JEFF, O RETORNO

   Jeff olhou através da pequena janela da cela, através de grade de ferro, o rio caudaloso e a mata fechada após ele, via o sol brilhar com uma certa magia, um cenário que já se acostumara a admirar. No princípio as lágrimas escorriam pela sua face triste e o deixava profundamente abatido, mas o tempo o ensinou a se resignar e aceitar essa triste realidade. Alí estava há doze anos preso, tivera um grande desentendimento com a esposa, ela o traía com um delegado da polícia local e ele atentou contra a vida do desafeto atirando contra o mesmo. Não conseguiu seu intento, apenas o feriu levemente, tentou fugir mas foi pego logo adiante. Acusado de tentativa de homicídio foi levado as barras da justiça e condenado. Nenhuma visita ele recebeu, a esposa o desprezou, Jeff amargou uma solidão que quase o levou ao desespero de tentar ceifar a própria vida. Mesmo infeliz ele conseguiu se controlar emocionalmente e nem se deu conta de ver que o tempo ia passando e um novo mundo ter para suas meditações. As suas noites eram melancólicas, se contentava com o brilho da lua e o cintilar das estrelas, o silêncio era absoluto, muitas vezes perdia a noção do tempo, não sabia que dia era e nem a hora, pensamentos os mais diversos povoavam sua mente e esperava ansiosamente o dia da sua libertação. Tinha planos ao sair dalí, planos macabros, algo o impulsionava a cometer mais um crime e dessa vez com sucesso, mas sempre procurava evitar realizar esse intento quando imaginava voltar para a cadeia.

   Algum tempo depois, quando Jeff dormia, numa tarde chuvosa, o carcereiro bateu na grande da cela, colocou a chave na fechadura e abriu a pesada porta de ferro gritando: "Bora prá casa, tás livre!!!" O prisioneiro nem acreditou, apesar de tanto tempo alí recolhido. De olhos arregaladodos e coração batendo aceleradamente pegou os poucos pertences que tinha e deixou a cela, passando antes na recepção onde um policial lhe entregou um papel, era a ordem de soltura. Já lá fora o ex-preso olhou o céu coberto de nuvens escuras e sentiu a chuva fina lhe molhar as vestes, mas nem ligou, para ele era como se bálsamo edificante lhe revigorasse a alma. Caminhou sem rumo, afinal ir prá onde se a casa em que morou por muito tempo tinha uma dona que talvez não o recebesse bem? Mas mesmo assim quiz checar "in loco" como estava sua casa depois de mais de dez anos, caminhou até lá e em poucos minutos chegou. A casa estava fechada e do mesmo jeito que deixou, o jardim era o mesmo, apesar do abandono, o tapete na entrada lá estava, onde sempre limpava os pés antes de entrar. Imaginou não ter ninguém, mas quando forçou a porta ela se abriu e quem na sala estava como a esperá-lo? Era a mulher com quem viveu até o dia de ser preso, estava abatida, chorava, os soluços eram claramente ouvidos por ele, que apenas se limitou a olhá- la e sentir uma certa pena. Essa cena o incomodou de certa forma, qualquer indício de rancor alí desapareceu, não sabia o que dizer, não esperava por isso, achava que alí não se encontrava ninguém.

   Dois anos se passaram, aquele jardim agora estava bem cuidado como em tempos passados, o tapete no mesmo lugar, depois que deixou a prisão limpara os pés por incontáveis vezes, adentrara essa casa sentindo uma estranha felicidade, voltara a desenvolver as suas atividades interrompidas com o triste evento em que se metera e agora o espírito de liberdade o envolvia. Jeff se considerava um homem quites com a sociedade, não tivera filhos com a esposa de quem gostava e lamentou tudo que aconteceu em sua vida. A solidão ainda o abate, mas tem forças suficientes para continuar sendo um homem de bem e perdoado pelo que fez. A cena que vislumbrou há dois anos quando em sua casa entrou quando deixou a prisão ficou guardada em sua memória, nunca esqueceu. Vira a ex-esposa chorando como se estivesse a sua espera, como se implorasse o seu perdão pela traição, quando na verdade fôra uma alucinação, aquela mulher havia falecido há alguns anos vítima de seu próprio veneno, quando traiu o policial com quem passou a conviver depois que o marido foi preso. Ele a matara em sua própria cama junto com o amante, os dois foram atingidos por balas que ceifaram suas vidas imediatamente. Hoje amarga a prisão pelo duplo homicídio cometido. Quando a porta da casa foi aberta por Jeff, na realidade não havia ninguém na sala, apenas uma pessoa de confiança que a deixara destrancada por se encontrar no quintal fazendo um pequeno serviço.

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 04/06/2019
Reeditado em 04/06/2019
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