Perguntas ao passarinho
Perguntei ao passarinho
O porquê do seu cantar
Já que vive tão sozinho
Sem ninguém para encantar
Ele respondeu que o vinho
Só melhora no lagar.
Perguntei ao operário
Qual a sua profissão
Ele disse que o salário
Faz a sua direção
E no seu livro diário
Nunca há compensação.
Cada coisa que eu doava
Vinha de volta pra mim
Cada uma que voltava
Eu a descrevia assim
Essa é a que faltava
Mas agora está do fim.
Percebi em um momento
Que o sol emoldurava
Uma parte como o vento
Quase nunca se afastava
Ia lá onde o tormento
Com a dor digladiava.
Eu tentei aproximar
Dei um passo no infinito
Era longo o caminhar
Não havia percebido
Mas o sol veio ajudar
E eu fiz o escolhido.
Escrevi um testamento
Numa folha de capim
Que busquei no firmamento
Num lugar que não tem fim
Completei meu juramento
De jamais fugir de mim.
Anotei no testamento
O que tinha pra doar
Incluí o alimento
Que havia de plantar
Fiz um jarro de cimento
Para ter onde guardar.
Fiz do meu tempo presente
Um cordel de ilusão
Encontrei ateu e crente
Numa mesma oração
Cada um pra sua gente
Prometendo salvação.
Anotei no meu passado
O que eu tinha no futuro
Percebi que o passo dado
Era no caminho escuro
Mas o que a mim foi dado
Vou pagar até com juro.
Fiz o meu redemoinho
Esperando o resultado
Espantei o passarinho
Que me disse ter cantado
Mas de tanto andar sozinho
Não chegou ao outro lado.
Fiz assim um paralelo
Sobre o bom e o ruim
Encontrei ouro amarelo
Em um banco do jardim
Flor com cor de caramelo
Foi o que sobrou pra mim.