o trem
A cidade toda em festa
Lembrando a grande Belém
Onde nasceu o Cristo
Na terra de Matusalém.
A cidade de Pilar
Em Alagoas também tem
Mas eu estou falando
Esta cidade do bem
Que carrega muita história
Daquela terra e do além.
Pilar é simpatia
É cidade tão bonita
Tem o verde ao redor
Com isto ela conquista
Meu querido Pilar
Ao chegar me torno artista.
Pilar, meu Pilar paraibano
Terra que faz história
Grafitada nos anais
Desta profunda memória
Revitalizada pelo tempo
Motivo de muita oratória.
Pilar tem sonhos
Que a alma esquece
Alivia a nossa alma
Nosso corpo enaltece
Quando estou aqui
Meu pensar te agradece.
O jardim que bela rosa
Nasceu naquela praça
Foi Zé Lins que plantou
Colheu e achou graça
Hoje a saudade é grande
Vence Pilar no peito e na raça.
O riacho que hoje corre
Vi pequeno na infância
As águas que ali brota
Teve antes sua importância
O povo tem no momento
Na saúde a ambulância.
Oh Pilar tão amado
Que o coração se orgulha
No rio que corta a cidade
Muita gente ali mergulha
Meu pedaço de chão
Poesia que é fagulha.
Quem vem quer logo ficar
Neste Pilar tão querido
Quando eu chego aqui
Perco enfim o sentido
Ouço muita história
Que faz bem ao ouvido.
Zé Lins está feliz
Por esta bela homenagem
Falar de sua cidade
Com sua bela imagem
Enaltece o grande escritor
Criador do sonho e da paisagem.
É Pilar tão encantada
Que me faz logo refletir
Um silêncio que me incomoda
Nesta praça pude sentir
Um calor e um frio
Que não me deixa partir.
É que Pilar tem um dom
Da conquista de um povo
Acomoda muita gente
O faz o bem nascer de novo
É como não definir
A galinha do seu ovo.
E aqui chego ao final
De Pilar bem que tentei
Mas é extensa sua vida
E no cordel nada contei
Deixo então pra próxima
Se este tempo já esperei.
FIM
João Pessoa-PB, 02 de março de 2009.
O DESTRUIDOR DE LAR FELIZ
Porém assim não dá
Nenhuma explicação
Se eu conto por contar
Vai faltar emoção
É como nada começar
Sem sentido e sem razão.
Era um marido fiel
Só tinha ele e a mulher
Mas era um bêbado cruel
Enchia a cara no mé
Com fama de xeleléu
Ia ao culto em nome da fé.
Sua mulher era direita
Saia comprida e vestido longo
Quando de noite se deita
Ouve a batucada do Congo
Um terreiro que dava receita
Era do macumbeiro Pernilongo.
O marido ciumento
Não tendo motivo
Caiu em sofrimento
Dizia: Sem a mulher não vivo!
E assim o acontecimento
De um cabra pensativo.
A mulher sabedora do amor
Do marido por ela
Envolveu-se com o pastor
E quase que bate biela
A dita cuja era um terror
E o pastor vibrado nela.
O pastor gostando da bichinha
Fez feira e pagou o prejuízo
Ela já era uma galinha
E não tinha juízo
Quando ciscava num terreiro
Dizia: Pernilongo de ti preciso!
O pastor todo sorridente
Invadiu aquela privacidade
E a safada toda contente
Quis contar a verdade
Só para azucrinar a mente
Do seu amante com maldade.
Morava nessa cidade
Um doutor bastante esperto
Ao receber a beldade
Foi logo objetivo e direto
Falou do tema saudade
E lhe prometeu um teto.
A mulher mais que depressa
Disse ser o coração do pastor
E lhe pediu uma compressa
E este para aliviar a dor
Disse: “Não me interessa
Afinal de contas sou doutor”.
Dr. Praxedes Bitencourt
Ginecologista da medicina
Conhecido pelo lenço azul
Da cor de uma piscina
Que usava lá em Curimataú
Era seu charme, dizia uma menina.
Mas o doutor entrava no lar
Destruía qualquer estima
E pra acabar de lascar
Meteu-se com uma cretina
Falou até em se casar
E vejam só esta sina.
E foi com ela para o Sul
Pediu férias do trabalho
E a mulher feliz que só cururu
Pulava na mão como um baralho
E o doutor como índio caramuru
Viajou com terno e agasalho.
A mulher era casada
Do casamento nada de filho
Na rodoviária abraçada
No olhar somente brilho
Não esperava a desgraçada
Futuramente empecilho.
Coitado do marido
Se vendo passado pra trás
E como tinha sido traído
A mulher não quis mais
Ficou com o coração ferido
E lhe entregou a satanás.
O pastor puto da vida
De Praxedes quis se vingar
Da igreja fez despedida
E disse: “Preciso viajar!
Só que nessa ida
Não resistiu, começou a chorar.
O choro era tanto
Que as irmãs também choravam
O pastor tido como santo
Habitantes lhe ignoravam
Até Jesus se escondeu num canto
E todas as lágrimas se agitavam.
O Bêbado por sua vez
Não tendo a mulher novamente
Contou de um até três
E foi aquele choro indecente
Jogou pedra na beata Inez
Estava quase demente.
Caindo tonta no chão
A pobre Inez dessa vez
Ao perceber a ação
Com a ajuda de sua presa
Abocanhou no bêbado a mão
E lhe deixou sem defesa.
Lá pras bandas do Sul
O doutor e a cangaeira
Toda semana um peru
Novinho vindo da feira
Ela se lembrava do pai Jaburu
E da família oliveira.
No Sul a vida é diferente
Nada se parece com o interior
Pra um homem muita gente
Cem mulher pra um doutor
E assim tão de repente
Surge o que se programou.
A comunidade em conflito
Casais juntos, porém separados
Só se ouve barulho e grito
Mundo dos desempregados
Terra de constante conflito
E o doutor um dos letrados.
A mulher ficava em casa
E o doutor dava plantão
Tirou da mulher a asa
E essa sem condição
Ia somente ao Plaza
Comprar a sua alimentação.
O destruidor entrou tinindo
Numa comadre indefesa
Um filme com ela assistindo
Daí a chamou de princesa
E a mão foi-se permitindo
E fez dela ‘vossa alteza’.
A mulher que já era safada
Ficou aberta à mensagem
Na cama uma tarada
Exibia-se com tatuagem
Os seios daquela malvada
Despontava uma linda paisagem.
Essa sujeita se chamava Arlinda
Tinha diploma de sacanagem
E botou o doutor na berlinda
Todos falavam da tatuagem
E o doutor dizia: “É linda!”
A cartilha de pura aprendizagem.
O doutor conhecedor de putaria
E de putaria um garanhão
Gostava quando ela gemia
E o chamava de gostosão
Isso quase todo dia
Era um jogo de enrolação.
Arlinda estava envolvida
Com aquele doutor
Era bastante atrevida
Gostava de sentir dor
E sempre ser batida
Um mundo só destruidor.
O doutor dava pra cacete
E ela dizia: “Quero mais!”
E ele com um porrete
Feito um capataz
Botava na boca dela um sorvete
E lia manchete dos jornais.
Aí ela foi à loucura
Com dor e com gelo
Pulava nas alturas
Segurava pelo cabelo
E soluçava feito uma doçura
Era grande o desmantelo.
Dentro de um quarto
Da casa ou do apartamento
Arlinda que era do mato
Não tinha aborrecimento
Mas fez com o doutor um trato
- Quero hoje um rebento!
O doutor ficou ferido
E mais do que sério
Pediu quase constrangido
- “Não posso, sou estéril”
Disse e ficou entristecido
Não por causa do adultério.
Arlinda vendo a besteira
Que lhe havia dito
Pegou a saboneteira
Rezou pra São Benedito
O doutor deu uma caganeira
Igual a um cabrito.
Foi preciso mais de hora
Pra uma recuperação
Tanto por parte da senhora
Quanto do médico safadão
Ninguém deu o fora
Recomeçou a traição.
Ela delirou de prazer
E cada dia mais apaixonada
Isso não pode ser
Dizia a mulher casada
E finalizava: “Nada de sofrer
Quero alegria nesta estrada”.
O doutor era um escroto
E usava a sua profissão
Um profissional torto
Nele não havia coração
Brincava de fazer aborto
Mais de cem pelo sertão.
O pastor voltou à igreja
E pediu perdão a Deus
Nada sabia dessa peleja
Pois era como os judeus
Onde quer que esteja
Vida longa aos fariseus.
Desde a cangaia levada
O pastor não mais se aprumou
A pregação sempre encerrada
Esperava a amante Nonô
Que no Sul estava ferrada
Acreditando num tal doutor.
Nonô era a mulher
Daquele bebão evangélico
O bebão em nome da fé
Usou um instrumento bélico
Ferindo o macumbeiro no pé
E prometendo vingança do médico.
O pastor mesmo disfarçando
Não escondia o sofrimento
Mesmo no culto orando
Não esquecia o lamento
O tempo ia passando
E era grande o tormento.
Chegava ao interior
Uma jovem sonhadora
Caiu nos braços do pastor
Não era uma pecadora
Trazia consigo a dor.
O pastor logo recebeu
Uma missão importante
A neta de Bartolomeu
Não ia ser sua amante
No outro dia desapareceu
Na carroça de uma cartomante.
O pastor não resistiu
Foi-se embora do lugar
E tão de repente fugiu
O culto não quis celebrar
A palavra caiu
Melhor era se mandar.
O padre Joaquim Serrote
Na missa do domingo
Desejou boa sorte
E realizou até um bingo
Quem ganhou foi Zé do Norte
Vermelho que só um gringo.
Mas vamos voltar ao assunto
Do tal doutor ginecológico
E eu aqui me pergunto
O que é ser lógico
É comer do porco o presunto
Ou morar no zoológico?
Não há resposta agora
Ou talvez nunca se tenha
Como uma pessoa que chora
Ou uma fogueira sem lenha
É um cavalo sem espora
Subindo a ladeira da Penha.
Praxedes tem muita história
A começar destruidor de lar
Desta feita com Arlete Glória
Isso vai dar no que falar
Vejam só a dedicatória
Antes de eu terminar.
-“ Sou casada e bem casada
E não admito me separar
Quero por você ser amada
E muita emoção passar
Se eu ficar ultrapassada
Viajo pra nunca mais voltar!”.
Ao ouvir esse depoimento
O doutor ficou meio sem jeito
Passou a ser um tormento
Mas disse: - “Eu te aceito”
A partir daquele momento
A maldade era conceito.
Arlete perdeu a esperança
Entre o céu e o inferno
O destruidor comprou uma aliança
Vestiu um lindo e brilhoso terno
E pra ela abriu uma poupança
Deu um roupão pra usar no inverno.
Arlete chegava em casa tarde
O maridão preparava o jantar
E os dois sem muito alarde
Iam pro quarto deitar
O sono de pura maldade
Só queria lhe cornear.
O marido um Zé Mané
Não desconfiava do cheiro
O perfume caro de mulher
Porque era um cachaceiro
Desses que fede a chulé
Portanto era um carteiro.
Sempre bêbado o marido
Era enganado diariamente
Nem desconfiava que fosse traído
Quando menos de repente
Entra na casa o atrevido
Todo amavelmente.
Era o doutor da destruição
O que via botava a perder
O que sabia tinha perdição
Porém o era do seu querer
Somente ódio e traição
Coitada da mulher do prazer
Por tão pouco vivia aflição.
Arlete, oh mulher esperta
Não é a toa que esse sexo
Até diabo na hora certa
Ficou meio perplexo
Enganado com a porta aberta
Em história sem muito nexo.
O bebão separava e voltava
O cara não tinha para onde ir
E dizia que a mulher amava
E não queria nunca sair
E sempre em casa ficava
Não tinha pra onde fugir.
Arlete já tinha se acostumado
Com esta situação de risco
Vivendo com um bêbado
Lembrava do belo petisco
Depois do ato consumado
E o destruidor vivia arisco.
O personagem galanteador
Já tinha destruído outros lares
Inclusive Arlete, não é doutor?
Mandava paixão pelos ares
E assim o sujeito pensou
Levo ela e outras para os altares.
Arlete ficou risonha
E não deu uma palavra sequer
Ficou porém muito bisonha
Usou de chantagem essa mulher
Como faz uma cegonha
Que é mãe dos filhos e dá no pé.
Daquele dia em diante
A relação ficou confusa
Ela não se sentia amante
E dizia – “Você só me usa
E me faz uma grande errante”
O doutor com palavrão só acusa.
O doutor ouvindo aquilo
Não conteve o vocabulário
Jogou na madame um quilo
De dinheiro de todo salário
Mas mesmo assim intranquilo
Era a vida do salafrário.
O doutor ficou sabendo
Do perigo que lhe rondava
E o risco de vida se metendo
E cada vez mais se complicava
E o corno vingança prometendo
Um colega seu avisava.
O doutor ficou vermelho
Com medo e todo se tremendo
Olhando no espelho
E a mulher na cama gemendo
E ele implorava de joelho
- Não conte que estou morrendo!
E na fragilidade o doutor perecendo
Enquanto ela dando gargalhadas
Sorria com aquilo tudo fervendo
Gostava das atrapalhadas
Iam um a outro merecendo
Nas incontáveis embrulhadas.
Ao término ele se despede
E ela sem querer separação
No ouvido do amante pede
- “Fique meu coração”
E ele aos caprichos cede
E não contém a emoção.
Essa mulher tinha um casal
Um menino de dez anos
Uma menina especial
Com o marido, nada de planos
Com o destruidor tudo normal
Mas só existiam desenganos.
O destruidor um tanto frágil
Foi aí que a mulher se fez
Como uma ema muito ágil
Cada semana era mais de três
E tome estrada e pedágio
Não lhe faltava freguês.
O lar dessa pobre infeliz
Nem havia mais no lugar
O marido que sempre lhe quis
Bebia em quase todo luar
E vomitava no chafariz
E cartas não ia entregar.
O destruidor e sua sina
Tinha o medo da traidora
E lhe chamava de menina
E de vez em quando de doutora
A mulher com isto se anima
E se torna mais sedutora.
Antes de ele aparecer
Arlete era direita e honesta
Aí o destruidor fez sofrer
Árvore caída de uma floresta
Caem máscaras ao amanhecer
Então o que lhe resta?
A família dela caloteira
O marido corno da cidade
Com receio da bandoleira
Fez todo tipo de caridade
Até tentou uma camareira
Mas logo dizendo a verdade.
O bebão não tendo dinheiro
Viu aquilo muito estranho
E desconfiando de um borracheiro
Por nome Pietro Castanho
Interrogou logo que ligeiro
Depois que tomou um banho.
A mulher toda amorosa
Disse – “Meu tesouro
Aceite a grana de sua gostosa
O que ganho é ouro
Vamos sair dessa vila sebosa
Você é meu tesouro”.
O corno todo orgulhoso
Da sua mulher querida
Porque todo corno é bondoso
Disse que a sua vida
Numa frase de pabuloso
- “Não tem melhor pedida!”
Doutor Praxedes Bitencourt
Que no Rio se encontrava
Ficou gordo igual a cururu
E quando em casa voltava
Nonô não mais tinha peru
Só de lamentos reclamava.
O marido de Arlinda beberrão
O de Nonô um desqualificado
O de Arlete um babacão
Como um encontro marcado
Os cornos e o doutor destruição
Pensava a gente do povoado.
O doutor Praxedes voltava
As férias foram vencidas
O povo logo se acostumava
E compraram várias bebidas
Na comemoração Nonô estava
Veio do Rio com roupas perdidas.
Arlinda voltou pro marido
Arlete o mesmo fez
Esqueceram do doutor sabido
E a vida cada uma refez
Cada homem que foi traído
Receberam flores mais de uma vez.
Ao chegar no Curimataú
A vida de Nonô mudou
A experiência ganha no Sul
Não quis mais o doutor
E quando lembrava o peru
Perguntava pelo pastor.
Até hoje vaga no mundo
Essa mulher traidora
De um arrependimento profundo
Nonô é mais que sofredora
No andar de um moribundo
Viaja na solidão criadora.
O tal doutor da ginecologia
Teve o diploma cassado
Usou tudo que sabia
E foi logo processado
Vive hoje de agonia
Arrependido do seu passado.
Muito antes do doutor
Era só de felicidade
Tudo bem que houve o pastor
Que iniciou toda esta maldade
Quando não se tem o amor
O lar se destrói em crueldade.
Esse cordel que eu fiz
Fala de traição e coisa ruim
No lar, vida de quem é infeliz
A destruição do não pelo sim
De homem, mulher, como se diz
A maldição do povo de Caim.
E assim se chega ao final
Contado nesse cordel
Não se trata de bem ou mal
De inferno ou céu
Muito menos de animal
Pra literatura tiro o chapéu.
F I M
João Pessoa-PB, 22 de julho de 1989.
ZEFINHA DO OIÃO
Meu caro contemporâneo
Licença eu te peço
Vou tentar te entreter
Lendo aqui este meu verso
Escrito com muito amor
Na alegria e na dor
Do tema que me interesso.
O Cordel é muito forte
E vai agora contar
Zefinha só pensava
Naquilo que se dá
Ela não tinha vergonha
Vinha vindo na cegonha
E só falava em gozar.
Zefinha não tinha pareia
Gostava de safadeza
No dia que não fazia
Era pior do que pobreza
Ela não se assossegava
Quando aquele bicho dava
Pra ela uma riqueza.
Como é que uma mulher
Fez assim daquele jeito
Querendo ver todo mundo
Pegando no seu peito
E dizendo eu quero mais
Seja velho ou rapaz
Levo logo pro meu leito.
Assim era Zefinha
Com aquele grande olhar
Quando ela olhava a gente
Dava vontade de mangar
O olho feito do cão
Apelidada de Oião
Veio logo se acostumar.
Ela era uma danada
Em matéria de amor
Vivia pelas esquinas
Sentindo grande calor
Tudo só se acabava
Quando ela se danava
Nas mãos de um doutor.
Certa feita na cidade
Ela não tendo o que fazer
Pegou no objeto
E quis ele vender
O coitado de Berimbau
Primo de Zé Catatau
Começou logo a sofrer.
Zefinha tão descuidada
Não sabia conquistar
Tudo era na putaria
Ver o povo se lascar
Ela não tinha juízo
Ali mesmo foi preciso
Sua mãe lhe protestar.
Zefinha era uma moça
Que morava aqui de lado
Toda vez que ela queria
Ao moço dar o danado
Ele ficava doidão
Mais Zefinha do Oião
Com o cabelo arrepiado.
O moço não aguentava
Tanta fala da Zefinha
Disse: guarde o danado
Quando for a noitinha
Ela disse: cabra safado
Eu dou o meu danado
Até na beira da linha.
E assim esta mulher
Só andava paquerando
No bar lá da esquina
Ela lá foi se chegando
Olhou pra João Trindade
E deu foi liberdade
Pra o bicho apontando.
O povo não aguentava
Tamanha cara de pau
Zefinha dava uma espiada
E chamava o Juvenal
Este era o sacristão
Da igreja de São João
E a levava pro curral.
Conheço muita mulher
Mas nenhuma feito Zefinha
Só gosta de trabalhar
Bem pertinho da Marinha
Faz tudo com o marinheiro
Daqui ou do estrangeiro
Chamando de cachorrinha.
Ela pega uma barata
E esfrega no vestido
Diz que aquele cheiro
No bicho dá mais sentido
Deixa o menino louco
Que não tolera troco
E fica assim mais pervertido.
No dia da padroeira
O padre foi reclamar
Zefinha estava com o diabo
E queria se esfregar
Dentro de uma gaiola
Ela nua pedia esmola
Mandou a igreja se lascar.
Seu Arnaldo da bodega
Foi dar queixa a Juvina
Foi dizendo a senhora
Que era mãe da menina
Que cuidasse da donzela
Bem defronte à pinguela
Triste foi a sua sina.
A mãe da infeliz
Se sentindo humilhada
Chamou a sua filha
E mandou a condenada
Dar uma pisa no Arnaldo
E mostrasse o danado
Pra fazer a cachorrada.
Tal mãe e tal filha
Não há explicação
Zefinha não teve pai
E viveu na perdição
Deixou de lado a infância
E nunca deu importância
Vivendo só de confusão.
O pai que fez Zefinha
Se mandou para o Sudeste
Vive honesto trabalhando
Feito um cabra da peste
Enquanto a sua filha
Traçando mal sua trilha
Se perdendo no Nordeste.
Zefinha é descuidada
Podia ficar bonita
Se não fosse a sua boca
Com tudo se irrita
Fala muito palavrão
Chama o povo de ladrão
E vive sempre esquisita.
Zefinha tem leitura
Mas não usa o que tem
Só anda de salto alto
E não vale um vintém
Certa feita na estação
Levou uma esculhambação
Do maquinista Zé Xerém.
Dona Chica do mercado
Falava tanto de Zefinha
Não sabia da sua casa
Que tinha lá uma galinha
Falar da vida alheia
Melhor levar uma peia
No rabo de Dona Chiquinha.
A Zefinha do Oião
Ficou muito conhecida
Dava pra todo mundo
Feito espinhela caída
Gritava pra todo lado
Querendo dar o danado
O melhor da sua vida.
O mundo tem cada história
Zefinha é do Cordel
Ela foi muito abusada
Nas mãos de um coronel
Ela dá pra muita gente
Por um gole de aguardente
E um pedaço de pastel.
Não conheci pessoalmente
Gostaria de conhecer
Só pra ver esta Zefinha
Virando o olho de prazer
Quem contou não sabe nada
Às vezes dar uma mancada
Só estando lá pra ver.
Quando ela veio ao mundo
A mãe se descuidou
Nunca deu um beijo nela
A bichinha nunca amou
Depois que ela cresceu
O sofrimento logo nasceu
E a putaria se plantou.
Zefinha tinha defeito
Que não tem explicação
Quando ela não tinha
Botavam na ocasião
O mundo tem hipocrisia
Seja João, seja Maria
Viva Zefinha do Oião.
Deus tomara, meu Senhor
Que eu tenha acertado
A vida de uma tal Zefinha
Que gostava do danado
Vivia só aprontando
E o bicho sempre dando
Pra qualquer um coitado.
A vida de cada um
É feita em construção
Seja rico, seja pobre
Em qualquer filiação
A história de Zefinha
Pior do que galinha
Ciscando em estação.
Quando você não entende
Qual é sua virtude
O mundo vai lhe ensinando
E mostrando sua atitude
Zefinha dizia ao povo:
- Eu gosto de tudo novo
Comigo ninguém se ilude.
A vida que ela teve
No Cordel só se aumenta
Dizem as más línguas
Que era pior do que jumenta
Não se valorizava
De ruindade ela gostava
Com ela ninguém aguenta.
Obrigado meu leitor
Com muita gratidão
O danado de Zefinha
Vivia de mão em mão
Quem não sabe da história
Guarde isso na memória
Ilustre Zefinha do Oião.
FIM
João Pessoa-PB, 22 de abril de 1999.