DEFESA DI UM CAMPONEIS

Seu dotô nasci na roça

Lá vivi e me criei

Na mi’a humilde paioça

Derde criança morei

Lá passei todo os meu dia

E lá criei mi’a famia

Cum suó da mi’a labuta

E li garanto, Dotô

Ninguém nunca me ajudô

Sobrevivi de mi’a luta.

Todo dia de madrugada

Tivesse chuveno ô não

Na mi’a luta pesada

Eu tava de prontidão

E lá no finá do dia

Vortava cum aligria

Pra Chiquinha, mi’a muié

E Cum a famia eu jantava

Dispois na sala eu sentava

Para tomá um café.

Inté vivia satisfeito

Cum a vida qui eu levava

Para o trabaio eu ti’a peito

Cum nada eu mim preocupava

Ti’a meu mi e meu feijão

Comida fartava não

Purisso eu era filiz

Vivê cum mi’a famia

Era mi’a grande aligria

E foi o qui sempre quis.

Mermo sem tê istudado

Mandei meus fi istudá

Mermo morto de cansado

Num parei de trabaiá

Trabaiava noite e dia

Inté já dei agunia

Cum isforço da labuta

Pois sô um homi da terra

Cuma um sordado na guerra

Nunca disisti da luta.

Os meu fi fôro crecendo

E a vida foi miorano

Parece inté que tô vendo

Os meu minino chegano

Todo filiz da iscola

Dispois ia jogá bola

Sua única diversão

Tomava banho i jantava

Dispois na sala sentava

Pra assitir televisão.

Inté qui num certo dia

Já istava iscuriceno

Maria, mi’a sigunda fia,

Tava na cunzia fazeno

Um café pra nóis tumá

Quando uvi ela gritá

“Papai! Papai! Mãe! Socorro!

Assim qui cheguei na porta

Vi mi’a minina morta

Seu Dotô quase qui morro.

Miti a mão na pexêra

E avancei pru ladrão

Ele num me deu bobêra

E já di arma na mão

Feiz jeito de dispará

Mais ante dele apertá

A faca nele infiei

Só vi o cabra gritano

E no chão foi se deitano

Cuma fiz isso num sei.

Logo chegô os vizin

A poliça arguém chamô

Viero in cima de mim

Me trussero pru Dotô

Feito um bicho indiabrado

Cheguei aqui argemado

Me batero feito um cão

Só pruquê eu mim vinguei

E cum justiça matei

Um criminoso, um ladrão.

Tô nessa Delegacia

Isperano jugamento

Já faiz num sei quantos dia

Já tô qui num agüento

Já num mim sinto mais homi

A famia passano fomi

Intão pregunto a você

Fale cum sinceridade

Num são as auturidade

Qui tem qui mim defendê?

Por todo santo do céu

Eu digo para o Dotô

Esse era o seu papel

E eu fiz pelo Siô

Pois eu sô um cidadão

Quem tem qui pegá ladrão

É o Siô, Delegado!

Pois ao Siô vô dizê

Quem tem qui me defendê

É a Lei, é o Estado.

Agora vô sê jugado

Se foi a mi’a aligria

Posso inté sê condenado

Por defendê mi’a famia

I aí tá o Siô

Cum essa pinta de Dotô

Cum ar de dispreocupado

E os bandido assartano

Robano gente, humilhano

I o Siô aí parado.

Mais quando eu mim sortá

E vortá pra mi’a famia

Vô tentar recuperá

Mi’a paiz, mi’a aligria

Mais se vié um ladrão

Nem qui eu sofra ingual o cão

Eu faço tudo di novo

Num posso vivê calado

Em casa trancafiado

Ingual um pinto no ovo.

Fim

JOÃO RODRIGUES

Poeta do Riacho
Enviado por Poeta do Riacho em 28/08/2011
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