FILHOS DO ALCOOLISMO

Conheci uma família que tinha cinco filhos, os quais dava muita pena vê-los zanzando pelas ruas do bairro sempre tristes, sendo que o menor deles constantemente estava seminu e com o nariz escorrendo, além de cabeludo, sujo, maltrapilho e, creio, faminto. Faminto não pela falta de comida em casa, e sim, pela oportunidade de não tê-la cozida.

O pai era um servidor municipal que diariamente saia do trabalho e prazerosamente se dirigia aos balcões de bares e botecos, na doentia vontade de saciar seu etílico vício e por lá se embriagar. Enquanto isso, lá em sua casa a sua esposa, também, se abastecia de aguardente durante o dia todo. Poucas pessoas da relação sabiam de se vício.

O pai sequer teve tempo de ver seus filhos crescerem, pois uma cirrose hepática cuidou fervorosamente de abreviar o seu sofrido fim.

Das cinco crianças apenas uma era feminina, que, vitimada pela carência e pelo desamor, cuidarem de destiná-la para bem longe dos irmãos e da própria mãe. Já os quatro meninos ficaram ao Deus-dará.

Mas a providência Divina, que é muito generosa, cuidou de amparar o irmão mais velho conduzindo-o a um emprego num grande escritório de advocacia. Lá o pequeno aprendiz rapidamente se adaptou ao trabalho e sempre dizia ao patrão que iria estudar muito para um dia ser um advogado igual a ele. Isso criou um vínculo de amizade entre ambos que terminou com uma bolsa de estudos cedida pelo escritório em favor do pequeno funcionário. Não tardou muito para que o mesmo estivesse matriculado num curso de direito de uma universidade federal, o que serviu de exemplo para seus três irmãos.

Depois de formado, aquele jovem advogado só pensava em tirar toda sua família daquele círculo de pobreza absoluta e para tanto conseguiu para seu irmão mais velho um emprego no mesmo escritório de advocacia de seu ex-patrão, e, para o seu contentamento ele foi à formatura do seu irmão na graduação de bacharel em direito.

Agora aquela família desestruturada orgulhosamente colocava dois advogados em sua árvore geneológica.

Os outros irmãos seguiram caminhos opostos aos acadêmicos, mas sempre trilhando pelo lado do bem.

Determinado dia eu vi uma aglomeração de curiosos na frente da dita casa, e por eu ser muito próximo de todos fui lá para me certificar de notícias. Na porta da casa estava e irmãos caçula e a ele perguntei o quê estaria acontecendo, ao que de pronto ele me disse que sua mãe acabara de falecer após um coma alcoólico e que sob a sua cama acharam um engradado cheio de garrafas de cachaça 51.

E eu lhe disse:

- Meus pêsames. Ela, certamente já está com o seu pai.

Ele tristemente me disse:

- Cada um com um copo na mão.

Disfarsei para não rir, e depois saí.

José Pedreira da Cruz
Enviado por José Pedreira da Cruz em 05/05/2019
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