Dilema de um camponês
Eu vivo no campo, e nele trabalho
É meu quebra-galho, e meu ganha-pão
Aqui eu me encontro, me sinto pessoa
Nunca vivo à toa, amo meu torrão.
De dia eu trabalho, de noite descanso
O meu jeito manso é meu jeito de ser
Sou homem de paz, nunca quis a guerra
Pois todos na terra precisam viver.
Por isso é que vivo no interior
Num invejo Doutor nem homem da Lei
Sempre quis sossego, e viver sossegado
É do meu agrado, pois sempre sonhei.
No meu jumentinho eu ia pra feira
Mi’a vida faceira nunca quis mudar
Mas veio a idade, vendi meu jumento
Pois já num agüento de pé mais andar.
Pra comprar u’a moto, fiz economia
Como garantia empenhei meu feijão
Um tubo de milho, um bode e um anel
Meu belo chapéu e o meu alazão.
Todo satisfeito e motorizado
Ia pra todo lado, pra onde eu queria
Economizei carne, só comprava osso
E com muito esforço paguei o que devia.
Nos dias de domingo pegava a Aninha
E de manhazinha íamos passear
Ela na garupa, bonita e cheirosa
E eu cheio de prosa, a lhe namorar.
A felicidade logo se acabou
Pois logo chegou um policial
Pediu documento, habilitação
“Doutor, tenho, não. Num me leve a mal.”
Prendeu minha moto e a pé eu voltei
Só eu mesmo sei a humilhação
Voltei com Aninha a pé pela estrada
Tristonha, cansada, que decepção!
Foi mais um sufoco, pra poder pagar
Pra mode eu tirar da Delegacia
Pedi emprestado dinheiro no banco
Aos tranco e barranco paguei o que devia.
Domingo de novo peguei a Aninha
E de manhãzinha fomos passear
De novo ela ia cheirosa e faceira
De brinco e pulseira, relógio e colar.
Mas logo pulou um cabra na estrada
Fez lá uma zoada, Aninha quis correr
O cabra gritou de arma na mão
Se deite no chão se não quer morrer!
Xingou, me bateu, chamou de safado
Um pobre coitado que mal pode andar
Que nunca fez mal a ninguém neste mundo
E vem um vagabundo para me humilhar.
Levou minha moto, levou meu trocado
Fiquei arrasado com a situação
Aninha, coitada, tremia e chorava
Enquanto me olhava deitado no chão.
Ficou sem relógio, sem brinco e colar
Sem poder falar com a tremedeira
Coitada, amarela, ali despojada
Pois ficou sem nada, nem mesmo a pulseira.
Seu moço, lhe digo, fiquei revoltado
Quando ao Delegado fui denunciar
Mal olhou pra mim, nem deu atenção
Como se o ladrão era quem tava lá.
Se saio no asfalto sei que sou multado
Vou ser assaltado se vou pela estrada
Portanto, seu moço, eu vou pra cidade
De bom na verdade num espero mais nada.
 
Agora, seu moço, não sei o que fazer
Vou ter que vender minha velha palhoça.
Como deixar tudo e ir pra cidade
Se a felicidade está aqui na roça?
Fim
João Rodrigues Ferreira