NO PEDESTAL DO PERDÃO
Não vou saber o futuro
Na palma do teu delírio
Nem vou pingar meu colírio
No teu olhar obscuro
Não vou ficar sobre o muro
Destas tuas indecisões
Nem abrirei os portões
Pra teu cortejo de medo
Mas te amo em segredo
Com gozo de mil corações.
Não serei um carrocel
No teu peito de recreio
E nem darei um passeio
No teu barco de papel
Não serei tela e pincel
Pra tuas tintas de cal
Nem vou ser o teu quintal
Pra que brinques a vontade
Mas és tu a Scherazade
Em meu conto de cristal.
Não cantarei na prisão
Da tua cruel gaiola
Nem pouso sobre a cola
Da palma da tua mão
Não me exibirei em vão
Nas folhas vãs do teu pinho
Não serei um passarinho
Sobre teu galho vulgar
No entanto és o pomar
Aonde faço meu ninho.
Não serei o teu Palmares
Pra teu Zumbi se esconder
Nem em ti vou escrever
Poemas de Castro Alves
Mas gravarei nos agaves
Os negreiros do teu pudor
Não sou teu navegador
Mas posso ser um bravio
Para ser no teu navio
Escravo do teu amor.
Não vou pra o teu carnaval
Para te ver mascarada
Nem minha cara pintada
Vai ser pro teu festival
Não sou teu armorial
Para brincar de vingança
Nem vou te dá a mudança
De lata para brilhante
Serei em ti um brincante
O teu caboclo de lança.
Não serei o teu engenho
Para moer tua gana
Nem cortarei tua cana
Pra esmagar no meu lenho
Não farei o teu desenho
Em papiro de museu
Nem serei teu coliseu
Pra tuas lutas sem graça
Mas sou o beijo na taça
Que tua boca bebeu.
Eu não sou a tua cruz
Pra esconder teus pecados
Nem honro os risos dados
Em baixo de teu capuz
Não erguerei tua truz
Sobre meu corpo cansado
Nem vou ser crucificado
No teu calvário insano
Mas voarei em arcano
No teu céu apaixonado.
Não vou botar meu roçado
Pra tu plantar tua ira
Nem vou ser a macambira
Pra amarrar teu passado
Não carregarei teu fardo
Nos meu ombros de paixão
Mas serei o teu verão
Na tarde alucinante
Lapidando teu brilhante
Com meus dedos de carvão.
Eu não serei um vulcão
Pra tuas larvas doídas
Nem as rochas derretidas
No calor da emoção
Eu vou ser a erupção
Na cratera alucinada
A terra sera queimada
Com brasas do meu amor
Treme o céu muda de cor
Quando eu gritar:*vem amada*
Eu não vou ser o que fui
Pra que tu abras em mim
A pétala do teu jasmim
Donde doce aroma flui
Sei que tu ainda possui
Uma névoa inquieta
Onde a noite aberta
Clareia a lua no vão
Iluminando o perdão
Que deste a teu poeta.