A ambição
Sou a fonte do desejo
O meu nome é ambição
Quero ter tudo o que eu vejo
Isso falo de antemão
Meu futuro eu já prevejo
Vai ser sempre este senão.
Não dou paz a quem me tem
Não dou trégua à paciência
Nem a morte me detém
Dessa sou incoerência
Mesmo à luz que a mim vem
Nego ver a consequência.
Tenho o nome combatido
Mas pra muitos sou virtude
Para quem está caído
Posso às vezes dar saúde
E pra quem vive escondido
Posso ser o alaúde.
Também sou ignorância
Sobre as coisas do além
Só na terra sou constância
Nessa tudo me convém
Mesmo tendo em abundância
Digo ser quem nada tem.
Peço ajuda ao governante
Do qual ando sempre atrás
Vou falando radiante
Pra ganhar um pouco mais
Sou sempre aquela falante
Que na vida pouco faz.
Sou mais forte que a morte
Mesmo a essa sobrevivo
Não importa a minha sorte
Não desejo ter alívio
E andando ao sul e ao norte
Sou assim mais rediviva.
Sou a fonte que não seca
Ao contrário, sempre cresço,
Gosto quando encontro um jeca
Se ganhei, isso eu mereço,
Se jamais usei a beca
Para mim existe um preço.
Até lá no cemitério
Sou presente em ornamentos
Sem haver muito critério
Distribuo paramentos
Mesmo eu sendo um mistério
Há por mim grandes lamentos.
Pra mostrar o meu poder
Me escondo em fantasia
Tento assim me esconder
Exercendo a tirania
Essa força de querer
Desconhece simpatia.
Todo homem me conhece
Sou presente no estudo
Minha força reconhece
O querer sempre ter tudo
Meu poder não esmaece
Nem na roupa de veludo.
Posso aqui então dizer
Que sou sempre arrogante
Pouco importa o maldizer
Dessa pobre navegante
Que não tem seu afazer
Não trabalha um só instante.
Tenho agora de partir
Pelo meu caminho escuro
Não sabendo aonde ir
Por ter sido alguém impuro
Mas, porém, vou repartir
O que Deus me deu com juro.
O que Deus me deu é bom;
Muito mais do que mereço;
É a paz que vem do dom;
De saber porque padeço;
Por não ter ouvido o som;
Sem o qual eu nunca cresço.
Todo o meu palavrear;
É refeito a todo instante;
Más palavras sei usar;
Na miséria sou constante;
Entretanto posso estar;
Do honesto na estante.
Sou também caixa maldosa;
Muitas vezes fiz o mal;
Quase sempre ardilosa;
Reconheço ser fatal;
Também muito orgulhosa;
Assim nego ser mortal.
Sou assim má testemunha;
Nada tenho pra dizer;
Se alguém roeu a unha;
Esquecendo o que dizer;
Disso tudo eu sou alcunha;
Ninguém pode desdizer.