CURSO DE FORMAÇãO DE SOLDADO - C F Sd 1989 (cordel)

Vou narrar esse cordel

Nessa nobre ocasião

A história de uma turma

De muita dedicação

Foi na turma de soldado

Que tudo ficou marcado

No curso de formação.

Foi lá em oitenta e oito

Que surgiu a ocasião

A turma segundo grau

Rumo a nossa formação

Prestei aquele concurso

Pra depois fazer o curso

No Terceiro Batalhão.

Quando soube o resultado

Fiquei emocionado

Avisei logo a família

Agora vou ser soldado

Fiquei muito alegremente

Aguardei impaciente

O dia de ser chamado.

Confesso que não sabia

De tanta coisa por vir

Exame psicológico

Fez a gente distrair

Mas aqueles de saúde

Fiz todo esforço que pude

Quase penso em desistir.

Viajei pra capital

Com meus amigos também

Fizemos várias viagens

Era aquele vai e vem

Mas pra quem se põe de pé

E pra tudo bota fé

Os anjos dizem amém.

Faltava o exame físico

E sobrava ansiedade

Também faltava dinheiro

Era essa a realidade

Pois para nossas viagens

O dinheiro das passagens

Era uma dificuldade.

Dezembro logo chegou

Bateu logo um desengano

Outra proposta surgiu

Mas não mudei o meu plano

Pensei, vou ficar esperto

Se esse ano não der certo

Dará no próximo ano.

Então, fomos informados

Pra que nada nos reprove

O curso de formação

Que a polícia promove

Irá subir um degrau

Primeira segundo grau,

A turma de oitenta e nove.

O grande dia chegou

Momento mais aguardado

Dia seis de fevereiro,

(No dia três publicado),

Na manhã de sexta-feira

Sendo golinha ou toupeira

Todo mundo apresentado

Para dá as boas vindas

Chega o cadete Gival

Com dramáticas palavras

Com frases nada formal

“Pode escrever no caderno

Vocês estão no inferno

Gente aqui vai se dar mal”.

Levou a gente pro campo

Para primeira instrução

Chega o tenente Bragança

Carrasco do batalhão

Já chegou subestimando

Assumiu logo o comando

E começou o rojão

Foi ali que nós tivemos

Longa aula de ordem unida

Para sermos bons soldados

Estava dada a partida

Foi um grande sofrimento

Pois eu quase me arrebento

Tive dó da minha vida

Falava com voz suave

Dando uma de bonzinho

– “Dedo indicador no chão,

Girando devagarinho”.

Fazendo giro anti-horário

Nos fazendo de otário

No chamado peruzinho.

Depois de tantos traquejos

Sem podermos reclamar

Lá no dique de lavagem

Ordenaram rastejar

Ali nada era discreto

Óleo sujo no concreto

Todos nós a atravessar

A roupa suja de óleo

Até de graxa também

Molhados de jato d’água

Pra não escapar ninguém

E o tenente amedrontando:

– “Aqui tá só começando

Tem que desistir alguém”.

– “Alguém já quer desistir?”

Outro tenente indagou.

Todos com a cabeça erguida

Respondemos “não senhor”!!!

– Agora daqui pra frente

Sei que vai desistir gente

Quero ver quem tem valor

Ordenou pra nos deitar

E rastejar pelo chão

Rolar prum lado e pro outro

Sem qualquer reclamação

Ali quase nós se ferra

A roupa suja de terra

Foi aquela melação.

O expediente acabou

Hora da gente partir.

E logo grita o tenente

– “Nada pode por aqui”

Não tem água pra beber

E quem desobedecer

No xadrez já vai dormir

Foi gente sair correndo

Como animal no cercado

Que vê a porteira aberta

Correndo pra qualquer lado

Pensando na brincadeira

Voltar na segunda-feira

Naquele plano traçado.

Segunda-feira chegamos

Todo mundo tava arisco

Sem ninguém querer errar

Para não correr o risco

Daí pra frente a história

Que carrego na memória

Dava para encher um disco.

Surgiram logo apelidos

Chamando muita atenção

O Pelota, e o Burro Brabo

O Homem Pedra e Celhão

Jacaré fazendo ruga

Labafero e Tartaruga

Era aquela gozação.

Tinha o Theck, e o Pade Ciço

Tinha o Matuto também

Sanitário, e Corcorã,

Não sei se esqueci alguém,

Tudo isso foi lembrado

Que ninguém fique zangado

Pois só tem homem de bem.

Chamaram muita atenção

Os fatos acontecidos

Foi cada situação

Que nos fez reconhecidos

Sofremos cada traquejo

Confesso que jamais vejo,

Mas nos fez enaltecidos

Também tinha aulas teóricas

Na grade curricular

Português e Matemática

Tínhamos que estudar

Ordem unida e Odite

Nossa turma de elite

Fomos nós a praticar.

No quartel tinha um zoológico

Com jacaré e veado

Com tartaruga e pavão

E ave para todo lado

E tudo era uma beleza

Mas para fazer limpeza

Tinha um aluno escalado.

O macaco era tranquilo

Com qualquer soldado antigo

Mas um aluno por perto

Já corria algum perigo

Sendo à noite ou de manhã

O aluno Corcorã

Sofria dele o castigo.

Um dia quebrou a grade

Numa força desmedida

E saiu em disparada

Como uma bala perdida

Ao Corcorã avistou

O negócio não prestou

Tacou nele uma mordida.

Um aluno bem tranquilo

Sem nada que lhe assanhe

Lhe obrigaram a repetir

A frase falando em mãe

E gritou logo, “senhor”!

– “Sei que aqui tá bem melhor

Que na casa da mamãe”.

Era o aspirante Gomes

Que comandava a instrução

Disse. “Vai ficar melhor”,

Tratem de empurrar o chão

Sei que foi daquele jeito

Roçamos mato nos peitos

No Terceiro Batalhão

Naquele traquejo horrível

‘Stava nós a rastejar

O aluno Tartaruga

Ou por sorte ou por azar

Deu de cara com um sapo

Com ele não teve papo

E tratou de arremessar

Quando o aspirante viu

O que tinha acontecido

Ordenou pra nós parar

Se mostrando comovido

Ordenou que o aluno “Tal”

Pegasse aquele animal

E criasse protegido.

Lá o sapo se tornou

Animal de estimação

Foi tratado com carinho

E também com atenção

Lá num cantinho isolado

Pra não ser incomodado

Foi a melhor opção.

Bem ao lado do quartel

Tinha uma poça de lama

Encobrindo toda a rua

Só parava lá na grama

A motorista deu fé

Engatou a marcha à ré

E fugiu daquele drama

Estava cabo Zanardo

Também sargento Pedrosa

Que já deu voz de comando

Com a voz maliciosa

Ordenou pra rastejar

E toda roupa molhar

Naquela lama sebosa.

Lá na parte do zoológico

No tanque do jacaré

Quando o tenente Bragança

Fez todos pular de pé

Pra mergulhar a cabeça

Que um batizado pareça

E foi aquele trupé

Um aluno espertalhão

Já pensando em ser sacado

Sem mergulhar a cabeça

Para não sair molhado

Chegou a turma do choque

Sem deixar que ele “pipoque”

Deixou o aluno encharcado.

Um dia a cobra fumou

No terceiro batalhão

Os dois pelotões em forma

Com todos em prontidão

Aproveitaram o ensejo

Oito horas de traquejo

Foi ali que eu vi rojão

Começou às sete horas

E já deu pra perceber

Correndo em Arapiraca

No bairro da AABB

O Sol foi ficando quente

Sem ninguém largar a gente

Pensei que ia morrer

Cruzamos a rodovia

Na frente do batalhão

Metendo os peitos no mato

“Quero vê forrar o chão”

Foi triste o nosso papel

O pai nosso do quartel

Era só uma atração

Chegamos ao batalhão

Pensando em ser liberados

Chega o tenente Bragança

E outros praças lá fardados

Foi triste a humilhação

Nós naquela ralação

Oito alunos desmaiados

O Talles foi pro xadrez

E o Remivaldo também

O Cordeiro também foi

Não sei se foi mais alguém

E quem ficou enjaulado

Vendo o sol nascer quadrado

Não desejou pra ninguém.

Foi na educação física

No jogo de futebol

Numa disputa de bola

Para evitar um lençol

Foi no campo da caserna

Que o Sales quebrou a perna

Ficou parecendo anzol

Um dia teve um jantar

No Terceiro Batalhão

Delegaram aos alunos

Aquela nobre missão

De preparar o jantar

Sem nada poder falhar

Pra não ter reclamação

Escalaram três alunos

Informaram o que fazer

Um foi cortar as verduras

Pra ele foi um lazer

Se a comida vai tá boa

Não é pra qualquer pessoa

O chefe é quem vai dizer

E com a verdura cortada

De forma muito gentil

Colocaram na panela

Com jeito muito sutil

Naquele momento e espaço

Cai uma esponja de aço

Foi a sopa de Bombril

Ninguém, porém, se deu conta

Do que tinha acontecido

A panela foi ao fogo

Como tinham sugerido

Mas veio o momento ingrato

O Bombril caiu no prato

Tudo estava destruído

Pressionaram os três

Para dar explicação

Um saiu negando o fato

Outro disse “fui eu não”

No meio daquele impasse

Se o aluno confirmasse

Já tava certa a exclusão.

Perguntaram pros alunos

“Quem dirige caminhão?”

Surgiu logo um voluntário

– Sou melhor da região!

– Pois você que é fascista

Sem deixar sair da pista

Dirija o carro de mão.

No dia da formatura

O paraninfo falou

Mais de quarenta minutos

Foi o tempo que durou

Pois aquela oralidade

Durou uma eternidade

Muita gente desmaiou

E depois da formatura

Houve aquela despedida

Pois alguns seguiram juntos

Para outros a partida

Já sem saber do futuro

Para nós era um escuro

Que cruzava nossa vida.

Trinta anos se passaram

Mas temos tudo na mente

Alguns, porém, já partiram

Não se fazem mais presente

Muita coisa já mudou

A saudade que ficou

Nunca mais daqui pra frente.

Nesse tempo que passou

Uns estão aposentados

Receberam promoções

Outros foram afastados

Bancário e padre feliz

Advogado e juiz

Mas todos são bons soldados

Marcamos um novo encontro

Num grupo de whatsapp

Procuramos uns aos outros

Para que ninguém escape

Essa tecnologia

Nos trouxe muita alegria

Torço que ninguém farrape.

Foi assim nossa rotina

No quartel de Arapiraca

A turma segundo grau

Ninguém era de fuzaca

Se coronel ou tenente

Hoje na nova patente

Todo mundo se destaca.

Os traquejos que sofremos

Não deu pra matar ninguém

Seguimos na profissão

Sem guardar mágoa de alguém

Sei que nossos instrutores

E também os monitores

Nos instruíram pro bem.

Por isso guardo comigo

E escrevo no quadro e giz

Meu período de aluno

Foi um tempo bem feliz

E levo pro fim do mundo

Sem esquecer um segundo

De tudo aquilo que fiz.