Um galope à beira mar

O galope à Beira mar foi criado pelo repentista cearense José Pretinho. Conta-se que ele, após perder um duelo em Martelo Agalopado, foi retirar-se à beira-mar, e ali, vendo e ouvindo o marulho, imaginou o som de um galope e fez os versos de onze sílabas (hendecassílabos),com a mesma estrutura de décima (estrofe de dez versos). Manteve o esquema rítmico ABBAACCDDC usual no Martelo Agalopado.

O Galope à Beira Mar deve ser lido ou cantado, com ênfase nas segundas, quintas, oitavas e décimas primeiras sílabas, que devem, todas, serem tônicas, e as glosas terminam sempre com o mote "Cantando galope na beira do mar".

Num dia de quarta, no meio da feira

Um certo poeta, fogoso e vadio

Propôs para mim o maior desafio

Que houve até hoje aqui em Pesqueira

Ficamos os dois, a manhã quase inteira

No grande duelo que vou lhes mostrar

Não sei quem ganhou e nem quero julgar

Pois acho que os dois só merecem louvores

Provaram que podem sair vencedores

Cantando galope na beira do mar

Eu

Eu disse, meu nobre, me preste atenção

Prepare seu lombo que a peia tá pronta

Pois nesse terreno ninguém me afronta

Nem canta de galo se for um capão

Eu vou lhe ensinar uma grande lição

Pra que nunca mais venha aqui provocar

Ninguém até hoje ousou me enfrentar

Por isso meu caro não seja imprudente

Eu sou campeão e sou Rei do Repente

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Então se prepare que agora chegou

O cabra que vai lhe humilhar no Repente

Por sua arrogância serei inclemente

Do meu gabarito você duvidou

Então vai sair bem menor que entrou

Diante de mim você vai se ajoelhar

Se tem algum rei aqui neste lugar

Aprenda de vez que o monarca sou eu

Porque até hoje ninguém me venceu

Cantando galope na beira do mar

Eu disse

Você é ousado e demonstra coragem

Se fosse covarde eu batia na bunda

Depois eu montava na sua cacunda

Com meu caçuá e com toda a bagagem

Iria sair por aí em viagem

Montado em seu lombo e você a trotar

E pra todo mundo eu iria mostrar

Quem é o poeta e quem é o jumento

Pra todos iria mostrar meu talento

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Como égua no cio não monta em ninguém

Se eu fosse o jumento você ia embaixo

Pra sua arrogância eu não me abaixo

E vou demonstrar, por aqui, quem é quem

Quando eu lhe falar você só diga amém

E peça licença, pra mim, ao falar

Senão sua língua vou ter que cortar

Assar num espeto e fazer tira-gosto

E mais uma vez vou manter o meu posto

Cantando galope na beira do mar

Eu disse

Eu sei que você não é macho o bastante

Por isso não temo falar o que quero

Eu já estou cheio do seu lero-lero

E peço que pare esse papo pedante

E mostre talento de agora em diante

Se é que você sabe mesmo cantar

Porque só ouvi o senhor relinchar

Andando de quatro e sujando o rabicho

Já eu, solto a voz pelo mundo e capricho

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Quem suja o traseiro aqui é você

Eu já sinto o cheiro, mas tapo o nariz

Você no Repente é um pobre aprendiz

Ainda usa fralda que nem um bebê

A sua derrota eu ver na tevê

E todo o Brasil vai lhe ver se humilhar

Eu vou lhe espremer até vê-lo peidar

Pedindo clemência e lambendo-me a bota

Depois vou brindar pela sua derrota

Cantando galope na beira do mar

Eu disse

Você abre a boca e só fezes sai dela

Em vez de gravata, coloque um penico

Um bom hospital pra você eu indico

Seu ânus parece que fica na goela

Quem fica mais perto, ao ouvi-lo, se mela

Você não consegue nem mesmo falar

Pois quando abre a boca começa a cagar

É isso que o povo vai ver na tevê

Vou ser aplaudido ao ganhar de você

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Duvido que isso aconteça de fato

Quem caga com a boca é o meu oponente

Que nunca ganhou de ninguém no Repente

Pois vive no esgoto que é toca de rato

Você me dá nojo até em retrato

Eu quero distância do seu linguajar

Seu hálito fede, tal qual, ao peidar

Você quando fala, urubu se aproxima

Não fique na frente que eu passo por cima

Cantando galope na beira do mar

Eu disse

O povo já sabe qual é seu destino

Com meu repertório não há um que possa

Quando eu der a carga você cai na fossa

Igual ao resíduo do meu intestino

Você é igual a badalo de sino

Que só faz barulho e não sabe cantar

Não toca viola, nem sabe rimar

Seu cérebro é oco que nem a cabaça

Eu vou gargalhar pela sua desgraça

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Qual foi a cigana que leu sua mão

E disse que um dia seria poeta?

Pegou seu dinheiro e lhe fez de pateta

E ainda acredita que é campeão

Você se mostrou o maior canastrão

Um péssimo ator que nem sabe enganar

Por isso aconselho o você a parar

Pedindo desculpa e mostrando respeito

Pois mais uma vez elevei meu conceito

Cantando galope na beira do mar

Eu disse

Não peço desculpas, mas mostro respeito

Pois nossa discórdia foi pura armação

Ao povo agradeço por toda atenção

E acho que o povo ficou satisfeito

Cantando Repente você foi perfeito

O nosso Galope cantou sem falhar

Na próxima quarta nós vamos voltar

E todos aqui já estão convidados

Agora nós vamos sair abraçados

Cantando galope na beira do mar

Ele disse

Agora que o povo por fim percebeu

Que nossas ofensas, foi pura armação

Também agradeço por sua atenção

E quem saiu cedo esta festa perdeu

Você, meu poeta, é tão bom quanto eu

E nossa missão é, o povo, alegrar

Enquanto houver gente nós vamos cantar

Pois nossa poesia faz bem para o povo

Na próxima quarta viremos de novo

Cantando galope na beira do mar

Edmilton Torres
Enviado por Edmilton Torres em 15/01/2018
Código do texto: T6226275
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