Admirável Sonho Novo
Estava, aparentemente, em um futuro distante, bem distante, um mundo inundado em uns 20 centímetros de água por todos lados. O ambiente era bastante agradável, clima ameno, um horizonte limpo e claro, céu azul, sem nuvens. Como disse, tudo era cercado de água, uma água limpa (diria mesmo que poderia ser potável) de um azul cristalino por onde todos se locomoviam com naturalidade. Creio que cheguei a ouvi alguém dizer que em função do cultivo de alguns microorganismos (semelhantes ao plâncton) foi possível conter e reverter os efeitos do aquecimento global e o uso de energias renováveis erradicou a poluição como a conhecemos, a água era fundamental nesse modelo. Era, para mim, algo irreal, algo como uma "hidrotopia", um "Waterworld" do Kevin Reynolds/Costner, só que com bem menos água.
Era um mundo estranho, mas agradável de se viver, eu gostava de tudo e me sentia estranhamente mais jovem, entretanto, tinha a impressão de ser acompanhado a todo lugar que ia por duas presenças opostas: uma que me era muito estimada, apesar de não saber quem ou o quê era; outra que me aterrorizava deveras e que, constantemente, me punha em fuga.
Lembro do pânico que senti no exato momento em que essa presença perniciosa se manifestou próximo a mim, tendo atacado e devorado de forma extremamente violenta alguém com que eu conversava. Corri o mais que pude, tendo sempre essa presença no meu encalço, em verdade, ambas, uma perseguindo e a outra acompanhando. Consegui escapar por um precipício, caindo em algo semelhante a um igapó, alagado e raso, nesse ponto a presença maligna tomou a forma, era algo que, de longe (como se não pudesse transpor o precipício) lançava dardos e ogivas contra mim. A fuga se tornou mais lenta em função da região alagada, mas não menos perigosa. Alguns pontos curiosos: primeiro, nesse momento da trama, minha percepção de horizonte se "estreitou", como se o mundo que eu via antes em todas as direções fosse subitamente transformado em uma via de mão única; segundo, eu me sentia quase uma criança. Continuei fugindo.
Consegui transpor um muro bastante deteriorado no fim desse igapó, por assim dizer, e o ambiente seguinte era uma mata fechada, mais estreita ainda, de uma vegetação muito densa, úmida e abafada, apesar de estar muito molhado, sentia um calor escaldante. Aqui aconteceu algo bem estranho: a presença boa se manifestou. Em verdade, quem fugia e rejuvenescia não era eu, era o Yoshi, meu filho, eu era a presença boa que acabara de tomar forma. Já não era mais uma fuga, somente uma busca por um lugar seguro, longe daquela mata.
A mata acabou no quintal de uma casa semiacabada, a porta não estava trancada, e uma alvorada despontava no horizonte. Entramos. Estávamos em casa, seguros, cruzamos a cozinha em direção ao quarto, Herly e Manuela ainda dormiam.