Mãe solteria.
Esta é uma pequena homenagem que presto às inúmeras mães que levam ao fardo de serem solteiras, a todas o meu respeito.
Sou mulher e mãe solteira
Sou por isso mal falada
Não a única ou primeira
Mas tenho a vida marcada
Mas não sou uma rameira
Mereço ser respeitada.
Minha sorte foi meu filho
Cujo pai não conheceu
Pôs na minha vida um brilho
À mãe nunca entristeceu
Não virou um andarilho
E a mim obedeceu.
Fui mulher de um carreteiro
Conheci muitas cidades
Cozinhei feijão tropeiro
Para as novas amizades
Dava um prato por inteiro
Apesar das falsidades.
Viajei terras sem fim
Cozinhando a céu aberto
Enfrentei tempo ruim
Pra chegar ao lugar certo
Viajar era pra mim
O que a água é pro deserto.
Numa curva da estrada
A carreta capotou
Toda a carga esparramada
Que o sem terra saqueou
Tive a costela quebrada
Que o tempo consertou.
Meu marido ali morreu
Ficou preso na ferragem
E ninguém compreendeu
Pelo risco da frenagem
Como tudo aconteceu
Pensaram em sabotagem.
Na presença da polícia
Declarei o que sabia
Percebi haver malícia
Nas perguntas que ouvia
Mas achava que a notícia
Ao meu pai não chegaria.
Fui depois interrogada
Na presença do juiz
Mesmo sem ter feito nada
Perguntaram o que eu fiz
E depois de liberada
Me chamaram meretriz.
O patrão sequer ouviu
Toda a minha explicação
Disse que nunca me viu
Que eu tivera uma lição
Que na vida ele subiu
Dirigindo caminhão.
Muito tempo se passou
Sem eu ver uma carreta
Meu marido descansou
Mas a coisa ficou preta
Sei que ele me amou
Mesmo fazendo mutreta.
Fui assim abandonada
Sem direito ao meu viver
Grávida e não tendo nada
Difícil compreender
A mulher desamparada
Querendo o seu filho ter.
Recusei muitos encontros
Recusei amor bandido
Recusei amores prontos
Não quis amor proibido
Mas falhei em outros pontos
Por não ter correspondido.
Um milagre em minha vida
Veio com o nascimento
De um filho após a ida
Do seu pai pro solo bento
Assim mesmo nessa lida
O que fiz foi a contento.
Minha mãe me deu conselho
Mas meu pai me castigou
Colocou-me ante o espelho
Onde outrora me olhou
Disse que aquele fedelho
Sua honra enodoou.
Fiquei tão amargurada
Que fugi para não ver
Meu pai de cara amarrada
Minha mãe muito sofrer
Hoje estou bem descansada
Vendo o meu filho viver.
Sei que devo perdoar
O meu pai por não querer
Ter um neto pra tratar
E pensar que eu ia ter
Outros filhos pra zelar
E numa zona viver.
Apesar de muito pobre
Tive um filho do amor
Meu marido a terra cobre
Mas morreu no seu labor
Sei que nunca serei nobre
Mas conheço o meu valor.
Depois de muitos fracassos
Fui também compreendida
Meu filho foi os meus braços
Não me deixou esquecida
Não negou o seu abraço
Na hora da despedida.
Se amar fosse pecado
Deus jamais nos amaria
Pois existe o outro lado
Que comanda a covardia
Hoje revendo o passado
Posso ver Virgem Maria.
Só quem sabe o que é amar
Compreende a mãe solteira
Se ela não quis se casar
Ficou só a vida inteira
Na verdade foi pra dar
Para o filho uma carreira.
Toda mãe merece ter
Um pouco de toda glória
Dela jamais esquecer
Mesmo gozando a vitória
Pois o que acontecer
Ela é parte da história