Uma Manhã de Verão em Nazaré (Parte I)

Aquela poderia até parecer que seria apenas mais uma bela manhã de verão, naquele pequeno povoado hebreu, chamado Nazaré. O céu estava com um azul tão límpido, que até parecia o fundo de uma tela magistralmente pintada pelo autor da natureza.

Mas o melhor; a verdadeira obra-prima ainda estava por ser pintada.

Mas, o que poderia ser ainda melhor que aquele visual? O que poderia haver de tão extraordinário, que ainda estaria faltando e que ainda pudesse ser acrescentado e fazer parte daquele cenário tão maravilhoso, onde o sol da manhã brilhava em todo o seu esplendor, fazendo com que os seus raios se refletissem naquelas minúsculas gotas de orvalho que, pendentes nas folhas verdejantes que envolviam as árvores à beira daquela pequena estrada de barro, mais parecessem pequenos cristais que, balançando suavemente ao sabor de uma suave brisa, pareciam flashes, que ofuscavam com tanta beleza os olhos dos trabalhadores e viajantes que a pé, ou montados em seus animais, por ali passavam? Certamente que haveria de ser algo muito extraordinário.

Às vezes possuímos em nós um verdadeiro tesouro, mas quase sempre necessitamos que primeiramente outros o enxerguem em nós, para que tomemos consciência de sua existência...

E aquela grandiosidade; a tal obra-prima que completava aquela tela, estava toda ela contida na existência de um menino.

Era um menino saudável, de cerca de oito a nove anos de idade, filho único de uma família muito humilde, e que justamente naquela manhã, munido de um pequeno caniço, caminhava em companhia de outros dois amiguinhos, possivelmente da mesma idade, em direção a um pequeno riacho, que ficava não muito distante da sua casa.

Embora com pouca idade, ele já exercia uma liderança nata sobre seus coleguinhas. Era ‘bom de papo’, e tinha um jeitinho todo especial de convencê-los a fazer o que ele quisesse, mas não costumava se aproveitar disso, porque também gostava muito de participar ativamente das ações por ele perpetradas.

E naquela manhã ensolarada a sua missão era das mais agradáveis possíveis; iam pescar e, evidentemente aproveitariam para dar alguns mergulhos naquela límpida água do seu riacho preferido.

Mas, o que tinha a ver aquele menino; aquele pequeno líder, com o melhor que poderia vir a acontecer naquele dia tão lindo?

Acontece que justamente naquela manhã de verão, passaria por aquela pequena estrada, uma caravana circense, coisa muito comum naqueles tempos. E em uma das carroças daquela caravana, em duas grandes jaulas, eram transportadas as estrelas da companhia: um casal de leões e um tigre dentes-de-sabre. Eles eram animais muito conhecidos naquelas redondezas, não só pelo seu porte, mas também, e principalmente pela sua ferocidade, havendo até notícias, não confirmadas, de que eles já haviam devorado cerca de três renomados domadores diante de grande platéia, durante shows em que estrelavam.

E foi justamente quando acabavam de passar por uma pequena ponte de madeira sobre o riacho, onde os meninos estavam, que a carroça que transportava as feras teve uma de suas rodas quebradas, o que fez com que ela tombasse, caindo na margem do riacho. O condutor da carroça saltou antes dela cair, mas com a queda as jaulas se abriram e os animais fugiram em desabalada carreira, justamente na direção onde se encontravam os três meninos.

O acidente causou muita preocupação e grande rebuliço entre os habitantes daquele povoado, fazendo com que a notícia chegasse rapidamente aos ouvidos de Maria; a mãe do pequeno líder que, tão logo soube do acontecido, saiu em desabalada carreira até a carpintaria do seu marido, onde o colocou a par do acontecido.

José, era este o seu nome, largou imediatamente o que estava fazendo e saiu às pressa, juntamente com sua esposa, juntando-se a uma pequena multidão que àquela altura já havia se formado, e partiram em socorro aos meninos. Armados de paus e alguns facões, e até de lanças, eles se puseram à caminho, tentando acreditar que o pior não tivesse acontecido. E assim que chegaram ao local onde costumeiramente os meninos gostavam de ficar pescando, levaram um ‘choque’; viram os bornais e os caniços dos meninos, assim como alguns peixes que eles haviam fisgado, mas nada de encontrá-los. Decidiram então se dividir em pequenos grupos que, já então tomados de certo pavor, partiram em diversas direções.

Continua...