O presente cordel é fruto de mais uma parceria entre eu (Edmilton Torres) e os poetas recantistas Ansilgus e Edilson Biol. Desta vez, o mote, sugerido por Ansilgus, trata de um tema bastante comentado ultimamente; a seca no nordeste. Como os parceiros não têm conhecimento dos versos escritos pelos outros, é interessante observar como as abordagens são diferentes, embora o tema seja o mesmo. Apesar da tristeza do tema, penso que a obra ficou muito boa. Espero que apreciem e, se desejarem, podem interagir à vontade respeitando as regras: Oitavas de sete sílabas poéticas com rimas no formato ABABCDCD.

Mote: Como já choveu na Mata/ Vamos rezar pro Sertão

Glosas compostas por Edmilton Torres


I
Todos sabem que o nordeste
Convive com seca há anos
Mas a nação não investe
Pra minimizar os danos
Que ao nosso povo maltrata
Sem dó e sem compaixão
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            II
Se houvessem mais açudes
Encheriam no inverno
Mas faltam as atitudes
Nas instâncias do governo
O que vemos é bravata
Só promessa e enganação
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            III
Esta seca se repete
De trinta em trinta anos
Eu tenho cinquenta e sete
Carregando desenganos
Que um dia se combata
As causas dessa aflição
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            IV
Só resta a Deus apelar
Pois o governo é omisso
Político é bom no falar
Mas é ruim no compromisso
Um bando de burocrata
Sem preparo e sem visão
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão 
 
            V
Até a palma morreu
Por causa da cochonilha
O gado enfraqueceu
Não escapa nem novilha
Sem ajuda imediata
Vai morrer de inanição
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            VI
O Sertão está perdendo
Quase todo o seu rebanho
Pois está acontecendo
Um descaso sem tamanho
Quem acompanha constata
Como é grande a omissão
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            VII
O agricultor é forte
Mas não resiste e chora
Entregue à própria sorte
Ajuda de Deus implora
Com os olhos em cascata
Vê morrer a plantação
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            VIII
Devendo ao banco e com fome
O sertanejo padece
O desespero o consome
Quando o banqueiro aparece
Pra cobrar a duplicata
Com juros e correção
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão

            IX
Quando um dia a chuva vir
O povo vai semear
Voltaremos a sorrir
E a Deus glorificar
Pois nossa fé é inata
No poder da oração
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            X
A chuva tão esperada
Deixa o sertão comovido
Pois o som da trovoada
É música para o ouvido
É como uma serenata
O ribombar do trovão
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão
 
            XI
Ver um açude sangrando
Ou um riacho correndo
U’a semente germinando
Um pé de milho crescendo
A emoção arrebata
Nosso humilde coração
Como já choveu na Mata
Vamos rezar pro Sertão

 
Edmilton Torres


Glosas compostas por Edilson Biol



O nordeste brasileiro

É imenso e variado

Terra de um povo faceiro

Mas que sofre um bocado

Pela seca em longa data

E a falta de compaixão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

Nem todos têm tanta sorte

De morar no litoral

Onde a chuva vem mais forte

E é maior o capital.

Lá quem mora é magnata

Coisa de rico e patrão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

O sertanejo trabalha

Planta feijão e não vinga

Cada dia uma batalha

Capinando a caatinga

Planta mandioca e batata

E espera a chuva no chão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

Veja só, que bom seria.

Ver o nordeste irrigado

Mas já virou utopia

Ver o Chico desviado

As máquinas tão em sucata

Nada de transposição

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

O que me deixa zangado

É ver tanta indiferença

Por parte do nosso Estado

Que nesse povo não pensa.

O Brasil é democrata

Mas vigora a opressão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

A chuva que vem do céu

Ninguém pode controlar

Mas deixar o povo ao léu

Não dá para se aceitar

Só dão valor para a nata

E o pobre fica na mão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

Só é lembrado o nortista

Quando vem nova campanha

Mostram uma grande lista

Os malditos sem vergonha

Registram até em ata

Obras da sua gestão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

Eu sonho com a chuva fina

Caindo no meu telhado

Como na festa junina

Sorrisos de lado a lado

Aquele céu cor de prata

Cheio de nuvem e trovão

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

Nós vemos a presidente

Viajando mundo a fora

Toda feliz, sorridente.

Mas o nordeste ignora

Esquece que essa mamata

Depende da reeleição

Como já choveu na mata

Vamos rezar pro sertão.

 

O meu cordel é modesto

Sou um poeta amador

Não vá me fazer protesto

Pois faço tudo com amor

Se eu fosse um psicopata

Sujaria a minha mão

Mandava “os de gravata”

Pra setes palmos do chão

Edilson Biol


Glosas compostas por Ansilgus




A lavoura improdutiva

Morreu toda, sim senhor,

Foi uma perda coletiva

Para todo agricultor

Mas no sul é só mamata

Ninguém perde nada não

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

No semiárido também

A seca está devastando

Não vai escapar ninguém

A terra está se quebrando

O gado morre em cascata

Faltando água e ração

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Não tem milho nem feijão

Algodão já nem se fala

Coitado do cidadão

Que perde o gado e se cala

Parece até acrobata

Sofrendo de inanição

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

As cenas que pude ver

Na minha televisão

Causou traumas pode crer

O gado seco no chão

Meu Deus que vida ingrata

Parece até maldição

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Enquanto isso seu moço

A gastança envenenada

Cada dia aumenta o fosso

Daqui para a Esplanada

Onde só existe magnata

A afundar a nação

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Não se vê nada concreto

Salvo as bolsas esmolas

Que são pratos prediletos

Valem mais do que escolas

Onde o país democrata?

Só em tempo de eleição...

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Mas meu Deus com tanta água

Aqui perto bem no norte

Por que causar tanta mágoa

De tristeza e de morte

No país do burocrata

No Nordeste meu irmão

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Mas o nosso São Francisco

Tem água até demais

Pra fornecer ao aprisco

E irrigar tudo em paz

No país aristocrata

Onde só manda ladrão

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Não tem palma nem capim

Nem mesmo barba de bode

A vida ficou ruim

Desse jeito não se pode

Eu como cardiopata

E com dor no coração

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

 

Onde estão Dilma e Lula

Que só sabem prometer

Só gostam de quem bajula

Matuto vai derreter

Os grandes só de gravata

As obras com lentidão

COMO JÁ CHOVEU NA MATA

VAMOS REZAR PRO SERTÃO

Ansilgus


Interações recebidas de outros poetas:

Glosas de Tiago Duarte

Gostei muito do trabalho
E do tema oportuno
Sou poeta quebra galho
Por isso eu não me uno
Com vocês que são a nata
Dos cordeis desse torrão
Como já choveu na Mata
Vamos orar pro Sertão

Tiago Duarte

Edmilton Torres, Edilson Biol e Ansilgus
Enviado por Edmilton Torres em 27/04/2013
Reeditado em 29/04/2013
Código do texto: T4262746
Classificação de conteúdo: seguro
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