Velori(z)ando
Aquela alinhadíssima e multi-milionária recém-viúva apenas apeada de seu Rolls, com chauffeur, adentrou uma chiquerrérima funerária para examinar as condições em que se encontrava o corpo do falecido para a cerimônia de cremação que se faria nas próximas horas.
O próprio diretor da funerária a recebeu, circunspecto comme il faut, e a conduziu à câmera onde se encontrava o ataviado ataúde. O rosto e as mãos - partes visíveis - do obituado estavam rigorosamente imaculadas, e sua aprovação foi imediata...quase efusiva.
Contudo ao se deparar com o corpus do de cujus, o desapontamento e a reação fulminante:
- Como os senhores poderiam cometer um tamanho e imperdoável despautério, bradou em voz que até parecia trair-lhe as origens europo-tupiniquínicas...? Eu - enfatizando e elevando a voz...: encomendei terno
azul-marinho e os senhores me fazem a gentileza de o colocar num terno negro...onde é possível isso, onde, como, senão nesta amaldizoada terra...a quem o próprio descobridor deu as costas só de pensar nas Índias...? Quero uma explicação, cabal...
Apertado o diretor da Funerária atento a tudo, no entanto, ligou para a câmera 22 e certificou-se se o residente temporário de lá estava portando um terno azul marinho, conforme as especificações da e espinafrações da respeitabilíssima viúva que tinha à sua frente...
Diante da resposta positiva ordenou:
Vou servir um liqueur à Senhora fulana de tal e, - já à distância, baixando a voz - enquanto isso procedam imediatamente à troca...a motosserra silenciosa está no lugar de sempre...