UMA LAIVE DE MATUTO CAUSOS DA ROÇA MODERNA
Demore um pouco seu moço
"Mode" eu lhe contar ligeiro
Um causo desmantelado
Que "assucedeu" em janeiro
Foi com eu e minha "veia"
Escute a "prosopopeia"
"Derna" do verso primeiro.
Eu "sô" matuto da roça
Tarado por rapadura
Fumo cigarro brejero
Gosto da cachaça pura
Queijo, cuscuz e coalhada
"Sô" doido por vaquejada
E carne que tem gordura.
Por tapioca, pamonha
Por macaxeira, batata
Farofa, tripa de porco
Castanha assada na lata
Rolinha, tamanduá
Nambú, "ribaçã," preá
Ovo de gança e de pata.
Criado dentro do mato
"Sozin" que nem bicho bruto
Tenho um cachorro Perí
Outro que chamo de "Pruto"
Vivo da roça somente
Primeiro eu planto a semente
Pra depois colher o fruto.
Agora a coisa mudou
Chegou a modernidade
Televisão, internet
Energia outra bondade
"Cerulá', filme, cinema
Novela, roubos, esquema
Aja curiosidade.
Eu que conheci lutando
Foice, machado, muringa
Enxada e cutivador
Tomando porre de pinga
Ir pra "muci" de pequi
Ou picolé de caqui
É um asar da "mulinga".
Pois nunca me acostumei
Com água da geladeira
Nem com tempero completo
Processador, batedeira
Cachorro quente, omelete
Enlatados, espaguete
E lasanha, outra besteira.
Essa coisa de automóvel
Barco, lanchas, e avião
Motel, drink, cama sutra
E casa de diversão
Mulher que dança num pau
Homem que fala miau
"Num me dô cum" isso não.
Eu sou da coisa mais séria
Do tempo do "cabra macho"
Um sujeito usando brinco?
Mulher colocando "cacho"?
Homem de batom e peito
Co'a bunda daquele jeito
Se isso está certo eu não acho.
Mulher de cabelo curto
Virando policial
De barba, terno e gravata
Isso aí não está legal
Um marmanjo na gandaia
De bolsinha e minissaia
Morro e não acho normal.
Mas "tão" dizendo que é moda
Coisa do tempo moderno
Eu vou voltar pro passado
Pode anotar no caderno
Que "roçá cacho cum cacho"?
E macho beijando macho?
Eita moda do "zinferno".
O "rela bucho" acabou-se
Não se dança arrasta pé
É paredão, "quadradim"
Maconha, loló "inté"
"Tão caçando" outro planeta
Pra viajar num cometa
Ô mundo velho sem fé.
Essa tecnologia
Trouxe muita perdição
Filme que ensina matar
Curso pra formar ladrão
Pecado, selvageria
Violência, putaria
Falsidade e traição.
Mas tem boa informação
Que vem do noticiário
Um jogo de futebol
Um concurso de operário
Tem o Domingo Legal
E tem o Globo Rural
Pra mudar o itinerário.
Quando eu parei pra pensar
Reparei que a conta soma
Os costumes da cidade
Dentro da nossa redoma
Ou isso aqui moderniza
Ou esse "trem" viraliza
E a roça vira Sodoma.
Vejam a má influência
Que isso tudo nos causou
A roça não é a mesma
A matutada mudou
"Tá de caô, tá ligado"
"Tá tudo conectado"
Depois que a net chegou.
E com isso meus guris
Viviam dizendo, pai
Mande butar internet
Nós precisamos de "aifai"
Eu fui por ali pensando
Com a "veia" combinando
E ela foi dizendo "uai".
"Tu manda botar o troço"
Que os meninos "tão" querendo
"Pro mode vê atizap"
"Até nós acaba vendo"
Mas, sem às coisas da rua
Fuleragem, mulher nua
"Eu digo não tô sabendo".
Só sei que "butei o bicho"
E começou a "ingrisia"
Facebook, "atizap"
O Instagram, Virge Maria!
De fuxico e de fofoca
Todo canto uma "maloca"
Só falando em putaria.
E nesse "balai de gato"
Surgiu a Tv da Gente
"Mode" fazer coisa boa
"Butá" o verso pra frente
Eu digo vou me escrever
Que agora o mundo vai ver
Um matuto inteligente.
Mais depressa entrei no grupo
Logo me vi submerso
Mandando rima e poema
Todo dia um "mói" de verso
Falando co'a empolgação
Das coisas do coração
Para os cantos do universo.
Parecia um "big broder"
A tal dessa Academia
Pois era uma "onda medonha"
Cada verso q'eu" fazia
No papo vai papo vem
Esse grupo só ia bem
Co'a minha filosofia.
Eu sei que afinal de contas
Fui ficando presunçoso
Qualquer papo de poesia
Achava muito gostoso
E pensando em melhorar
Fui largando o trabalhar
Me tornando preguiçoso.
A mulher já invocada
"Foi num foi" aquela intriga
Dizendo que fazer verso
Não vai encher a barriga
Eu danadinho escrevendo
"A veia só rimuendo"
De vez enquando uma briga.
"Eu digo tu deixa de onda"
E larga de ser pateta
Q'eu vou escrever um livro
Para disso, fica "queta"
Troque a roça pela prosa
Que tu vai ficar famosa
Sendo a mulher do poeta.
E nesse "chove não molha"
Naquele "queré qué qué"
Eu inventei de inventar
"Uns danado duns cordé"
Mas liso sem um cruzado
"Tumei dez conto imprestado"
Pro neto de Zé "Mané".
Pra pagar vendi um bode
Patos, galinhas, e "uveia"
A "muié arrecramando"
Dizendo que coisa feia
Tu vendendo a criação
"Mode" fazer profissão
Em falar da vida alheia.
Eu cotinuei versando
Falando de amor e paz
"A "veia" me catruzando"
Eu sem lhe dá um cartaz
Todo dia um verso novo
Tava na boca do povo
O que a internet não faz?
Pra "veia" era um desaforo
Eu ir pra modernidade
"Atizap," internet
Tudo era uma novidade
Que ela não compreendia
Chamava de putaria
Também de promiscuidade.
A coisa não "tava" boa
"E pro mode" piorar
Criaram a tal d'ma "laive"
Pra gente comunicar
Falando da Academia
De verso e de poesia
Veja só no que vai dar.
Cada um dizendo um verso
Mandava pra lá gravado
Chegando na Academia
Era só ficar "ligado"
Para ver o "fuzuê"
Nós passando na tv
No repente improvisado.
Umas Donas puetisas
Dizendo verso bonito
Rimando que nem os homens
Sem haver nenhum conflito
Tanto faz ser decorado
Como ser improvisado
Ser declamado ou escrito.
No começo nao gostava
Tinha até má impressão
Mas depois eu "afroxei"
E mudei de opinião
Juro por Santa Maria
Que fiz da tal poesia
A minha religião.
A "veia" foi se invocando
Com essa minha conversa
Dizendo que assistir "laive"
Pra roça não interessa
Que é uma coisa bisonha
E o "cabra" que tem vergonha
"Não vai machar pra uma dessa".
Eu só pra contrariar
Fiz a defesa tecendo
Dizendo o quanto era bom
Como quem não quer querendo
Mas a "veia foi num foi"
"Cubava correndo o oi"
Como quem diz "tô te vendo".
O "troço" foi piorando
Ficou ruim de controlar
Findou num "arranca rabo"
"Da cascavel chucalhar"
Briga de gato e socó
Veja bem o "quiprocó"
Que agora eu vou lhe contar.
Certa noite lá em casa
Por bem "poquin" não apanho
Peguei o meu "cerular"
Depois de tomar um banho
A "veia" diz isso é grave
Eu disse vou ver a "laive"
Repare aqui o tamanho.
Ela disse se é assim
Eu também não vou "dá sopa"
Já que tu gosta de "laive"
"Laive a casa, laive a roupa"
"Laive" também o banheiro
Comece por lá primeiro
Foi quando dei uma "poupa".
Ô mulher desaforada
Pra gostar de confusão
Por causa de qualquer coisa
Já tira má impressão
Não vê que essa mal querência
Repleta de intransigência
Só causa aporrinhação.
Deixa de "chove não molha"
Que isso aqui é diferente
É uma "laive" poética
Do Brasil pro continente
Agora explique você
Aonde é que vai "cabê"
Sabão omo e detegente.
Compadre nesse momento
"A "veia" deu a bilora"
Fez "frexero inriba deu"
E desligou a emissora
Avançou pra minha "banda"
Disse aqui a propaganda
É no cabo da vassoura.
Eu gritei vala-me Deus!
Pedi socorro ao "visin"
Tinha um "bruguelos" na sala
Quase atrupelo o "bichin"
Digo e não peço segredo
Mesmo morrendo de medo
Que a "laive" aqui é assim.
E sei que nessa carreira
Eu saí em disparada
Fui "esbarrá" no buteco
Tomei logo uma "lapada"
Que fiquei vendo visagem
Pra poder criar coragem
E depois tumar chegada.
Por volta da meia noite
Fui chegando com cuidado
Olhando pra um lado e pro outro
Vi o portão escorado
Digo é uma maravilha
Mas se for uma armadilha
"O quixó tá preparado".
Só sei que criei coragem
Pra abrir a porta e entrei
A "cobra" estava dormindo
Do seu lado me deitei
Só acordei no outro dia
Cheio de prosa e alegria
Igual a um pássaro rei.
De manhã cedo uma prosa
Corruchiando a "muié"
Dei um cheiro no "cangote"
Fui logo tomar café
E pra esquecer a procela
Comprei um maço de vela
E ascendi pra São José.
Daqui pra frente é assim
Tudo vai ser combinado
Só vai haver poesia
Nós dois no quarto fechado
"Acochando na banguela"
A "laive" é só eu e ela
No namoro improvisado.
Não vou precisar de senha
E-mail, nem emissora
Não carece de YouTube
Pra fazer a difusora
Prefiro "laivar" a casa
Do que a "veia" botar asa
No cabo duma "bassora".
FIM.