O MORIBUNDO QUE VIU A MORTE CHEGAR

Fazenda Santa Filomena, zona rural de Goiás, a cerca de algumas dezenas de quilômetros da capital, sol escaldante, plantações a se perderem de vista. Propriedade do rico fazendeiro Sr. Moraes, homem de seus setenta anos de idade e agora em uma cama acometido de uma doença grave e prestes a dar adeus a vida. Não quiz ficar internado em um hospital, preferiu transformar seu quarto em uma UTI particular esbanjando todo o dinheiro que possui com médico e enfermeiras a sua disposição. Muito arrogante e vingativo era odiado por fazendeiros vizinhos, até alguns membros da família o temiam, sempre foi homem de dar ordens e ai de quem o desobedecesse, era duramente castigado.

   Alguns amigos e conhecidos, ao tomarem conhecimento da sua enfermidade, acorreram a sua residência com o intuito de visitá-lo, mas ele deixou ordens expressas para não o incomodar. Foi um ato mesquinho mas foi respeitado, porém algumas excessões foram consideradas pelo moribundo, afinal não conseguiria viver isolado no estado em que se encontrava. Tinha horas que o Sr. Moraes demonstrava fraqueza e deixava rolar algumas lágrimas, no entanto fazia tudo para não serem notadas, seu orgulho era bem mais forte para se deixar abalar, imaginava a morte chegando logo e o levando desse sofrimento.

   A noite chegou rapidamente, aquele mormaço, o sol quente, ali não mais existia, era só aquele frescor de uma noite a qual o Sr. Moraes não se recordava de ter sentido, ele até estranhou, teve ímpeto de se levantar mas sabia da impossibilidade de fazê-lo, queria respirar lá fora esse ar que seus pulmões tanto precisavam, queria ver lá fora como estava a natureza, os animais dessa imensa propriedade sua. Olhou ao seu redor e não viu ninguém, estranhou essa ausência irresponsável, afinal pagava bem ao pessoal para lhe dar assistência médica e nesse momento não existia ali uma viv'alma para lhe dar atenção. Gritou irritado, chamou a esposa, as enfermeiras, o médico, ninguém atendeu. Gritou várias vezes inutilmente, o silêncio continuava reinante ali no seu quarto. Num ato inesperado levantou-se e assustou-se com isso, não esperava ter forças para isso. Sentiu-se leve quando ficou de pé, caminhou até a sala em busca de explicações, ninguém lá. Ganhou a porta da rua em busca de algum empregado para dar vazão a sua ira, ninguém também, tudo estava deserto, não se exaltou muito por se sentir tranqüilo por estar conseguindo andar, afinal era um feito muito importante para ele.

Voltou para a sala, estava perplexo com essa situação, não conseguia entender o que estava acontendo. Súbito teve um mal estar, sua cabeça começou a rodar e uma tontura se abateu sobre ele, sentiu mãos o segurando, porém ele não via de quem eram. Foi levado para um determinado local da casa e colocado dentro de um caixão, seus apelos aos gritos de nada adiantaram, já dentro daquela caixa de madeira se sentiu fragilizado, sem forças e sem condições de dar um único grito, tudo estava como antes, só que agora se encontrava dentro de um caixão coberto de flores dos pés até a garganta. Não tinha mais como fazer qualquer movimento, apenas viu pessoas que ele bem conhecia se aproximarem, eram sua esposa, filhos e empregados da fazenda, além de pessoas que vieram de longe, familiares que bem conhecia. Teve a convicção de que estava realmente morto.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 23/10/2019
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