"O DEVEDOR"
Quando devemos fazemos o possível para pagar a nossa dívida, usamos até outros bens no pagamento e, quando não temos como pagar? Eu saio empenhando o que tenho.
Já empenhei minha casa
Uma espingarda soca-soca
Camisinha pra pitoca
Carvão pra fazer brasa
No cemitério, uma cova rasa
Eu também empenhei
Duas “coisa” que nem sei
Em um penico sem asa.
Uma dentadura sem dente
E uma peruca careca
Um par de meias, uma cueca
Meio litro de aguardente
Também empenhei o pente
De pentear a peruca
O sal que tava na cumbuca
E uma bíblia pro crente.
Um bule pro café
Um revolver sem coronha
Um travesseiro, uma fronha
Um sapato com chulé
E até lá no cabaré
Eu empenhei uma galinha
Pra pagar uma rapidinha
Que eu dei com a Zezé.
Eu empenhei uma cela
E também o meu cavalo
Empenhei até o galo
Pra pagar uma parcela
Da compra de uma gamela
Pra alimentar um jumento
Pangaré e fedorento
Empenhei minha cadela.
Empenhei um carro de mão
Mesmo faltando o pneu
Quando o meu pai morreu
Empenhei meu matulão
Para pagar o caixão
Para as flores e o velório
Empenhei do oratório
Santos Cosme e Damião.
Um cachorro vira-lata
Um bode pai de chiqueiro
Comprei sem ter dinheiro
E empenhei minha gata
Lá no açude da prata
Comprei água pra beber
Empenhei, veja você
Uma ninhada de pata.
Empenhei a noite e o dia
A lua e também o sol
A aurora e o arrebol
A água benta da pia
Acertei com a freguesia
A compra do firmamento
Pra saldar o pagamento
Dei a sogra por garantia.
É duro o meu destino
Devo, não posso pagar
Levo a vida a empenhar
Até já perdi o meu tino
Devo a Nosso Senhor Divino
E empenhei tudo ao mundo
Só nunca empenho meu fundo
A “mulé” e os “menino”.