Projeto Viagem Astral - PARALISIA

   Após alguns dias sem absolutamente nada acontecer, aquela sensação de corpo dilatando e aquele som de rádio sintonizando começou novamente. “Ok. Aqui vamos nós… para onde agora?” - pensei.

   O problema foi exatamente esse. Não fomos para lugar nenhum! No momento em que estava tendo a transição, foi que eu percebi que algo não estava bem. Geralmente, quando estou sintonizando, ouço conversas, mas, dessa vez, eram gritos bem agressivos, frases ríspidas num idioma que eu não entendia. Em vez de vibrar, expandir e flutuar, fiquei travado, completamente imóvel.

    Meu quarto era um breu total. Abri o olhos. Não sabia se estava dormindo ou acordado. O calor era insuportável, parecia que eu estava queimando numa fogueira. Meus olhos lacrimejavam, pois estavam ardendo muito. Comecei a ver sombras ainda mais escuras se movimentando pela escuridão. Formas horrendas, bestiais, criaturas que lembravam homens-lagartos, seres com chifres e coisas do tipo.

   Dentre todo aquele zoológico macabro que tinha se transformado o meu quarto, um par de olhos amarelos brilhantes se destacou. Era uma sombra sem forma com dois grandes e impiedosos olhos amarelos.

   Tentei rezar. Mas a verdade é que nunca fui um cara religioso, quanta contradição… simplesmente não conseguia ter fé o suficiente para fazer uma oração.

   Aquele ser se aproximava cada vez mais. Parecia se deliciar com o meu sofrimento. Os seres ao redor rugiam, grunhiam, rosnavam e gritavam. Era certo o meu fim.

   O problema todo foi que, antes de dormir, eu teria feito uma “mentalização intensa”. Eu era adolescente e queria ser útil para o mundo, fazer a diferença, esse tipo de coisa. Foi uma das poucas vezes em que “rezei”. Naquela bendita noite, antes de dormir, me ajoelhei e pensei “Pai, faze de mim o teu instrumento de bondade na terra”.

   Durante quase um mês isso se repetiu. Eles vinham, eu ficava preso, imóvel, aqueles olhos amarelos pareciam se alimentar do meu medo. Eu já não conseguia mais dormir. Só alguns cochilos curtos, mas me sentia exausto, um zumbi praticamente.

   Demorei muito para ligar uma coisa a outra. Quando essa sessão de tortura espiritual recomeçou e aqueles olhos amarelos se aproximaram, percebi, finalmente, a razão daquilo tudo. Foi o maldito voto, aquele desejo, aquele pensamento intenso daquela noite. Naquela noite do “RESGATE”, devo ter chamado a atenção de algum ser ou entidade muito poderosa, e que não estaria nada feliz com as minhas atividades astrais.

   No momento em que percebi isso, já cansado, exausto mentalmente, pensei: “Abro mão do meu desejo. Quero apenas viver em paz.”

   Percebi então um leve sorriso brotar daquele ser. Pela primeira e última vez, vi o seu contorno. Ele usava uma espécie de túnica ou capuz cerimonial. Ele se virou e nunca mais vi aqueles olhos terríveis novamente. Sei que não é algo para se orgulhar, mas eu sabia que aquilo era apenas o início de algo que iria piorar muito mais, caso não tivesse parado naquele momento.

 
Manassés Abreu
Enviado por Manassés Abreu em 07/05/2020
Reeditado em 28/05/2020
Código do texto: T6939950
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