A Visita do Gonzagão
O Gonzagão, certo dia,
Resolveu descer à terra
Pra ver como é que tava
O seu Nordeste querido,
Se o povo ainda o amava
Ou se já tinha esquecido.
A sua primeira impressão
É que nada tinha mudado
O sertanejo com fome,
E miséria pra todo lado.
O gado todo magrinho
E os açude esturricado.
Gonzagão olhou pra cima,
Tirou seu chapéu de couro
E gemeu numa breve oração:
Oh, Deus perdoa os coitado
Que fazem das tripa coração
E vivem tão mal tratado!
Será que o Senhor se zangou
Mesmo, de uma vez por todas
E nem enchente mandou mais?
Só a seca braba escaldante
Que consome todos vegetais
E faz o homem andar errante?
Gonzagão olhou a terra ardendo
E vendo como é triste a erosão,
Pediu pra chuva cair de novo
Cair com força e sem compaixão,
Enchendo os rios, alegrando o povo
Cobrindo de verde todo o sertão.
O juazeiro que está sempre verde,
Verde como o pé de mandacaru
São os únicos que mantêm a cor.
E destoando da paisagem da seca
Tem o xique-xique de pé de cerca
Que ainda conserva o seu verdor.
Cadê a asa branca, tão coitada?
Nem notícia se tem mais, sumiu
Não pode bater asas do sertão
Nem ninguém nunca mais viu
Acho que ela é uma outra vítima
Que da caatinga se extinguiu.
Gonzagão tinha dó do assum preto
Por causa dos seus olhos furados.
Agora sente pena de quem enxerga
Com tanta miséria, melhor nem ver.
Do assum preto ficou foi com inveja
E não se arrependeu de morrer.
Saindo decepcionado do sertão
Gonzagão foi no rumo da cidade.
Por lá foi recebido com euforia
E logo lhe contaram as novidade
Dos programa que o pobre recebia
E dos político que fizeram a bondade.
Falaram: Seu Luiz tem fome Zero,
Tem bolsa renda, tem bolsa escola,
Agricultura familiar e seguro safra
O Gonzagão desconfiado: Isso não!
Eu já falei que esmola pro homem são
Matava de vergonha ou viciava o cidadão.
Isso só pode ser plano eleitoreiro
Dá com uma mão, tira com a outra.
Tira de onde não bota, um dia falta,
E assim abre a porta pra corrupção.
Como sempre houve gente incauta
O inferno está cheio de boa intenção.
Aí o povo entendeu a fala do profeta.
Deve ser por isso que tem o lava-jato
E a situação deles tá assim tão preta.
Comiam e cuspiam no mesmo prato,
Mamavam e não cuidavam das teta.
E agora vão pagar pelos maus trato.
Mudando de assunto, falou Gonzagão
E aquela velha história do Velho Chico,
Que para o Nordeste seria a solução,
E também era plataforma de político
Como é que está agora essa situação?
É triste, disseram, o Velho está crítico.
Não fizeram a transposição na fartura,
Quando era tão fértil o Velho Chico
Que a ideia envelheceu, ficou madura.
O Rio definhou, até ficar tão raquítico
Sobrevivendo apenas por sua bravura
Chega a embocadura como paralítico.
Meus irmãos, me dê notícias dos professores
Que na apologia eu comparei com o jumento
Porque, quem trabalha de graça é professor.
Continua do mesmo jeito, seu Luiz, lamento,
Só que o jumento é mais feliz no seu labor,
Que o professor esperando por aumento.
O jumento é bem pago e, não lhe falta nada
Nas costas, está geralmente sobrecarregado
E não se reclama de nada, nem reivindica...
Meu filho, cê tá falando mesmo de quem?
Claro que é do jumento, ô seu Luiz, se liga!
O professor é respeitado, ele é alguém.
Gonzagão falou, profundissimamente triste:
Sabe por que o Brasil não valoriza professor?
Porque tem muita gente que já nasce sabido
E aprende logo, na vida, o que tem real valor
Quem ensina e quem trabalha não é servido,
Quem tem grana é prefeito, juiz e governador.
É, seu Luiz, de tanto o professor ser desvalorizado
E de não receber atenção das autoridade
O aluno também deixou de lhe respeitar.
Agora se comete todo tipo de atrocidade
Não sei até quando o professor vai aguentar
Se não acabar logo com essa enfermidade.
O Gonzagão disse afobado: já chega!
Dessas desgraça eu já estou é cheio!
Ninguém não me conta nada de bom!
Ia perguntar uma coisa mas tenho receio
O baião ainda toca, alguém ouve meu som?
Podem falar, não precisam fazer rodeio.
Seu Luiz, o senhor nunca será esquecido.
Vira e mexe alguém regrava o seu som.
O senhor nunca deixou de ser nosso rei,
O baião ainda hoje é danado de bom.
O senhor me pediu pra falar, eu falei,
Agora, o que mudou mesmo foi o tom.
O senhor falava de seca, chuva e sertão
De fartura, farinhada e sala de reboco,
De mulher séria e homem trabalhador.
Seu Luiz, hoje caboco só fala ostentação.
Malota de saco, cigarro de paia? Faz favor!
Nem fale, só vai servir é de mangação.
Só pro senhor saber como a coisa anda,
No seu tempo, cabeludo tinha vez não,
Agora tem vez, é quem na música manda.
Não precisa ser cabra macho, veja então
Um desses cabeludo hoje é que comanda,
O seu nome de artista é Wesley Safadão!
Gonzagão disse: danou-se, vou-me embora!
Vou tomar conta de outras plantação
E fazer de conta que aqui nunca mais vim
E quando me perguntarem sobre o sertão
Vou continuar dizendo tim-tim por tim-tim
No meu Ceará, no meu Ceará tem disso não!
Olhou pro céu e viu como ele estava lindo.
Se despediu e lembrou das viaje de trem.
Estava rindo e chorando e chorando e rindo,
Lembrando do verde dos óio que a rosinha tem.
E num balão de São João foi subindo e subindo
Com o sabiá, com a rolinha e com o vem-vem!
Tarcísio Rocha