As pernas da Mariquinha

Mariquinha do Balacobaco, moradora da Serra do Alto, um dia acordou invocada: resolveu as pernas exibir.

Ligada nas modernidades tirou foto na webcam, pegou uma carona numa van e foi prá net as tais fotos postar.

Quem tinha computador se regalou com o pitéu: as pernas da Mariquinha, sensacionais como eram, assanhou todo o povo dali.

Juntou Mané da Jangada, Tião da Pedra Lascada, Chico Saci da Vazante, uma infinidade de machos em tropel, olhando aquele par de pernas a babar.

Estabeleceu-se o maior qüiproquó, deu-se um grande alvoroço: aquelas belezuras de pernas fizeram um sucesso estrondoso.

Mariquinha era namoradeira, dessas de arrumar briga de feira, de não deixar sossegado o namorado da hora.

Era muito bela a danada. A tal, ao invés de andar, desfilava: os basbaques faziam fila, deixavam seus afazeres, botavam-lhe olho guloso.

Ela era uma moça muito faceira: andava toda arrumada, rouge não podia faltar - se não estivesse bem maquiada, não botava a cara de fora.

Essa era Mariquinha do Balacobaco, namorada de João da Labanca, um matuto juramentado que ficou muito zangado com as tais das fotografias

Que Mariquinha, lambeta, tirou. João da Labanca desassossegado, fechava a imensa carranca, vendo a multidão de marmanjos urubuzar sua namorada.

Na vila ficou tudo parado: as fotos de Mariquinha espalhadas prá todo lado, com as pernas ameaçando a santa paz daquele lugar, colocando os machos em porfias.

João da Labanca ensandecido, Mariquinha toda pimpona, fazendo pose de gata - das fotos se aproveitando, fazendo suas belas pernas afamadas.

Vejam só o mal que a net provoca: pernas lindas colocadas na rede, o pobre João da Labanca posto contra a parede - nada mais funcionava correto.

A vila de Serra do Alto mudou: de lá prá cá mais nada prestou - já existe até esse tal de Orkut aporrinhando a vida das gentes com seus recados perversos.

É briga que não para mais: meninas a desafiar os seus pais, a namorar quem quiser; mesmo se for do estrangeiro – isso acontece direto.

Agora vou confessar em surdina, que João da Labanca não nos escute: eu também sou filho de Deus - fui dar uma olhada no Orkut nessas pernas cantadas em versos.

Quase sofri um colapso: aquelas pernas olhando prá mim e eu delas os olhos não conseguindo tirar – e, prá completar minha desventura, Mariquinha do Balacobaco tem um primor de cintura.

É uma dessas cinturas finas, de nos fazer entortar o pescoço. Mas já que estava ali mesmo deixei alongar meu olhar, fui me estatelar em dois pêssegos, quase pulando da blusa - uma coisa de arrepiar.

Meu deus! Que negócio é esse? Pus-me de imediato a cismar. Coitado de João da Labanca, sossego não vai mais encontrar, pois o olhar da Mariquinha é uma verdadeira tortura.

De olho pregado na foto fui entendendo todo o furdunço, cheguei a um veredito: Mariquinha do Balacobaco com essas pernas tão generosas, está prá lá de gostosa - não o há que contestar.

João da Labanca, coitado, coça a cabeça, amuado: “-Que hei de fazer agora, com essas pernas amostradas? “-A coisa está mal-parada: as pernas da Mariquinha atraem mais que yogurte.”

Os machos da Serra do Alto fungando que nem touro bravio, fazendo fila prá ver Mariquinha tomando banho no rio, as famosas pernas mostrando.

João da Labanca, sem prumo, de espingarda armada, vigiando de pau na mão, a todos ameaçando: “-quem chegar perto eu estraçalho – maldito seja esse tal de Orkut!”

“Antes, aqui, a vida era boa: Mariquinha dentro de casa, não se avexava com essas coisas atoa; agora? só quer saber de internet...até quando???”

E o povo da vila de Serra do Alto a plenos pulmões entoando: “-Tem cheiro de chifre queimando!!!”

Cidade dos Sonhos, Tarde/Noite de Quarta-Feira, já entrando nos últimos dias de Março de 2010

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 10/09/2010
Reeditado em 10/09/2010
Código do texto: T2489784
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