Suicídio mal sucedido

Um dia acordei de manhã e olhei no relógio — era 10:30. Tomei um café e peguei o meu revolver que havia comprado no mercado negro.

Fui até a minha suíte e desferi um tiro em minha cabeça, mas infelizmente não morri. Fiquei ali ensanguentado, agonizando. Sentia o sangue quente escorrendo pelo meu rosto. Já não enxergava absolutamente nada, porém, ainda conseguia, levemente, ouvir barulhos, o tic-tac do relógio de 1915, herança do meu avô. Eu ainda estava consciente. Não foi fatal. Mas ainda me sentia confortável, tinha a esperança de que poderia morrer a qualquer momento de hemorragia. O sangue não parava de jorrar. Pro meu azar, aparece a governanta, que liga imediatamente para o resgate. E eu, com a fala sussurrada, pedia para que ela não me ajudasse. De nada adiantou. Em poucos minutos a ambulância chegou e me levou ao pronto socorro. Lá de dentro da UTI, eu via os vultos dos médicos que me examinavam. E de repente apaguei. Acordei no dia seguinte todo entubado. Já estava totalmente cego e não conseguia mais sentir do meu pescoço para baixo. Pouco tempo depois fiquei totalmente surdo também. Fui diagnosticado com síndrome do encarceramento. Fiquei perdido num escuro infinito, sendo acompanhado apenas pelos meus pensamentos torturantes, já que nada lá fora podia interagir. Não sabia se estava morto ou vivo. Eu estava num escuro onde ninguém me ouvia. Não havia mais nada a se fazer, a não ser esperar. Eu queria me livrar desse escuro. Alimentam-me por uma sonda enfiada em minha garganta, é o que me mantém vivo, além do tubo de oxigênio enfiado no meu peito. E mesmo há tanto tempo nessa condição, ainda não perdi a consciência. Vivo nessa angústia sem saber quando vai terminar.

Marcos Felipe Diniz
Enviado por Marcos Felipe Diniz em 10/05/2014
Reeditado em 01/01/2018
Código do texto: T4801441
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