O bom carpinteiro
No dia seguinte ao da sua não-execução na cadeira elétrica, Luis Alvarez foi avisado de que a pena de morte havia sido convertida em prisão perpétua.
- Acho que o governador viu um ato de Deus no apagão de ontem à noite - comentou um dos carcereiros, ao deixar o café da manhã do prisioneiro no corredor da morte.
- Deus deve ter outros planos pra mim. Para onde vou agora? - Indagou Alvarez, sentado em seu catre.
- Ainda não decidiram, mas você provavelmente vai mudar de ares - avaliou o carcereiro.
- De uma vez por todas - afirmou Alvarez, imperturbável.
* * *
- Então, você virou carpinteiro? - Indagou o mesmo carcereiro que havia dado as boas novas a Alvarez, ao reencontrá-lo semanas depois, na oficina de marcenaria do presídio.
- Eu lhe disse que Deus tinha outros planos, não disse? - Replicou Alvarez, enquanto martelava as peças de uma cômoda.
- Você sempre foi um sujeito tranquilo, Alvarez - recordou o carcereiro. - Se eu não soubesse que está aqui por matar um patrulheiro, quase diria que é uma boa pessoa.
- E eu sempre disse que armaram pra mim. Se tivesse morrido na cadeira elétrica, teriam executado um inocente - afirmou o prisioneiro, continuando a montar o móvel.
* * *
Dois meses depois, a notícia de que Alvarez havia fugido explodiu na penitenciária, que era de segurança máxima.
- Não me diga que ele usou uma corda feita de lençóis para escalar o muro? - Questionou o carcereiro do corredor da morte.
- Esse é o clichê mais batido nas histórias de fugas de prisão - retrucou o agente de segurança que lhe deu a notícia. - Não, Alvarez era esperto; ele ganhou a confiança dos guardas que vigiavam a marcenaria, e começou a ajudar a colocar os móveis prontos no caminhão que os levava para o depósito. Numa dessas idas, ele simplesmente se escondeu no baú e saiu da prisão pelo portão da frente.
- E o motorista não percebeu?
- Só quando lhe avisaram, num semáforo, que as portas do baú estavam abertas.
O diretor da prisão minimizou a fuga de Alvarez, embora ela fosse embaraçosa para o sistema de segurança da instituição.
- Ele vai voltar; todos eles voltam - afirmou convicto.
Trinta anos depois, Luis Alvarez continuava desaparecido - mesmo estando na lista dos dez mais procurados do FBI.
- [12-02-2021]