COVARDE PLANTÃO
Eu sou um bom vigilante
Que cumpre o seu horário
respeito bem o meu páreo
No serviço sou constante
Sei quanto é importante
Render bem antes da hora
Comigo não tem demora
Não falho nunca no trato
No tempo eu sou exato
Não deixo ninguém de fora.
Um vigilante antigo
Como eu tem um bocado
Que tá bem acostumado
A respeitar o amigo
Porem uma coisa digo
Tem uns que são diferente
Se faz amigo da gente
Mas na hora da bondade
É traiçoeiro e covarde
Com cara de inocente.
Quem conhece a profissão
Do vigilante valente
Repare bem e atente
E veja quem tem razão
Cada um tem seu plantão
É doze por trinta e seis
É uma jornada por vez
Que cada plantão carrega
Vejam o que o colega
Uma certa feita me fez.
Outro dia no meu posto
Apareceu um novato
Que parecia de fato
Ser um sujeito disposto
Ele trazia no rosto
Um ar de ser um amigo
Fez amizade comigo
Como se fosse um irmão
E não faltava um plantão
Nem que fosse por castigo.
Mostrava ser bem decente
Se portava com firmeza
Dizia que na empresa
Era chapa do gerente
E que trazia na mente
Ser um inspetor brilhante
Alerta e confiante
Pra se tornar um bom feitor
Prestativo e protetor
Para todo vigilante.
Eu já tinha combinado
Com minha esposa Olga
No dia da minha folga
Irmos comer um guisado
Na casa do meu cunhado
Que mora num balneário
Era seu aniversário
Que ia se comemorar
Guando eu escuto tocar
O celular no armário.
Eu atendi num instante
Ouvi uma voz chorando
Me dizendo soluçando
Era o tal vigilante
"Irineu, é importante
Escute minha ligação
Você pra mim é um irmão
Um colega de verdade
Me faça a caridade
De vir cobrir o meu plantão"
É que minha mãezinha
Foi pra os braços do Senhor
Hoje eu perdi seu amor
Na cama de manhãzinha
Fiquei sem minha rainha
O meu mas puro brilhante
Por isso assim suplicante
Lhe peço do meu coração
Irineu meu caro irmão
Ajude esse vigilante.
Depois eu cubro o plantão
Você fique sossegado
Vou deixar bem preparado
O velório e o caixão
Depois dessa situação
Mil reais é a quantia
Que pago por esse dia
Que eu sei é sua folga
Diga para dona Olga
Que tem minha garantia.
Mulher pensa diferente
Do jeito que o homem pensa
E por essa recompensa
Cunhado não é parente
Olga disse de repente:
"Irineu quanta besteira,
Passar a folga inteira
Mastigando um guisado
Vamos pegar o trocado
E trocar de geladeira"
Eu disse tá combinado
Eu vou cobrir esse plantão
Alem do mais o coração
Do colega tá quebrado
Perder a mãe é danado
Sei porque já foi a minha
Me senti no fim da linha
Sei bem a dor que eu passei
Porem nunca acostumei
Tá longe da mãe que tinha.
Fui acudir o colega
Que fingia tá chorando
Disse: já estou chegando
Minha vontade não nega
Que o que você carrega
No peito amargurado
Seja por Deus consolado
Nesse momento horrendo
Amigo fique sabendo
O seu plantão tá tirado.
Ele me deu um abraço
Igual ao do tamanduá
E disse:"guando eu chegar lá
Sera o fim do cansaço
Se hoje passo o que passo
É pra marcar o divisor
Quando eu for supervisor
Com certeza eu te digo
Vou me lembrar do amigo
Que me prestou esse favor"
Quanto a quantia dita
Lhe pago com o salário
Por ter ido solidário
Nessa hora tão aflita
Meu coração se agita
Mas não fujo dos ideais
Vou lhe pagar os mil reais
Dê cá um aperto de mão."
Eu assumi o seu plantão
E não lhe vi nunca mais.
Fui bater lá na empresa
Pra contar ao meu gerente
Mas o que vi pela frente
Só foi raiva e tristeza
Para a minha surpresa
Estava lá bem sentado
O vigilante safado
Que de mim desapareceu
Ao vê-lo o corpo tremeu
E ele sem argumentos
Gritou para os quatros ventos:
"Como vai caro Irineu"
Eu fiquei cego e mudo
E disse ao tal bandido,
Vigilante atrevido
Da conversa de veludo
Tirei seu plantão e tudo
E você só me enganou
Foi embora e me deixou
Com a cara de pateta
Agora é hora certa
De te mostrar quem eu sou.
Nisso o gerente chegou
E evitou a desgraça
O tal já meio sem graça
Num instante assim falou:
"Não entendo o que passou
Na cabeça do colega
E por que ele carrega
Mágoa e dor no coração
Se eu tirei seu plantão
Porque ele assim me pega?
O gerente me conhece
Sou um vigilante antigo
Nunca briguei com amigo
E ninguém me aborrece
Mas esse aí merece
Ter uma advertência
Abusou da inocência
De mim e da minha Olga
Fez eu perder minha folga
Me roubou a paciência.
Eu vivo do meu trabalho
E do meu suor honesto
No serviço que eu presto
Sou pontual e não falho
Não sou de fazer retalho
E honro com o meu dito.
Ele me disse aflito
Perto do sujeito chato
"Pra isso ser um fato
É preciso está escrito"
"Eu sou um gerente justo
E não fui comunicado
Se não está anotado
Não posso cobrar o custo
Vamos acabar com o susto
Porque se não me irrito
Irineu esse seu dito
Não me traz a coerência
Se não tá na ocorrência
Fica o dito por não dito"
Nesse momento escutei
A fala do traiçoeiro
Que dizia:"companheiro,
A onde foi que eu errei
Só de uma coisa eu sei
Foi grande a decepção
Lhe tratei como um irmão
E você por paga mente
Dizendo pra o gerente
Que eu lhe devo um plantão"
O caso tava perdido
Eu voltei injuriado
Cheguei em casa calado
Me lembrando do bandido
Eu nunca fui desmentido
Na presença de seu ninguém
Pra vir um corno do alem
Manchar o meu juramento
Pois quem faz um faz um cento
E não vale nem o que tem.
Depois do acontecido
Nunca mas vi o gaiato
O tal colega ingrato
Tinha desaparecido
Pensei que tinha morrido
Com o seu próprio veneno
Eu pedi ao Nazareno
Pra esquecer o passado
Em que eu fui alvejado
Pelo dardo obsceno.
Porem a dor de barriga
Não dá somente uma vez
Quem fica dela fregues
Vai morrer fazendo figa
Depois que vem a intriga
Tudo pode acontecer
O morto volta a viver
E o vivo é quem padece
Vejam só o que acontece
A quem paga sem dever.
Em um posto na Aurora
Eu tava bem sossegado
Pois já havia chegado
A hora d'eu ir embora
Quando ouvi lá de fora
Alguém gritando; "espera"
Quando avistei quem era
Quase morro num instante
Era o tal vigilante
Com cara de besta fera.
Chegou em frente ao portão
Com riso de falsidade:
"Irineu mas que saudade
Quanto tempo caro irmão
Hoje assumo o plantão
Vou trabalhar neste posto"
Eu olhei para o seu rosto
Senti ânsias agudas
Eu tava vendo um "Judas"
Um satanás de encosto.
Eu disse: tu não assume
Nem o posto nem o plantão
Hoje te dou uma lição
Quem sabe tu se aprume
Tu é peixe sem cardume
Que vai ser frito na bala.
O peste perdeu a fala
Ficou da cor de farinha
Juntou os troços que tinha
E sumiu por uma vala.
Assim conto esta feita
Que houve na minha vida
A minha Olga querida
Não lembra bem satisfeita
Pois ela sempre rejeita
Recordar esse passado
Hoje estou aposentado
Mas se ouço o nome meu
Gritar no portão Irineu...
atendo desconfiado.