Amigos de Nicholas Nickleby
O negrume da noite sem lua havia caído sobre o campo de batalha, cessados o fragor dos canhões e os gritos dos feridos. Um cão uivou à distância, onde a campina se encontrava com a floresta; uma coruja piou numa árvore próxima. Alguém tossiu, cerca de dez jardas distante.
- Quem está aí? - Indagou, erguendo a cabeça do solo, onde estivera deitado.
- Não faça perguntas, se não quiser ouvir mentiras - respondeu uma voz cansada.
- O que houve com você?
O outro homem tossiu novamente antes de responder:
- Fui dobrado e quebrado, mas espero que seja para ficar em melhor forma.
Ele olhou em torno. Trevas.
- Nos abandonaram aqui. Eu não sinto minhas pernas...
- Eu não estou em melhor forma. Pela manhã, não seremos mais.
- Gostaria que houvesse alguma luz, além das estrelas - refletiu, olhando para o alto.
O outro resmungou algo, que se tornou finalmente audível como:
- Mariposas e toda sorte de horríveis criaturas esvoaçam ao redor de uma vela acesa. Poderia a luz ajudá-las?
- Eu não sei... talvez seja mesmo melhor que não possamos ver nosso estado - admitiu. - Não quero ter que chorar por mim mesmo.
- Ninguém deveria se envergonhar por chorar - replicou o outro. - Lágrimas são como chuva, sobre o pó da terra.
- Tenho certeza de que nunca nos encontramos antes, mas suas palavras me parecem conhecidas - arguiu.
- Se você é amigo de Nicholas Nickleby, então é meu amigo - redarguiu o outro.
E ambos, um pouco mais confortados em sua solidão compartilhada, voltaram os olhos para as estrelas que piscavam gélidas nas alturas, testemunhas indiferentes em suas hostes cintilantes.
- [06-12-2019]