Depois do Natal: Um conto para não ser lido à noite (Cap XIII: A CHEGADA DOS PAIS)
Com essas informações colhidas da boca do taxista no curto tempo que durou a viagem até a casa do sapateiro, que o casal, desesperado, chegou à residência do profissional dos couros.
Mal o carro parou eles desceram.
Desceram não, voaram para fora do táxi.
Tiveram, apesar do desespero, um instante de bom senso. Na dúvida mandaram o motorista voltar e chamar a polícia. Prometeram o pagamento só para depois que os homens da lei chegassem.
-Mas vai logo! Ainda gritou o pai, entrando no pátio.
Por mais que discordasse o motorista foi obrigado a concordar. Principalmente por que os dois deixaram-no falando sozinho, enquanto entravam.
Nem deu tempo de descer do carro, já estavam entrando na casa do homem. Foram como que arrastados por uma língua de ansiedade que os engoliu para dentro da casa. Na verdade o desespero era tanto que foram como que sugados pela porta aberta, da casa do sapateiro.
Na sala a mãe, solta um grito.
Uma peça de roupa infantil.
Uma saia cor de rosa.
Pega a roupa: reconhece a roupa que sua filha usava.
Novo grito ao ver o que o marido mostrava: jogada sobre um monte de couro de boi uma calcinha de criança.
A mãe viu tudo e imediatamente identificou as roupas de sua filha.
Numa só voz os dois começam a gritar o nome da filha. Mas não ouviram resposta.
Só ouviram o sussurro do vento que os acompanhava, entrando pelas frestas das portas e janelas.
Correndo, o casal passava por todos os aposentos da casa.
Nada.
Absolutamente nada, nenhum sinal da menina nem do sapateiro.
Teria raptado a menina e agora estava escondido, esperando a oportunidade de exigir resgate?
A dúvida já era maior do que a angústia por ter perdido o contato com a filha.
O desespero da mãe só era comparado à ansiedade do pai. O pior de tudo era aquela sensação de impotência: saber da urgência das providências a serem tomadas, mas sem poder tomar outra providência que não o gritar pelo nome da filha.
Foi o que fizeram
Gritaram.
Forte e cada vez mais alto!
Essa é uma das grandes limitações daquilo que se chama de liberdade: o fato de não se poder ter o controle da situação.
Por mais que se faça planos as situações do cotidiano sempre escapam ao controle humano. Por mais que desenvolva tecnologias para dominar a natureza sempre aparece o imponderado anulando os planos e exigindo soluções alternativas e improvisações.
Mesmo com todos os avanços científicos e tecnológicos o homem não pode nada, não controla nada. É apenas marionete nas mãos dos fatos. Por isso, para tentar deixar de ser marionete, cria alternativas, evolui, cria progresso e sofre suas consequências. Mas por mais que evolua ou avance, sempre se percebe impotente diante do imponderado dos fatos inesperados.
Mas o casal não tinha tempo para essas reflexões. Apenas gritavam pelo nome da filha. Onde ela estaria?
Os dois andavam de um lado para outro, dentro daquela casinha simples, pequena, sem luxo. Olhavam-se, parados, perplexos, sem saber o que fazer, onde procurar, a quem recorrer… Completamente impotentes….
(Continua na próxima semana...)
Neri de Paula Carneiro
Rolim de Moura – RO
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