Prece da despedida.

Fracassei no meu desejo

De fazer somente o bem

Às vezes o mau protejo

E sou mau para alguém

Não fazendo o que almejo

Faço mal pra mim também.

Minhas forças se acabaram

No esforço pra viver

Elas me abandonaram

Sem nada eu poder fazer

Poucas delas me sobraram

Isso eu pude perceber.

Minha pátria me traiu

A família não me quer

Doença me consumiu

Vivo com o que tiver

Minha casa sucumbiu

Não restou uma colher.

Eu fiz uma penitência

Pra tentar sobreviver

Construí com paciência

Um lugar para viver

Mas sofri interferência

E aumentou o meu sofrer.

Na calçada de cimento

Eu deitei algumas vezes

Sem roupa e sem alimento

Caminhei durante meses

Buscando o conhecimento

Que instrui os camponeses.

Fui devoto e pregador

Assisti meu funeral

Fui cliente do doutor

Que tirou meu cabedal

Hoje ele é o senhor

Que cultiva a flor do mal.

Fui severo na partida

De quem eu via sofrendo

Eu dizia que da vida

Ninguém parte me devendo

Minha guerra está perdida

Isso hoje eu compreendo.

Fui escravo do dinheiro

Senhor da hipocrisia

A chegar era o primeiro

Pra fazer idolatria

Pra sair o derradeiro

Pra saber quanto teria.

Eu contava os meus trocados

Varias vezes todo dia

Inventava os maus pecados

Pra falar na homilia

Eram todos inventados

Pra fazer estripulia.

Eu vendia água benta

Vendia o perdão de Deus

Na igreja barulhenta

Eu servia aos fariseus

Pra apagar minha tormenta

Perdoava até ateus.

Fui mau servo e mau Cristão

Fui devoto do prazer

Abracei a solidão

Como esposa pra viver

Trago em mim a frustração

De quem não sabe perder.

Meu troféu de vencedor

Foi a tumba de granito

Que paguei ao vendedor

Para anunciar a grito

Que eu era o comprador

E ante Deus era bendito.

Uma chave de garagem

Eu levei pro cemitério

Foi o fim de uma viagem

Carregada de mistério

Aprendi que a vassalagem

Não é para o homem sério.

Fui viver noutra cidade

Onde um dia visitei

Uma dama em tenra idade

Pela qual me apaixonei

Busquei a felicidade

Porem não a encontrei.

Essa moça era doente

Dependia de remédio

Sua morte era iminente

Apesar do meu assédio

Eu fiquei ali presente

Mas eu percebi seu tédio.

Vi o seu olhar vazio

Vindo em minha direção

Senti seu sorriso frio

Sem qualquer motivação

Veio então um assovio

Convidando à oração.

Uma prece eu recitei

Sem saber pra quem seria

De repente eu me lembrei

Que a fizera em outro dia

Eu então acompanhei

A mulher que eu queria.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 23/08/2014
Código do texto: T4933613
Classificação de conteúdo: seguro