O dia em que a onça jogou bola

I

Domingo de futebol

Arquibancada lotada

Torcida uniformizada

Tentando escapar do sol

O juiz um espanhol

Aqui naturalizado

Esperava no gramado

Pelo time visitante

Quando ouviu naquele instante

Um grito desesperado

II

Olhou pra arquibancada

De onde vinha o berreiro

Mas antes viu o goleiro

Correndo em disparada

Com uma onça pintada

Correndo atrás do infeliz

Tava branco como giz

Dando voltas no gramado

Depois embicou pro lado

Do coitado do juiz

III

O juiz correu aflito

E machucou um joelho

Perdeu o cartão vermelho

Engasgou-se com o apito

Sem conseguir dar um grito

Quando viu que a onça que vinha

Correndo na mesma linha

Numa atitude imprudente

Deu um pulo de repente

Nas costas do bandeirinha

IV

O bandeira tropeçou

Pois tava desprevenido

Caiu no chão espremido

Com o juiz se enroscou

A onça se aproximou

Mas na hora de atacar

A polícia militar

Jogou sobre o animal

Bomba de efeito moral

E o bicho pôs-se a espirrar

V

Com a trégua inesperada

O bandeira com assombro

Botou o juiz no ombro

Correu pra arquibancada

A porta tava emperrada

Ele virou-se ligeiro

Deu de cara com o goleiro

Que vinha correndo atrás

Espirrando com o gás

No meio do fumaceiro

VI

Com o portão emperrado

Não conseguiram sair

E sem parar de tossir

Todo mundo apavorado

Subiram no alambrado

Pra escapar da pintada

No meio da empreitada

O alambrado caiu

Foi aí que a onça viu

E retomou a caçada

VII

Foi então que o treinador

Da equipe visitante

Teve a ideia brilhante

De mandar um jogador

Pra servir de domador

Daquele bicho feroz

Com uma vara de aveloz

Ele foi para o gramado

E só não foi devorado

Porque era muito veloz

VIII

Pé na bunda, pé no chão

Com a onça na cupira

Parecia até mentira

Só se ouvindo a narração

No auge da empolgação

O locutor se esgoelando

A peleja ia narrando

Nas ondas da FM

Tão nervoso que a voz treme

Narrava quase chorando

IX

A sorte foi que um bombeiro

Consertou o alambrado

O juiz foi resgatado

O “bandeira” e o goleiro

Só faltava o artilheiro

Da equipe visitante

Que apesar de ser volante

Era o seu goleador

Um exímio driblador

E de uma calma irritante

X

Com dez voltas no gramado

A onça já tava fraca

Levou um “drible da vaca”

Ficou de quarto arriado

O volante fez gingado

Com a bola de pé em pé

Parecia até Pelé

Cada drible que ele dava

A torcida delirava

Vibrando e gritando - Oléé!

XI

O locutor delirando

Narrava todos os fatos

E na cidade os boatos

Logo foram se espalhando

A multidão foi chegando

Lotando a arquibancada

Pra ver a onça pintada

Levando drible e lençol

E jogando futebol

Como se fosse treinada

XII

Ele fez embaixadinha

Deu chapéu e pedalada

Agora a onça pintada

Parecia uma gatinha

Ficou mansinha, mansinha

E se deitou no gramado

O jogador com cuidado

Se aproximou com cautela

Alisou o pelo dela

E se sentou ao seu lado

XIII

A essa altura a torcida

Derrubou o alambrado

Houve invasão do gramado

Pra ver a onça vencida

A fera surpreendida

Com aquela confusão

Rosnou para a multidão

Ninguém sabe como foi

Que acabou o “cu de boi”

Da galera em aflição

XIV

Essa estória é verdadeira

Eu assisti no Fantástico

Um episódio bombástico

Que ocorreu em Pesqueira

Fui lá na segunda feira

Acompanhando um perito

Passei no “Joaquim de Brito”

O palco do escarcéu

Ainda achei o troféu

O cartão e o apito

A seguir uma interação do poeta Stelo Queiroga, que muito me envaideceu:

Um cordel interessante

Bastante movimentado

Eu corri pra todo lado

No teu ritmo alucinante

Lamento não obstante

Faltar somente o Cartola

Metido a Dono da Bola

De frente para o perigo

Da onça eu seria amigo

E ela traçando o gabola

Stelo Queiroga

Edmilton Torres
Enviado por Edmilton Torres em 01/06/2015
Reeditado em 02/06/2015
Código do texto: T5262990
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