Estilo de Adão
Sementes plantadas no inverno rigoroso. Crescem num não nada. Coisas de gênero esquizofrênico. Bobeiras nocivas por ninharia. Mas na primavera serão lindas flores pálidas de uma solidão aquecida por um sol devasso e desprezivelmente a favor da luz. Os seres noturnos acham.
Não é compreensível que estas sementes não morram antes que o acaso matinal as afague no meio de espinhosos espinhos. Por via das vezes, se achava que não iriam durar três dias após serem plantadas. Quem dera. Persistiram durante muito tempo. Algumas disseram não e morreram antes de serem surpreendidas com o piscar de seus olhos. Secaram e se tornaram pó.
O próprio pó não agüentou ser pisoteado pelos seres que se achavam superiores e acabou se vingando. Sufocou uma vaca até ela não poder mais ruminar e virar carne de panela. Foi triste. A vaca, pastando na sua mansa mastigada lenta e, quando nada, seus olhos lacrimejaram de tanta poeira; fungou um lindo ardor que a fez engasgar e não pode mais ficar em pé. Estrebuchou, deixou a baba cheia de grama escorrer pela boca entreaberta. Depois ruminou mais um pouquinho. Vingança do pó.
A carne da vaca foi aproveitada, pra variar. O sangue virou ração de cachorro e foi vendida por um bom preço. Os cachorros não gostaram da ração. Dinheiro jogado fora. Provérbio popular.
As sementes, que depois viraram plantas, receberam, de bom grado, o esterco da vaca.