Lembranças de Natal antiga
Uma homenagem aos autores do livro DOS BONDES AO HIPPIE DRIVE-IN, Carlos e Fred Sizenando Rossiter Pinheiro, e ao seu pai que os inspirou no amor pela cidade do Natal, Sr. João Sizenando Pinheiro Filho.
Tudo isso bem começou
por tenaz inspiração
de um anjo chamado João,
que quase tudo guardou.
Leu, deixando ensinamentos
deu lições, mais que proventos,
para os filhos que criou.
Em qualquer passeio dado,
destacava o logradouro
mostrando cada tesouro
no que ele havia apontado.
Rabiscava, descrevia,
brincava e se divertia
tendo os filhos ao seu lado.
Complacente e conselheiro,
ao sinal de travessuras,
às pequenas criaturas
demonstrava bem matreiro
que o castigo até viria,
mas que logo passaria
se este fosse o derradeiro.
João Sizenando Pinheiro
Filho, com nome de pai,
o seu legado hoje vai
ser visto como altaneiro
e feito vôo de fragata
planante, leve, resgata
Natal, seu chão prazenteiro.
Ainda bem que seus filhos
Fred e Carlos, seguidores
foram também narradores
dos bondes, pelos seus trilhos,
com morada em cada rua,
trazendo a cidade nua
cheia de tons e estribilhos.
A cidade que crescia,
parecendo uma criança,
de cada sua lembrança
mais um causo ressurgia,
felizmente compilado,
para um dia publicado,
fazer a nossa alegria.
O Zeppelin registrando
em seu vôo sobre a Cidade
Alta era uma novidade
que a província ia agitando,
no tempo em que Paulo Lira
punha a música na mira,
no seu piano tocando.
Dos burros puxando o bonde,
pelo arvoredo poético,
mesmo vindo o bonde elétrico,
nada impede que ele fronde.
Mostra que mesmo tão pura,
na guerra e na ditadura,
Natal reage e responde.
Areia Preta era a praia
preferida do momento,
com Sol, sal, areia e vento,
nos tempos de anágua e saia,
via o biquíni surgindo
e a molecada pedindo
a tal tomara que caia.
Da Felipe Camarão,
mil histórias de vizinhos,
piões, artes e carrinhos
trilhando naquele chão
de conversas de calçada,
onde toda a meninada
prestava muita atenção.
Jardim de Infância Modelo,
bem ao lado da pracinha
Pedro Velho que já tinha
passeio e muito desvelo.
Era ali que a criançada
de Natal era ensinada
a respeitar e ter zelo.
Escolas tradicionais,
pelo relato relembro,
CIC e Sete de Setembro
de tempos memoriais,
com Atheneu e Marista
disputando, nesta lista,
espaços colegiais.
Escola Técnica além,
de Churchill e Salesiano
do Batista Bereiano,
na Educação, nota cem,
e a Doméstica querida
educando para a vida,
com etiqueta, fez bem.
Lá no Alecrim, mais recente,
teve o Padre Miguelinho
colégio do bom caminho
para o estudante uma lente,
juntinho à feira famosa,
decantada em verso e prosa
por poetas do repente.
Os jogos estudantis,
festivais, educandários,
os monstros imaginários,
mulas-mancas e sacis,
novelas radiofônicas
visões, às vezes, platônicas
em nossa Natal Feliz.
Tinha um herói do sertão
cujo nome era Jerônimo,
um verdadeiro sinônimo
do justiceiro de então,
mas tinha, por outro lado,
rica viúva Machado
tida por bicho papão.
Um campo em terra de Sol,
inaugurado no tempo,
fez-se logo um passatempo
movimentando o Tirol,
dali Jorginho, inconteste,
mostrou a todo Nordeste
que aqui tinha futebol.
Num futebol disputado,
feito um prato de feijão,
valia ser campeão
sem ter um tostão furado.
Era o tempo do valor
das tertúlias, do amor,
de quem era apaixonado.
O rock se fez presente
neste solo abençoado,
de baião e de xaxado
tornou-se logo parente;
ao inglês já deu função
para fazer tradução
na SCBEU emergente.
A agitação em Natal
daí tornou-se freqüente,
ABC botava quente
no torneio estadual,
mas pra não perder na dose
o América na Anastomose
destacava o social.
Para a vida temperar
a luz negra deu pitada
compondo toda noitada
tirada para dançar
e ali, bem no escurinho,
bailava-se abraçadinho
sem nem cabelo passar.
O namoro no cinema,
lá das tardes domingueiras,
depois de manhãs praieiras,
constituía o poema,
mas à noite em fantasia
enquanto Natal crescia,
Hippie Drive-in era o tema.
Pautado na narrativa,
por Fred e Carlos, contada,
eu quis deixar registrada
essa história muito viva
provinda dos alfarrábios
do pai e dos próprios lábios
da nossa Natal altiva.
Prefaciando tal obra
li antes de todo mundo,
no livro, um talhe fecundo
de cada olhar que desdobra.
Vi quão bela é minha terra,
nas facetas que ela encerra
e nos sonhos que redobra.