VIDAS ENTRELAÇADAS (Parte 1)

   Leo sentiu uma grande aflição ao se aproximar do parapeito da ponte, viu lá embaixo o rio caudaloso de águas barrentas, estava decidido a dar cabo de sua vida, não mais lhe interessava essa tristeza pela qual passava. Pretendia pular. Estranhou ele, porém, essa aflição repentina, não estava nos seus planos. Viver praticamente como uma pessoa desprezada, tanto pela esposa quanto pelos filhos, não era mais conveniente, era preferível a morte. Debruçou-se na ponte e olhou lá embaixo, a altura era considerável, a fúria da correnteza era impressionante, não dava para escapar.

   Na noite anterior Leo chegou em casa um pouco "alto", dificilmente bebia, mas nesse dia resolvera sair no final da tarde para lugar nenhum, saiu sem rumo, havia discutido com a mulher de quem tinha uma desconfiança de traição, só não tinha provas, sua vontade era desaparecer no mundo e nunca mais voltar, mas alguma coisa o prendia ali naquele lar, ele não sabia o que era. Encontrou alguns amigos que o convidaram para um bar. Todos notaram a sua desatenção, deram conselhos, mas ele apenas ouviu sem dizer nada.

   Uma voz parecia dizer para esse homem aperreado com a vida: "pula!". Outra voz parecia dizer: "não pule!". Isso o deixou em dúvida, momento em que olhou para o alto e sentiu uma vertigem. Teve a nítida impressão de que estava caindo, pensou até que tinha pulado da ponte, mas apenas entrou numa espécie de transe e se viu num lugar completamente diferente de onde estava anteriormente, era uma praça, algumas crianças brincavam, corriam, gritavam, ele observou confuso aquela situação, mas sentiu-se tranquilo e até feliz. Vestia uma roupa diferente, limpa e cheirosa, mas não sabia onde estava. Uma das crianças se aproximou dele chamando-o de "papai", ele nunca tinha visto essa criança na sua vida, porém abraçou o menino sem dizer nada. Em seguida dois braços femininos o envolveram por trás e acariciaram seus cabelos fazendo-o voltar-se para ver de quem se tratava. Uma bela mulher sorria para ele, sem jeito apenas aceitou aquele carinho, afinal estava precisando muito.

   Leo saiu dali sem compreender nada, a mulher, aparentemente sua esposa, tomou suas mãos e saíram caminhando junto com o menino que julgou ser seu filho. Nem sabia os nomes deles, mas não se preocupou com isso, preferiu curtir essa felicidade que recebeu como presente. Chegando em casa sua mente se abriu como por encanto, aquela do seu lado era Ana, sua mulher, o menino chamava-se Augusto e tinha apenas sete anos, viviam felizes naquele lar acolhedor, era a mesma cidade onde anteriormente morava, conseguiu lembrar, até a tristeza que o abatia naquela ponte lhe veio na lembrança, mas preferiu esquecer, afinal estava em outra e muito melhor, amava aquela mulher e era correspondido. Viu os dias se passarem, seu trabalho era outro, sabia perfeitamente de todos os detalhes dessa nova vida, estava adorando.

   Leo tinha noção de que o tempo era outro, estava dois anos a frente do ano em que vivia quando tentou sem sucesso contra a própria vida, mas se acostumou com isso, era como se estivesse vivendo no futuro. Certa tarde depois do almoço ele resolveu tirar uma sesta e foi para o quarto, um repouso nessa hora era indispsnsável, vez ou outra fazia isso. O sono não veio logo como de costume, em poucos minutos apenas uma leve sonolência se abateu sobre ele, vieram lembranças da outra vida, as brigas constantes com a outra mulher, coisas que o desagradavam. A sonolência foi aumentando gradativamente e em alguns segundos a porta do quarto se abriu e surgiu Ana, sua esposa dessa vida. Ela sorriu para ele e lhe fez um aceno como uma despedida, imaginou Leo que ela fosse sair, estava dando-lhe adeus, ele tentou levantar-se mas o corpo não obedeceu e a imagem dela foi desaparecendo aos poucos até que perdeu completamente os sentidos.

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(Aguarde a parte 2 deste conto que será publicada em breve)

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 05/10/2019
Reeditado em 05/10/2019
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